Antonio Isuperio é arquiteto e ativista LGBTQIA+ antirracista – Foto: divulgação
Foi em uma escola de freiras, no interior de Goiás, que Antonio Isuperio expôs seu primeiro caso de racismo. Na época, ele viu a professora chamar seu irmão, de apenas quatro anos, de pau-de-fumo e ficou revoltado, tanto que seus pais tiveram que ser chamados para conversar. Como tinha apenas seis anos, ele não se lembra do ocorrido, quem lhe contou foi a mãe, que cita essa já como a primeira vez em que Isuperio foi realmente ativista.
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Hoje, com seu perfil no instagram, o arquiteto e ativista LGBTQIA+ antirracista expõe vários outros casos, incluindo de homofobia e machismo. Dessa forma, sua plataforma ganha cada dia mais um caráter de justiça social com alcance nacional. “Para o próximo ano pretendo me colocar mais também, porque o perfil acabou virando uma utilidade pública. Tem muita coisa lá que as pessoas me pedem para falar”, afirma.
Mas, embora muita gente se identifique com seu trabalho, várias outras também se incomodam, o que já custou a Isuperio alguns períodos de bloqueio na rede social. O mais recente aconteceu no último mês, após uma denúncia sobre fraudes de cotas em Harvard.
Quem vê o militante atuando hoje e sabe dessa história de infância pode até pensar que sempre foi assim, mas a verdade é que ele passou muitos anos calado. “Foi só quando eu comecei a estudar sobre a questão racial que eu passei a me identificar realmente como negro”, conta. Atualmente fazem cerca de oito anos que ele se reconhece dessa forma.
“Em uma das voltas para minha cidade, percebi que meus irmãos, que inclusive têm características mais negróides do que eu, tinham perdido completamente a consciência racial. Aquilo foi muito violento para mim, então a partir daí eu comecei a me relacionar com os movimentos de uma forma mais direta”, comenta.
Já envolvido nessas questões, Isuperio foi morar nos Estados Unidos em 2013 e 2014, mas como é apaixonado pelo Brasil voltou e ficou os dois anos seguintes. “Esse tempo todo só tive trabalhos temporários. Cheguei a conseguir projetos grandes, mesmo que por pouco tempo, mas eles só me fizeram uma oferta de trabalho quando falei que iria embora”, diz ele sobre como se mudou de vez para os EUA, onde está até hoje.
Atualmente trabalhando em Nova York, Isuperio pretende voltar para o Brasil no futuro – Foto: divulgação
Nessa época, ele não só disse chega para os trabalhos que não iam para frente aqui, aceitando propostas de fora, como também decidiu que a partir de então não se calaria mais. “Aí eu comecei mesmo a expor os casos e a utilizar o meu instagram para isso, e o perfil foi ganhando um pouco mais de visibilidade.”
Porém, o ativismo em causas sociais é apenas um dos lados de Isuperio. Arquiteto formado pela Universidade Estadual de Goiás, ele ainda tem MBA em varejo pela FGV-SP e passou por empresas como a M.Officer e a Marisa S.A.. Atualmente, mora e trabalha em Nova York e é diretor de relações internacionais do Retail Design Institute Brasil.
“Nem sempre soube que seria arquiteto, mas sabia que ia trabalhar com algo que envolve arte, porque desde muito cedo tiveram algumas coisas que me deram um apreço maior pela arte”, conta. Duas delas foram muito importantes na vida de Isuperio, a educação que recebeu, e a locadora de filmes onde sempre ia.
Ainda que sua vida em escolas particulares não tenha sido fácil, considerando que era um dos poucos alunos negros e pobres, a educação sempre foi algo importante para sua família. Especialmente suas tias que ascenderam socialmente graças aos empregos conquistados no serviço público, podendo assim ajudar a pagar os estudos dos sobrinhos.
O acesso a esses espaços foi extremamente importante para Isuperio e seus irmãos, que acabaram sendo a primeira geração da família a entrar na Universidade. Mas a locadora de filmes também teve papel importante na construção do arquiteto e ativista abrindo muitas portas, até mesmo para a música e a televisão.
A ligação com as artes foi tanta que ele chegou a ser crítico de arte por oito anos. Na época em que os blogs eram fortes, lá também estava Isuperio com sua própria página sobre cinema. “Acho que isso foi outra ponte que me levou, depois que eu me graduei e fui para São Paulo, a trabalhar com o Carlos Miele e aí enfim, até chegar aonde estou hoje”, destaca.
Isuperio ainda quer voltar para o Brasil em algum momento no futuro e está trabalhando para lançar uma empresa de gerenciamento de crise baseada na diversidade e na inclusão. Além de ter se tornado o primeiro colunista negro da Harper’s Bazaar Brasil no início deste ano e estar preparando um livro sobre o tema LGBTQIA+ antirracista.
Relembrando tudo que aconteceu para que chegasse onde está hoje e pensando em tudo que ainda deseja atingir, Isuperio conta as histórias entre risadas e sorrisos. Ainda assim, faz questão de ressaltar que o Brasil é um dos países mais perigosos para jovens negros, LGBTQIA+ e ativistas dos direitos humanos, e que ele é os três. A plataforma que construiu no instagram foi a forma que encontrou de dar voz a suas lutas e não mais se calar.