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“Midas” dos atores lança livro-guia para a profissão

Marcus Montenegro – Foto: Edu Rodrigues

Talvez você nunca tenha ouvido falar em Marcus Montenegro, mas tem uma coisa: se você for ator, diretor ou autor, certamente já desejou cair nas mãos dele. Agenciador de artistas, ele é como um “midas” do setor. Trabalhou e trabalha com várias damas do teatro [Bibi Ferreira, Tônia Carreiro, Rosamaria Murtinho, Irene Ravache e Nathalia Timberg] e atores de grande porte, jovens e veteranos, e tem uma carreira sólida.

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Dono de uma retórica afiada, Montenegro começou sua carreira aos 17 anos na vida corporativa, foi produtor do programa “Pequenas Empresas, Grande Negócios” por longos anos. Saiu de lá negando uma oferta de trabalho para ser produtor de novelas da Globo para se dedicar ao teatro, o grande amor de sua vida. Trabalhou com Wolf Maia, com quem produziu espetáculos de grande sucesso, e partiu para uma jornada que duraria longos 27 anos, a agência de atores Montenegro e Raman, com Nilson Raman, de quem se separou em 2018.

Atualmente, é dono da Montenegro Talents, uma agência de atores, diretores e autores e tem um casting de 350 nomes do setor. Ademais, Montenegro é palestrante e faz mentoring, dá cursos para artistas em pequenos grupos e recém-lançou um guia que trata sobre carreira, intitulado “Ser Artista – Guia Para Uma Carreira Sólida no Mundo da Atuação”, pela HarperCollins Brasil. “Porque eu sou de uma geração em que as pessoas faziam arte por amor e dedicação. Dinheiro, sucesso e fama eram consequências.” Casado há 27 anos com o autor e ator Cacau Hygino, juntos têm cinco “filhas”, como diz, que são cinco cachorras.

Marcus Montenegro, Irene Ravache e Cacau Hygino – Foto: Divulgação

Autodidata

Montenegro conta que queria ser médico, chegou a passar em Medicina em Vassouras (Centro-Sul do estado do Rio de Janeiro), mas acabou largando. “Eu gostava muito de artes porque, desde criança, minha família me introduziu ao mundo das artes, com Bibi Ferreira, Henriette Morineau, Nathalia Timberg, desde muito cedo eu convivia com a arte dentro de mim. Então eu optei pela comunicação, que cursei até o oitavo período, mas não me formei, porque já trabalhava muito.”

Ele, então, começou a trabalhar em uma produtora pequena, onde foi estagiar. À época, não sabia quase nada, mas em quatro meses se descobriu produtor. “Descobri que eu gostava de produzir. Lá aprendi de tudo, operar VT, fazer roteiro e produzir. Fiquei por oito meses. “

Depois disso foi contratado pela Globotec para produzir um programa que está no ar até hoje, o “Pequenas Empresas, Grandes Negócios”. “Eu tinha 17 anos. Aconteceu que esse programa me deu a base da vida corporativa. Eu ficava em contato com o Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) o tempo todo, então aprendi a abrir uma firma, montar, conduzir, tudo, e emadureci muito como empresário.”

Mas, paralelamente à carreira de produtor de programa, Montenegro tinha uma produtora pequenina de teatro, com a qual fazia peças infantis. “Quando meu contrato acabou, eles quiseram me levar para a TV Globo para produzir novelas, mas eu não quis, porque preferi continuar no teatro. Para eles foi um susto”, conta.

Na sequência, Montenegro junta-se ao ator e diretor Wolf Maia e assume o cargo de diretor de produção, Juntos, eles montaram o musical “Blue Jeans”. É quando a vida de produtor de Montenegro dá um boom. “Ali eu estourei como produtor, fizemos outros espetáculos e depois me juntei ao Nilson Raman e montamos a Montenegro e Raman, que no início era uma empresa voltada para o teatro.”

Marcus Montenegro e Nicette Bruno – Foto: Divulgação

Em 1995, começam a entrar na Montenegro e Raman as grandes damas e grandes nomes, como Bibi Ferreira, Mauro Mendonça, Tônia Carreiro, Rosamaria Murtinho e Nathalia Timberg. “Mas, aí, eles passaram a ter a necessidade de ter um agente que cuidasse da carreira para eles. E é aí que eu começo minha carreira de agente teatral. Eu produzi cem espetáculos entre shows e peças, e não parava de crescer, até 2018, quando encerro a parceria da Montenegro e Raman e monto a Montenegro Talents, que hoje tem um casting de 350 talentos. A minha empresa é voltada para o agenciamento de autores, atores e diretores e desenvolvimento de conteúdo.”

Palestras

Pouco antes de encerrar sua sociedade com Raman, Montenegro parou de produzir espetáculos e enveredou seus planos para palestras. Com o tema “Como Construir Uma Carreira Sólida” ele falou para vários grupos, artistas e não artistas, e sempre foi um sucesso. “Deu muito certo, eu fui para  mentoring, comecei a fazer atendimento no escritório para cinco pessoas do Brasil, foi aí, então, que eu tive a ideia de fazer o livro. Ele nasceu para ter as minhas memórias, histórias positivas, inspirações que servem de analogia para um mundo melhor. Misturado com a minha palestra, o Arnaldo Bloch [coautor do livro] construiu a obra. Foi um trabalho genial que durou uma ano e meio, pois havia mais de 50 horas gravadas.”

Dicas  

Questionado sobre que dicas daria para os profissionais que hoje estão iniciando a carreira no mundo artístico, Montenegro é direto: educação e formação. Ele deixa claro que em seu time não contrata atores que não tenham o DRT (registro da profissão), e esse DRT tem de ser baseado em educação. “Até porque é um processo de afinidade de vida, de trabalho. Meu foco sempre vai ser estudar, para você se autoconhecer, se fortalecer, para poder pensar na carreira com solidez. Eu falo muito de pluralidade, porque o ator hoje em dia tem de ter conhecimento em todas as áreas. Um dos capítulos do meu livro fala sobre a importância de estagiar. Eu digo: ‘você tem de trabalhar no backstage o mais rápido possível’, para entender como as coisas funcionam, isso é fundamental. Porque você vai trabalhar como ator, aprende a dirigir e tem um outro foco na carreira, ou no figurino, na arte, eu acho importante abrir. E, claro, estudar, porque sem o talento você não vai a lugar nenhum.”

O livro Montenegro fala tudo isso, de como se apresentar, que plataformas visitar, de fotos, de currículo, de tudo, na abordagem de um corpo de elenco, na abordagem de um diretor. Dá todo o passo a passo.

Marcus Montenegro e Totia Meireles – Foto: Divulgação

“Vários grandes atores do mercado estão dando depoimentos sobre o livro no meu Instagram, como o Marcos Frota, que nem é meu agenciado. Eu acho muito legal o que o livro está provocando, inclusive, em pessoas que estão no mercado há muito anos”, diz.

Dicas de contrato para atores iniciantes também há no livro. Para ele, não devemos ter medo de dizer ao outro aquilo que ele pode aproveitar de bom, pois isso é saudável, desafiador. 

Montenegro afirma que esse seu grande objetivo é deixar um legado positivo, que sirva de inspiração, de base para a transformação de um mundo melhor dentro das artes.

Fama 

Questionado se lida muito com pessoas que só buscam fama, Montenegro diz que de forma frequente. “Só que o nível de contratação de uma pessoa que pensa assim é quase que zero, só se for uma exceção”, explica.

Para ele, Claudia Raia é um ótimo exemplo, porque é uma atriz empreendedora, pois quando não está na TV, ela está no teatro, e sabe fazer muito bem. Mas isso, claro, tem muito a ver com a formação dela.

“A gente tem que puxar um pouco para traz, para o estudo, para a formação, para que as pessoas não fiquem tão superficiais. O artista do passado é muito consistente. Você discute com ele sobre arte ou sobre qualquer outro assunto, porque ele foi acostumado a ter uma compreensão do todo até para sua sobrevivência e para a execução de uma trabalho, você tinha que entender um pouco de tudo.”

Desafios 

Na opinião do expert, são vários os desafios que rondam a profissão de ator atualmente. O excesso de opção, consequentemente, a concorrência, seria um deles. “Isso é uma coisa muito cruel porque o mercado por mais que tenha se ampliado sempre tem muita gente disponível para ser escolhida. Por exemplo, às vezes, para um personagem, há 30 opções, sendo que isso já é a peneira, da peneira, da peneira. Então, com grande oferta, você tem que ter um material de trabalho muito coerente, muito bom. Um desafio hoje é você ter esse material à altura de seu talento. Tem gente que faz o seu material de apresentação de qualquer jeito, com fotos descuidadas, um currículo ruim, um vídeo que não é bom.”

Para ele, outro desafio ao postulante à carreira de ator é ser plural. “A espera do convite é muito cruel, então você tem que buscar como se apresentar para poder ser visto. Hoje, o ator não tem condição de fazer teatro porque o patrocínio diminuiu, então é preciso usar as plataformas digitais. Migrando para a plataforma digital, que virou realmente uma referência, você tem que fazer um material de qualidade que sensibilize o outro para olhar para você. Para sobreviver a tudo isso tem de ter muita consistência”, explica.

Marcus Montenegro e Fabiana Karla – Foto: Divulgação

Mas ele não tem nada contras as redes sociais, muito pelo contrário, só alerta para a pressão da velocidade com que as coisas acontecem. “É legal hoje em dia que muita gente tem criado o seu canal no YouTube, criando o seu espaço, é preciso estar ativo. Mas isso é um pedaço, uma forma. Um exemplo é Kéfera, que nasceu como atriz, bombou nas redes sociais e largou tudo para focar na carreira de atriz novamente. Hoje, tem um desespero do aparecer por aparecer. De fazer por fazer. Eu não trabalho com gente assim. Se você olhar para o meu casting, todos eles trouxeram formação e conteúdo e o resto é consequência disso, que é o caminho ideal, mas tudo tem sua exceção. Eu sempre falo da Glória Pires, uma das maiores atrizes do País, maravilhosa, faz TV, faz cinema, mas não faz teatro.” Mas para ele isso não é um defeito, apenas um caminho escolhido pela atriz, embora, pare ele, o teatro seja a base de tudo.

“Eu trabalhei com todas essas divas que buscaram no teatro a sua excelência. E eu trouxe muito desse conhecimento, dessa disciplina para o meu dia a dia. Por isso sou pontual, sou tão organizado. A arte me deu uma disciplina. Porque eu sou daqueles caras que batem na tecla que arte e educação têm de estar em qualquer lugar. Um empresário que tem acesso à arte vai ter um olhar diferente para o mundo. Ele vai se expressar de forma diferente para seus funcionários, em uma palestra, ele vai estar muito mais sensível, mais aberto a novos projetos, muito mais criativo.”

Ego

Ele costuma dizer que a era dos egos acabou pois o mundo não tem mais espaço para isso, e diz que a internet veio para mostrar que todo nós somos iguais. “Eu acho que o grande barato é ter inteligência emocional e saber lidar com a pressão e a velocidade do dia a dia. De ego eu posso dizer que eles [seus agenciados] estão mais tranquilos, mas o pior é essa aceleração. Eu acho que hoje a ansiedade é maior que o ego.”

Sim, porque uma coisa é clara, segundo Montenegro, se a pessoa dá muito trabalho, ela acaba caindo na internet e fica exposta rápido. “Tudo antigamente era muito camuflado, agora não. Se você falasse de um jeito ruim com uma camareira, ficava ali, hoje, se isso acontecer, em três segundos está na internet. Então as pessoas estão pensando mais no que fazer, no que falar e administrando seus egos.”

Internet

Quanto a orientar seus agenciados a estarem na internet, ele volta a citar a inteligência emocional. Acha que é preciso fugir do tempos acelerados, mas não deixar de estar conectado. É preciso ler, informar-se, estudar.

“Eu foco muito na inteligência emocional. Eu já tive essa coisa de não conseguir ficar com um livro durante uma hora, eu já vivenciei essa pressa, essa angústia da velocidade do dia a dia. E você vai ficando doente com essa velocidade da sociedade moderna. Aí vem a síndrome do pânico, depressão, bulimia. Hoje eu passo oito horas lendo um livro, é uma opção e dedicação.”

Marcus Montenegro – Foto: Edu Rodrigues

Livro

Sucesso entre pessoas de vários segmentos, como ele próprio teve a felicidade de perceber, o livro “Ser Artista” é um guia da profissão. Sobre a grande aceitação, inclusive em salas de aula, Montenegro diz que se surpreendeu. “Eu não imaginava que ele tomasse o vulto da referência que virou, e ter sido abraçado pelo número de pessoas que o abraçaram. Eu achei que seria um livro para estudantes, mas pegou profissionais de diferentes áreas. Para mim foi um carinho monstro”, declara.

Se até aqui você ficou curioso para ler o livro de Montenegro, corra e leia, porque vem mais pela frente. O autor já se prepara para um segundo volume da obra. Muito dessa segunda parte será feita usando uma série de lives que ele tem feito, e que funcionam como um masterclass. “Quero dar ênfase a pessoas do mercado que considero ícones na sua excelência em cada fatia do mercado de entretenimento.”

Montenegro conta ainda que o livro “Ser Artista” teve tanta influência em sua vida que ele acabou criando um método para conversar com as pessoas. “Hoje quando eu converso com uma pessoa a minha cabeça vai se remetendo aos capítulos do livro, é uma coisa muito louca. Ficou orgânico em mim, que é uma coisa que eu queria, que é o método Montenegro Talents de ser. Meu discurso agora é muito conectado com o que eu acredito.”

Campanha

Mesmo trabalhando como trabalha e tendo que divulgar seu livro, ou seja, quase sem tempo, Montenegro criou uma campanha intitulada #QueroVeteranosNaTV. E por que isso? Simples, experiente como é, o gestor percebeu que atores veteranos estavam ficando sem espaço, e olha que veteranos aqui se referem a profissionais com 45 anos para mais.

Como passar dos tempos eu fui vendo a ‘jovialização’ do mercado. E vi atores veteranos perdendo espaço. Quando falo de atores veteranos, estou falando de 45 anos para cima. Antes as novelas tinham um núcleo de artistas veteranos bons, com 20, 30 deles. Hoje vê-se pouco disso. Há três ou quatro veteranos. Recentemente uma atriz de 42 anos fez o papel de mãe de um ator de 29 anos, ou seja, ficou incoerente.”

Ele lançou a campanha como um chamamento para a indústria criativa de uma maneira geral, para não deixar os atores em situação de desemprego muito cedo. “Eu quero chamar a atenção para a valorização dos grandes mestres, valorizar quem fez. E esses atores, de uma certa maneira, são responsáveis pelo sucesso de tudo. O canal Viva é um grande exemplo disso, porque passa as novelas do passado nas quais o casting é outro, é dos veteranos. A TV aberta tem uma lacuna para isso, assim como o streaming e a TV a cabo.”

Foto: Divulgação

“Ser Artista”
384 páginas
R$ 32,40
Editora HarperCollins Brasil

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