Foto: Salvador Cordaro
Por Paula Lima*
Eu me vejo em todas as mulheres do mundo. Todas nós, mulheres, temos similaridades. Acredito, também, que estamos bem quando, realmente, todas estão bem.
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As questões urgentes femininas estão em pauta: a luta contra o patriarcado, a dominação masculina e a luta pela equidade de gênero são atuais, responsáveis por mudanças e extremamente relevantes.
Neste momento, todas as mulheres que conheço e pessoas sensíveis estão estarrecidas com a volta do grupo radical Talibã no Afeganistão. A incredulidade e a impotência estão no ar com os relatos e as imagens aterrorizantes que circulam.
Mulheres estão destinadas ao apagamento por lá. O terror foi instaurado. Uma tragédia feminina urbana, que vai além de um novo regime.
A opressão sobre mulheres ao redor do mundo, guardadas as devidas proporções, é fato e, todas nós, nos sentimos oprimidas em algum momento da vida. Ser oprimido significa viver a ausência de escolhas. Este momento crítico da humanidade me fez refletir sobre a realidade feminina e a nossa luta permanente pela liberdade.
O mundo ainda é dominado por homens, que são responsáveis por praticamente tudo o que se conhece sobre guerras e opressões. A base da superioridade masculina se impõe pelo sexismo, no qual discriminam única e exclusivamente pelo gênero, sendo o machismo o maior expoente do preconceito de gênero.
Diante deste problema universal, a revolução precisa ser e tem sido feminina. O mundo precisa ser bom para todas as mulheres, também.
O feminismo vem do latim femĭna e significa “mulher”. O conceito surgiu no século XIX e sua principal caraterística é a luta pela igualdade de gêneros (homens e mulheres) e, consequentemente, pela participação da mulher na sociedade.
Vivemos há séculos o desequilíbrio entre o masculino e o feminino. O masculino desequilibrado traz a violência, excesso de hierarquia, hiper necessidade de controle e supervalorização da mente e da inteligência racional.
Uma sociedade desequilibrada com o feminino reprimido gera homens e mulheres incompletos com a identidade amputada e distorcida.
A revolução é feminina e é necessária. Gostaria de falar um pouco mais sobre a questão do feminismo em geral. O feminismo trata de modo mais direto as questões das mulheres brancas de classe média. ONGs e institutos conduzidos por pessoas não-brancas vem aprofundando a questão de forma prática para que se estenda de modo eficaz para todas as mulheres: negras, pobres, trans.
Durante um bom tempo, o movimento não tinha uma abordagem interseccional e racial, não pautando, dessa forma, a dupla discriminação que as mulheres negras passam, tanto de gênero, quanto de raça.
Precisamos lembrar que, enquanto as mulheres brancas estavam batalhando para entrar no mercado de trabalho, mulheres negras já trabalhavam há muito tempo. O feminismo negro, a luta da mulher negra por liberdade, respeito e escolhas vem muito antes do movimento sufragista e a queima dos sutiãs.
É importante ressaltar que essa consciência sobre a realidade da história da mulher negra serve para somar e, não, provocar desigualdade ou separação. Pelo contrário, é preciso escutar. Quem tem um histórico diferente não pode ser tratada como desigual. A intolerância se traduz em números que matam e ferem.
Bell Hooks em seu livro “E eu não sou uma mulher” parte do discurso de Sojourner Truth, uma mulher negra que havia sido escravizada e se tornou oradora depois de liberta em 1827. Ela denunciou, em 1851, na Women ‘s Convention – no discurso que ficou conhecido como “Ain’t I a Woman” – que o ativismo de sufragistas e abolicionistas brancas e ricas excluía mulheres negras e pobres. A partir do discurso de Truth, que dá título ao livro, Hooks discute o racismo e sexismo presentes no movimento pelos direitos civis e no feminista, desde o sufrágio até os anos 1970.
A antropóloga e professora Lélia Gonzalez enfatiza que “a tomada de consciência da opressão ocorre, antes de tudo, pelo racial”.
Deixo aqui também a indicação dos livros “Quem tem medo do feminismo negro“, de Djamila Ribeiro, e “Mulheres, classe e raça“, de Angela Davis, e o filme “Antebellum”, na HBO, protagonizado por Janelle Monae, cantora e atriz, ganhadora do Oscar.
Destaco o lançamento da série “O enigma da energia escura“, do homem feminino gente fina e genial Emicida, no canal GNT, sempre com a participação de personalidades e reflexões do ponto de vista da negritude, registrando também espaços e acessos ao poder e aos atuais problemas.
Sigo em luto pelas mulheres destinadas à proibição, violência e opressão no Afeganistão e indico o livro “Como as democracias morrem” para que estejamos todos atentos à nossa própria sorte e realidade aqui no Brasil.
E estou em luta ao lado e junto a todas as mulheres e todos que compreendem sermos capazes de criar pontes para um novo mundo através da empatia, consciência, ação e coragem.
“Mulheres como eu estão em toda parte, e não é preciso coragem para se aproximar, é preciso se aliar ao motim, é preciso arder”, diz Ryane Leão, feminista, ativista e poeta. Sou uma dessas mulheres, ardendo e aliada ao motim. A revolução já é feminina.
Paula Lima é cantora, compositora e apresentadora. Atualmente, está à frente do “Chocolate Quente” na Rádio Eldorado. Também é uma das diretoras Na União Brasileira de Compositores (UBC).
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Site RG.