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Paula Lima: “Obra de Beyoncé mescla ancestralidade, moda, empoderamento e movimento”

Beyoncé em um dos clipes do álbum visual “Black is King”, exclusivo da Disney+ (Foto: Travis Matthews)

Por Paula Lima*

Dentro do nosso novo panorama, esta semana, algo novo e surpreendente mexeu com a horizontalidade das emoções. Ao menos dentro da arte e da música, sugerindo um novo olhar e novas reflexões. Beyoncé (ou Queen B, como é conhecida) conseguiu, extraordinariamente, chamar ainda mais a nossa atenção e a do mundo. Através de uma narrativa muito (mas muito) potente, de uma África rica e forte na sua estrutura e ancestralidade, “Black is King” mostra a realeza e o poder: poder para o povo preto!

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A polêmica causada pelo novo álbum visual da cantora aconteceu muito pela (quase nunca) exposição do glamour e luxo negro – apresentados no filme, na nossa terra mãe e fora dela também. Provavelmente porque, em geral, para quem questiona, negros devem contar apenas e somente suas mazelas, dores, cicatrizes, derrotas e a crueza junto à pobreza como forma de expressão e colaboração rumo à transformação.

Mas pra quem já viveu cerca de 350 anos sendo totalmente oprimido, apenas frequentando a sala de jantar para servir, qual a importância da reverência à uma história negra real e à força dos antepassados? Toda!!! É de extrema importância que negros se reconheçam em posições de destaque em uma iluminada, possível e próspera Wakanda (país fictício localizado na África subsariana e o lar do super-herói Pantera Negra). E sim, o orgulho está batendo forte no peito com a chegada do inquestionavelmente genial “Black is King”!

Beyoncé assina a produção executiva, a direção, roteiro, trilha sonora e trabalha com grandes e renomados profissionais negros para chegar a um resultado de excelência nessa megaprodução em parceria com a Disney. O filme é inspirado no live action “O Rei Leão” (em que ela própria dublou a Nala). O resultado após um ano de pesquisas, ensaios e filmagens em vários lugares do mundo é surpreendente! O elenco é também estelar: o marido Jay-Z, a filha Blue Ivy, Naomi Campbell, Lupita Nyong’o, Kelly Rowland, Pharrell Williams, Salatiel, entre outros.


TRADIÇÃO, RIQUEZA, BELEZA, COMPETÊNCIA
“Yes, we can”! E é conhecendo o passado, mas pensando no amanhã e no futuro mais longínquo, que podemos fazer um link com o poder no seu sentido mais amplo e positivo, e o lugar estratégico que quando ocupado, transforma. Um exemplo sobre “ocupar espaços” é Barack Obama, que completou 59 anos essa semana!

A ascensão e a presença de Obama foram extremamente significativas para inspirar milhares de negros ao redor do mundo. Nunca mais esqueceremos da frase emblemática… “Sim, nós podemos”. Barack, Queen B — e tantos outros negros exponenciais — reafirmam esse “poder” importantíssimo. Eles deram um novo sentido a pensamentos e estéticas. A arte, a referência, a ocupação e o conhecimento educam, reeducam e ressignificam.

Um outro paralelo que cabe aqui é a respeito do aniversário de James Baldwin, escritor e pensador que completaria 96 anos também nesta semana. Morto há 30 anos, ele é o protagonista do documentário dirigido por Raoul Peck, ganhador do Oscar, “Eu não sou seu negro”, muito emblemático. Assistam!

O direito de Beyoncé contar a sua própria narrativa black power, por ser negra, saber o que é ser negra e viver como negra, é original. Diante do real sentido de “ressignificação” compartilho algumas personalidades negras geniais ligadas ao filme “Black is King”. É importante que a autoestima permaneça aguçada juntamente com novas narrativas. Para quem está no lugar de escuta pode ser interessante. Afinal, entender os caminhos também serve como aprendizado.

Dou o start com Zerina Akers, a stylist da artista genial, responsável por arquitetar os estilistas e as suas identidades para compor esse trabalho tão especial. Zerina já esteve presente em “O Rei Leão”. Ela diz que queria fazer referência a diferentes culturas, tradições e tribos, mas tendo a liberdade de criar fantasia para que as pessoas possam escapar para um novo mundo!

Jenn Kniru – Diretora nigeriana-britânica, que explora a identidade em seus filmes. Ela é co-diretora no álbum visual de Beyoncé. Artista visionária, esteve já presente em “Apeshit”, do The Carters (trabalho em conjunto de B com o marido).

Hannah Beachler, diretora de arte. Já havia participado da criação visual do álbum “Lemonade”, também de Queen B. Foi a primeira negra na história do Oscar a receber o prêmio de Direção de Arte por seu trabalho no especial “Pantera Negra” – na mesma ocasião, foi a primeira negra a ser indicada nesta categoria desde 1929. Também trabalhou no filme vencedor do Oscar “Moonlight”. É ícone do ramo! Em seu discurso de vitória, disse: ‘Dou força para todos aqueles que vêm em seguida, para continuar, para nunca desistir.’.

Loza Maléombho, estilista Nascida no Brasil, cresceu entre a Costa do Marfim e os Estados Unidos. O visual criado por ela para o clipe “Already” (parceria da cantora com Shatta Wale e Major Lazer) é icônico. É look de estampa de listras diagonais e ombros marcados, muito marcante. Ela já havia vestido a artista para o álbum “Lemonade”.

Olivier Rousteing (@olivier_rousteing) – Designer de moda francês e diretor criativo da Balmain desde 2011. Com seu olhar singular sobre a mulher, a moda, a sofisticação dentro de novos tempos, ele fez da Balmain uma potência na última década, conquistando uma nova geração de consumidores. Seu casting para campanhas e desfile é marcado pela diversidade. Ele foi o responsável pelo figurino da rainha no documentário “Homecoming”, no Coachella e de 300 músicos e dançarinos. Em “Black is King” ele está de volta. Rihanna, Kim Kardashian também são amigas e clientes. Olivier tem 34 anos e é genial!

Complemento importante: nos clipes, as peles de caça de onça e antílope constituem trajes reais manufaturados a partir de animais temidos pelos caçadores, configurando um traço distintivo do povo zulu. A aproximação de Beyoncé com a África já existe desde 2013, quando foi dirigida pelo ganês fante Kwasi Fourdjour no clipe “Drunk in Love”. É ele o responsável pela aproximação com outros diretores, que também fazem parte do trabalho.

Com esses exemplos, proponho um outro olhar através dessas mentes brilhantes e cases de sucesso em lugares estratégicos. “Black is King” estreou na plataforma Disney+ (ainda não disponível no Brasil) dia 31 de julho. Queen B é a grande influenciadora pop do nosso tempo e é também influenciada pela estética e narrativa afrofuturista (para somar, a cantora e modelo Grace Jones, sucesso na década de 90, apresentava fortes sinais dentro dessa estética). Beyoncé também diz que o filme foi criado para “celebrar a amplitude e a beleza da ascendência negra” e que o “negro é magnificente e rico na história, em intenção e linhagem.”

O filme traz o feminino, o feminismo, a estrutura matriarcal, o religioso, o sagrado, o genocídio, a tecnologia, a liberdade. Um salve para esse resgate da ancestralidade africana na diáspora e suas referências culturais. Que força! Isso tudo é um grande movimento, um grande e essencial movimento negro.

Paula Lima é colunista de RG e escreve, geralmente, aos sábados (Foto: Lucas Fonseca)

*Paula Lima é cantora, compositora e apresentadora. Atualmente, está à frente do “Chocolate Quente” na Rádio Eldorado. Também é uma das diretoras Na União Brasileira de Compositores (UBC).


** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Site RG.

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