Paula Lima é colunista de RG e escreve, geralmente, aos sábados (Foto: Lucas Fonseca)
Por Paula Lima
A grande notícia da semana foi a política de ação afirmativa e de inclusão do Magazine Luiza. Sim, é histórico! Parabéns, Luiza Trajano, pela atitude e originalidade como empresa brasileira, pela inteligência e entendimento da necessidade e urgência por meio de uma atitude real em prol de um equilíbrio na desigualdade entre brancos e negros nas relações de trabalho e na sociedade.
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Essa ação afirmativa e de inclusão é resultado de quem entende e discorda dos abismos sociais e pensa em um futuro próspero de uma nação: a nossa. Uma ação que combate a desigualdade e abre caminhos para a mobilidade social de alguns, que se transformam em muitos. Claro que, infelizmente, “choveu” gente (branca) se sentindo discriminada. Pela primeira vez, talvez? Acusando a empresa de, pasmem, o que chamam de “racismo reverso”.
Venho aqui, nesta coluna, dizer que “racismo reverso” não existe. Primeiro porque pessoas brancas não sofrem racismo. Nunca tiveram qualquer problema pela cor da pele, por terem a pele branca. Brancos não deixam de ser empregados pela cor da pele, não deixam de ter acessos.
Já negros, sim. O racismo estrutural existe porque foram criados mecanismos nesta construção estrutural civil em que brancos sempre são beneficiados. “E se fosse o contrário?”, ouvimos isso durante a semana sobre a inconformidade de quem se sentiu ameaçado por essa ação. O contrário já existe, é o que você vive e vê, quando está definido que o programa é para “todos”.
Numa análise dos salários de trabalhadores negros e brancos com ensino superior, os trabalhadores brancos ganham 31% a mais do que trabalhadores negros. Já as mulheres pretas ou pardas recebem 44% do valor que homens brancos recebem. Há uma diferença salarial de 45% entre trabalhadores brancos e negros, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. Os dados são do Instituto Locomotiva.
Nas 500 maiores organizações do Brasil, pessoas negras ocupam apenas 4,7% dos cargos executivos; 6,3% dos gerenciais e 35,7% do quadro de funcionários. Esses dados são de pesquisa do Instituto Ethos.
Foto: Divulgação
As previsões para diminuir essa gigantesca desigualdade no mercado de trabalho é de 150 anos. Sim, é isso o que você leu: cento e cinquenta anos.
É preciso que brancos entendam os seus privilégios. É preciso que organizem as ideias e, quando olharem para o lado e não encontrarem nenhum negro, entendam que não há essa diversidade porque não há possibilidade, oportunidade. É injusto e anti-democrático, inclusive.
Há uma gigantesca dívida histórica e a atitude do Magazine é louvável. É uma atitude de responsabilidade social.
Quando brancos se sentem ameaçados em relação a perda dos seus privilégios, há uma explosão de ódio. Todos que aparentemente se diziam anti-racistas, se desesperam por uma egoísmo e por medo de competição.
Brancos que se sentem injustiçados, podem apenas se candidatar em qualquer outra vaga, elas já existem desde sempre. Se concorrerem com um negro, a chance de serem contratados são enormes, como sempre foi. Nós, negros, sofremos discriminação e abusos há mais de 400 anos. Em 15 anos realizando o programa, Magazine Luiza formou 250 trainees pela empresa, e apenas 10 eram negros.
No Twitter, o Magazine já se pronunciou: “Estamos absolutamente tranquilos quanto a legalidade do nosso Programa de Trainees 2021. Inclusive, ações afirmativas e de inclusão no mercado profissional, de pessoas discriminadas há gerações, fazem parte de uma nota técnica de 2018 do Ministério Público do Trabalho”.
Empresas internacionais já têm essa política de inclusão, a favor da diversidade e equilíbrio, há pelo menos 20 anos, justamente por terem esse olhar mais amplo seguindo as tendências mundiais. Ações como essa são necessárias para que a diversidade e pluralidade estejam presentes nos espaços. E somente com pessoas negras e não brancas, com destaque e poder de decisão, essa realidade será outra e infinitamente melhor.
Desejo que outras empresas brasileiras, além da Magazine Luiza e Bayer, entendam e executem essa política urgente e de transformação. Mais uma vez: obrigada, Magazine Luiza, essa atitude trará grandes e prósperos resultados.
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Foto: Getty Images
Nessa semana, também houve discurso do presidente do Brasil na ONU. Precisamos proteger e nos engajar na luta pela Amazônia e Pantanal, que estão pegando fogo e ardem. Precisamos proteger os indígenas, os caboclos e os crioulos que não são os responsáveis por essa tragédia ambiental. Não podemos ser insensatos. O problema é grave e real. Valem muitas reflexões sobre e sobre o futuro.
O MPF cobra decisão da Justiça sobre afastamento de Ricardo Salles, o ministro do meio ambiente, que nunca foi à Amazônia.
Nesta quinta-feira (24.09), o novo Ministro da Educação, o pastor Milton Ribeiro, em entrevista para o jornal O Estado de S. Paulo, apresentou um pensamento totalmente discriminatório, retrógrado e fora do contexto atual. Ele diz que gays vêm de “famílias desajustadas” (fala em “opção” e usa a palavra “homossexualismo”, termo já em desuso, pois remete à doença); é contra a educação sexual nas escolas; diz ainda que acesso à internet por alunos não é responsabilidade do MEC e que a desigualdade do Brasil sempre existiu e não é tema da pasta. Em 2016, defendeu a dor para o ensino: cinta dos pais, vara de disciplina nas escolas…
O preconceito, a discriminação, a não ciência, a não vanguarda, a não transformação não podem partir do principal órgão de educação de um país. Haverá inquérito para investigar prática criminosa.
“A educação precisa ter um papel humanizador, incluir e não afastar e discriminar”, diz Erika Hilton, ativista dos direitos LGBTQIA+.
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Foto: Getty Images
Nesta semana, também, teve Emmy Awards! A incrível atriz e cantora Zendaya, de 24 anos, se tornou a pessoa mais jovem a vencer o prêmio de melhor Atriz Principal em Série Dramática, por “Euphoria” (HBO), que eu já recomendei aqui. Uma série densa e muito envolvente sobre o drama de ser um adolescente nos dias de hoje. Ela deixou uma importante mensagem ao ganhar: “Há esperança nos jovens”.
Breonna Taylor foi homenageada no Emmy por Uzo Aduba, atriz em “Mrs. America”. Aduba levou o prêmio de Melhor Atriz Coadjuvante em Minissérie ou Telefilme e apareceu com o rosto de Breonna estampado na camiseta!
Quem também estampou o rosto de Breonna foi Regina King, que recebeu o seu quarto Emmy! Em 2020, venceu na categoria de Melhor Atriz em Minissérie ou Filme para a TV por “Watchmen” (HBO). Ano passado, ela recebeu o Oscar por “Se a Rua Beale Falasse”, sempre com discursos poderosos. É sobre isso que venho sempre falando: usem a sua voz.
Deixo aqui a minha solidariedade e revolta à Eliane, a mulher agredida por um militar e outros militares envolvidos em Macapá! Mais uma vez, uma mulher negra que sofre opressão e violência brutal por questionar uma ação da polícia. Afastamento não significa nada. Queremos punições e exoneração! Pessoas assim não servem à população! Medo, exaustão, raiva. Até quando? E por enquanto, continuem filmando, é a nossa defesa como sociedade para a barbárie.
Foto: Divulgação
E por fim, deixo aqui a minha homenagem ao artista black power, Gerson King Combo, que nos deixou essa semana, aos 76 anos. Tivemos muitos encontros especiais, entre eles a participação dele no meu primeiro disco solo, o “É Isso Aí”. Sempre generoso, carinhoso, alto astral e ultra musical. Foi um dos pioneiros do funk (na vibe do James Brown) e do soul, e deixou um clássico para a música negra brasileira, os “Mandamentos Black”, que diz:
Dançar como dança um black!
Amar como ama um black!
Andar como anda um black!
Usar sempre o cumprimento black!
Falar como fala um black!
Eu te amo, brother!
Viver sempre na onda black!
Ter orgulho de ser black!
Apesar de tudo, esperança e coragem são palavras que têm feito parte da minha vida. Precisamos sentir e acreditar nisso, é uma questão de sanidade mental (esperança) e humanidade (coragem). Coisas boas pra todos vocês. Obrigada pelo carinho semanal por aqui. Sigamos em frente firmes e fortes.
Paula Lima é cantora, compositora e apresentadora. Atualmente, está à frente do “Chocolate Quente” na Rádio Eldorado. Também é uma das diretoras Na União Brasileira de Compositores (UBC).
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Site RG.