Por Luigi Torre, da Harper’s Bazaar
O principal lançamento da última semana de moda de Nova York não foi uma roupa. Foi o Apple Watch. Na mesma temporada, a Intel, em parceria com a Opening Ceremony, apresentou sua Mica, pulseira que troca mensagens de texto e envia notificações de e-mails e compromissos, e a estilista Rebecca Minkoff desfilou seus braceletes-carregadores. Trata-se da mais nova revolução de estilo, fruto da verdadeira união entre duas indústrias que, até então, viviam em estado de completa rejeição. Bem-vindo à era da wearable technology.
O conceito é simples, ainda que soe algo futurista. São roupas e acessórios com funções tecnológicas das mais diversas. Roupas que antecipam o ambiente do usuário (elas precisam ser mais quentes, mais frescas, impermeáveis, respirar?) ou outras que permitem acessar dados com um simples gesto na manga de uma camisa ou casaco. Ou, ainda, e mais próximo da realidade, um óculos conectado à internet e um relógio com quase todas as funções de um smartphone.
A ideia cativa. A prática nem tanto. Pelo menos por enquanto. Novidade tem disso mesmo, assusta. Justamente por isso, a aceitação por parte dos consumidores é um dos principais desafios. Pesquisa da empresa americana L2 aponta que 75% dos consumidores estão familiarizados com os wearables, mas só 9% deles querem, realmente, usá-los. O motivo? A aparência.
É nesse contexto que as indústrias da moda e da tecnologia unem forças. Até agora vivendo em total antagonismo (qualquer sinal de preocupação com moda, no Vale do Silício, era tida como frivolidade máxima e inaceitável), viram, uma na outra, o caminho e a solução para o objetivo que têm em comum: a inovação. O mercado, aliás, pede por isso. Hoje, os wearables são um dos segmentos que mais crescem. Segundo o banco Credit Suisse, até 2018, ele deve superar os US$ 30 bilhões de dólares.
De fato, os primeiros modelos disponíveis não se encaixavam na lista de peças que você escolheria para sair de casa, não importavam o destino e a ocasião. Apesar de funcionais, careciam de senso de estilo no design. Meses após seu lançamento, o Google Glass, por exemplo, ganhou novas versões, com desenhos convencionais. Naquela época, poucos sentiam-se à vontade com seu visual sci-fi. Mais recentemente, Diane von Furstenberg, que desfilou o tal óculos em seu verão 2013, assinou uma linha especial do produto e boatos dão conta de que a Warby Parker estaria trabalhando junto ao Google para solucionar tal problema. Mais realidade, menos ficção científica.
A chave está na união perfeita entre design e tecnologia. Está na aparência usual e na função extraordinária. Parte do sucesso que antecipa a chegada do Apple Watch às lojas é justamente o fato de ele se parecer exatamente como um relógio comum. Não altera o que você entende de um relógio visualmente, mas, sim, o que você espera de um relógio.
O flerte começou nos negócios. Nos últimos anos, a Apple contratou duas importantes figuras do business da moda para assumirem operações-chave na empresa: Angela Ahrendts, ex-CEO da Burberry, é hoje vice-presidente de Varejo, e Paul Deneve, ex-CEO da Yves Saint Laurent, vice-presidente de Projetos Especiais. Agora, porém, já se estende para outras áreas, como branding, marketing e no design de produto. O próprio modo de pensar de ambas as indústrias agora já segue algo harmonioso.
Na última semana de moda de Nova York, editores deixaram a cidade rumo a Cupertino, na Califórnia, para o lançamento do Apple Watch e do iPhone 6. Em Paris, evento pop-up na Colette atraiu pequena multidão fashionista em torno do relógio. Este já apareceu em capas de publicações especializadas no assunto, virou item indispensável em editoriais e até ganhou campanha clicada por David Sims, nome dos mais comuns nos principais títulos de moda do mundo.
Parece apenas hype, mas esconde algo mais. Relógios e pulseiras tecnológicos são os itens que consumidores se dizem mais propensos a aceitar no mundo dos wearables. Faz sentido, então, sua máxima exploração e experimentação, se não como marketing, como material de estudo. Pouco depois de assumir seu atual cargo na Apple, Paul Deneve afirmou, em entrevista ao Financial Times, que o Apple Watch é apenas parte de um projeto muito maior no mesmo segmento. Em outras palavras, é só o começo.