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Alguns dias na companhia do único e verdadeiro bacalhau em sua origem, a Noruega

Foto: Bruno Calixto

Por Bruno Calixto

Lembro do sabor intragável de um tal óleo de fígado de bacalhau que saía de um frasco marrom cujo rótulo trazia um pescador carregando nas costas um robusto bacalhau por inteiro. A relação mais íntima que uma criança tinha com o bacalhau, o rei dos pescados na Noruega, país colado no Círculo Polar Ártico que detém 80% do peixe nobre consumido no mundo. Se nunca vimos a cabeça, ela não só existe como também é bastante consumida, na Nigéria.

Para entender a relação deste peixe com os seus admiradores é preciso 11 horas de voo até a Noruega, onde ele é pescado da forma mais artesanal: vara, linha e anzol. “Uma tradição que ajuda a preservar a flora marinha”, me contou o pescador e filho de pescador Øystein Valanes, diretor do Conselho Norueguês da Pesca no Brasil.

Foto: Bruno Calixto

O barco é pequeno (35 pés), para até duas pessoas, são 5 mil deles na Noruega. Subi a bordo em um deles, tentei fisgar um bacalhau e…. Nada. Confesso que de tanto ficar olhando para baixo ao sabor do balanço do mar me deixou enjoado. Desisti a tempo de não ficar pior. Ele é grande e tem uma aparência única, meio amarelado, com mais barbatanas que o normal e um cavanhaque inconfundível.

Há pouco, estive em Tromsø e Ålesund, as duas cidades norueguesas capital do bacalhau. Na primeira se pesca, e na segunda se processa o peixe. Gostei de ver a salga, nuvens de sal caindo sobre as peças colocadas artesanalmente em cubas enormes de inox. O sal vem da Tunísia e Alemanha. Por lá, é época de descanso da pesca do bacalhau (a alta temporada vai de janeiro a abril). É hora do despacho da produção, especialmente para o Brasil, seu segundo maior mercado e que tem o pico de consumo na época de festas de fim de ano. São cerca de 17 mil toneladas de “gadus morhua”, o “vero” bacalhau, vindo para cá, partindo do porto de Roterdã, na Holanda. Levam 60 dias para aportar aqui, contados a partir da pesca.

Foto: Bruno Calixto

A herança lusitana nos trouxe toda a sorte de preparo do bacalhau, a começar pelo clássico da botecagem carioca bolinho de bacalhau (sempre com muito mais batata, “batatau”). Foram eles, os portugueses, que  introduziram no Brasil a cultura do bacalhau na nossa mesa e pelas suas mãos, como, alias, segue sendo até hoje. Compram da Noruega e mandam para cá.

A família real, contou-me uma amiga crítica e pesquisadora gastronômica, não abria mão do bacalhau nas refeições no Rio, que desfrutavam com goles de Porto e Setúbal.

É deles, inclusive, uma prerrogativa única e exclusiva: temos até hoje o privilégio de ser o único país dentre tantos compradores dos pescados noruegueses (o segundo maior exportador de frutos do mar do mundo, manda para mais de 150 países) a receber o produto embalado na caixa de madeira. Nada de papelão.

Foto: Bruno Calixto

Foi interessante notar que todo o processo do bacalhau usa técnicas que remontam há 11 mil anos, dos vikings. E de tudo se aproveita. A língua é apreciada na Espanha e em Portugal. O dorso é uma paixão brasileira e portuguesa. O fígado vira óleo, as ovas são curadas e servidas como acompanhamento. Até a espinha vira sopa, na China.

Ir ao encontro da origem do bacalhau requer fôlego, disposição, roupa de inverno pesado e um olhar atento. Se der sorte, ainda leva de brinde a aurora boreal, fenômeno solar que ocorre à noite em países bem ao norte da Terra.

O jornalista viajou a convite do Conselho Norueguês da Pesca.

Foto: Bruno Calixto

Receita

Bolinho de Bacalhau da Noruega

(Seafood From Norway)

O famoso bolinho de bacalhau como o brasileiro gosta. Indispensável em datas festivas e apreciado como petisco em bares e restaurantes em toda parte. Aprenda a fazer.

Ingredientes

      300 g de peixe Saithe (tipo bacalhau)

      1 ramo de salsa

      1 kg batata inglesa

      2 claras de ovo

      Pimenta do reino

      Sal

      Óleo vegetal para fritura

Preparo

      Dessalgar o bacalhau e desfiá-lo.

      Desfiar o bacalhau com um pano de algodão ou com as mãos.

      Cozinhar as batatas, amassá-las e misturar ao bacalhau, de preferência com as mãos.

      Moer a pimenta-do-reino na hora.

      Acrescentar a salsa picada, a pimenta, as duas claras batidas em neve e misturar.

      Untar as mãos com azeite e enrolar os bolinhos.

      Fritar em óleo abundante e bem quente.

Rende 4 porções.

Tempo: 70 minutos.

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