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Sanches: “Escolas estão matando o pensamento independente e criativo”

Foto: Reprodução/Twitter

Tirando minha passagem quando criança em uma escola chamada Stoquinho (procure saber), onde convivíamos com a natureza e a liberdade das múltiplas percepções instintivas natural da criança dentro de um ambiente que mais parecia um grande sítio, desde que me conheço por gente, estive em constante atrito como o sistema educacional que frequentei.

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Essa talvez foi uma das primeiras bandeiras que levantei na minha vida, enquanto questionava professores sobre a necessidade da aprendizagem de alguns conteúdos e, quando não ia para a diretoria, desenhava na prova de matemática.

Os efeitos disruptivos da revolução digital já trazem inúmeras oportunidades de reimaginar como a educação pode ser administrada e exercida no presente. O problema é que as escolas ainda ensinam os alunos sobre os feitos de Einstein, Galileu e Da Vinci, por exemplo, mas, se quer abordam a forma de como fizeram, qual caminho chegaram a estes feitos.

Se nosso futuro será baseado em uma economia pós capitalista pautada na economia criativa e compartilhada, então, deveria parecer sensato preparar os jovens para isso, ao invés de prepará-los para ser mais uma engrenagem de uma máquina que, apesar de complexa, está fadada a um fim obsoleto.

​Isso me faz pensar sobre o valor do nosso atual sistema de ensino, baseado em regurgitar as informações recebidas. É claro que princípios básicos devem ser aprendidos na escola e uma ou outra forma de teste é útil, mas esses exames deveriam ser baseados principalmente na retenção do conhecimento? Em pleno 2020? Não serão, de certa forma, inúteis, quando quase todas as informações estão a dois cliques de distância? Além disso, já parou para pensar que estes testes expõem apenas o que o jovem não sabe, ao invés de oferecer a ele a oportunidade para mostrar o que sabe. Será que os testes e provas estão, ao invés de abrindo os olhos dos alunos, colocando um cabresto neles?

A cultura centenária de nossa estratégia de ensino mundial, que mais parece uma sátira de mal gosto dos tempos áureos da revolução industrial, sempre foi administrado de forma a, estrategicamente, ensinar às crianças quase tudo, exceto como usarem as suas mentes a pensarem de forma independente. Elas são ensinadas não a desenvolver e usar suas próprias mentes, mas, sim, adotar e usar os pensamentos dos outros. Esse tipo de escola destrói a capacidade do pensamento independente, exceto em alguns casos raros.

Sempre imaginei um ensino utópico (lembrando que utopia não é algo impossível, apenas um cenário distante) que elevasse o status e importância da criatividade nas escolas. Premiando o novo e o interessante ao invés do certo e errado, incentivando o olhar, a compreensão, a curiosidade e a execução, nos quais os fatos sejam pontos de partida, não a conclusão.

Neste cenário, o que importa é o que o aluno consegue fazer com a informação que recebe, onde os métodos, materiais e meios ficassem sob responsabilidade do aluno, assim como sua própria interpretação.

​Já parou para pensar que a primeira grande decisão tomada por um ser humano – quando os pais não influenciam ou obrigam – é qual curso ingressar na faculdade? Como assim um ser humano passa 18 anos sem ter a prática e o costume de tomar decisões importantes?

Talvez seja por isso que os adultos de hoje têm medo de grandes desafios, de executar, de criar, pois não aprenderam se quer a tomar suas próprias decisões quando jovens. A culpa pode ser em parte dos pais que criaram seus filhos na base do “não, não pode, porque não e pronto” ou com frases do tipo: “quem decide tal coisa sou eu”, mas a escola e o ensino tradicional também carregam essa culpa.

Quais foram as decisões importantes que você tomou em sua época de escola? Qual matéria escolheu estudar? Nenhuma. Em que plataforma quero entregar meu projeto? Não tem essa opção. Quando você toma suas próprias decisões, você é livre. E não há nada que cause mais medo na sociedade que um jovem com ideias próprias.

Tanta coisa esta prestes a mudar, inclusive nossa relação com o ensino. Se hoje tenho capacidade de trabalhar com o que amo, ganhar dinheiro com isso, ou simplesmente escrever esses textos, é porque virei as costas para o ensino tradicional baseado no medo e na cobrança. Não há nada mais gratificante do que estudar aquilo que se tem atração, fascínio.

Mas vejo uma luz no fim do túnel: a combinação de uma população cada vez mais intelectualmente ambiciosa, que viverá cada vez mais tempo, com a crescente da economia criativa e um mundo digitalizado vai levar a maioria de nós a renovar ou expandir nossos laços com a educação.

A ideia de que a aprendizagem tem fim na faculdade ou mestrado, por exemplo, está finalmente caindo por terra. Assim como a ideia de que um indivíduo terá uma única profissão para o resto da vida. Se você for trabalhar até os 70 anos, provavelmente vai querer explorar vários campos de atividade ao invés de colher do mesmo fruto para a vida inteira, e, mesmo se não quiser, provavelmente a tecnologia te obrigará.

 

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Rafael Sanches – Colunista de arte do Site RG

Foto: Arquivo Pessoal

Sanches é um artista multidisciplinar que confunde as linhas entre arte, arquitetura e moda, entrelaçando desde a criação de obras de arte tridimensionais até o design de futuros espaços “reimaginados”. O artista é conhecido por sua incansável experimentação de formas, materialidades e formatos em muitos gêneros de trabalho. Abrangendo esse conceito tipográfico que vai além de letras e palavras – formando forte comoção estética, ele se transformou em um dos novos artistas contemporâneos mais requisitados do País.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Site RG.

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