Cultura

Paulo Lessa: “Falta o audiovisual ser mais pensado por pessoas pretas”

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Por Ligia Kas e Sophia Lopes

Paulo Lessa, o Ítalo de Cara e Coragem, analisa o estado da representatividade no audiovisual brasileiro – Foto: Jorge Bispo

Em evidência como Ítalo, em “Cara e Coragem”, o ator Paulo Lessa vive seu primeiro protagonista. Engajado na luta antirracista, apesar de ver um avanço na representatividade negra entre atores e diretores, ele pontua que o audiovisual ainda precisa ser “mais pensado por pessoas pretas”.

“Acho que as histórias precisam ser contadas com maior propriedade e é inegável que quem vive essas histórias na vida real consequentemente vai saber contá-las de maneira muito mais íntima e própria”, afirma.

Em conversa com o RG, ele fala sobre seus próximos projetos, o estado da arte no Brasil atualmente e seu projeto social, a Casa Afrodai, um polo de cultura afro-brasileira no Rio de Janeiro que busca mobilizar 0 empreendedorismo negro.

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Leia a entrevista completa abaixo:

RG – Como começa sua carreira como ator?

Eu sempre tive convívio com muitos artistas desde pequeno e era algo que eu admirava, mas eu guardava comigo. Eu trabalhei como modelo durante um tempo e fiz algumas publicidades. Eu lembro que procurando um curso para fazer sem querer achei um teste que falava assim: “Procura-se atores e não atores para filme” e eu falei “ora, não sou ator, mas vou lá fazer esse teste” e simplesmente era um teste para “Tropa de Elite” e eu não sabia. Então, eu caí naquele furacão e eu não fui aprovado para o filme, mas eu avancei muito de fase, eu tive oportunidade ali no teste, sem nunca ter feito um curso de contracenar com grandes atores e aquilo ali foi o estímulo que faltava. Falei: “Cara, eu vou fazer isso aqui! Eu vou estudar e acho que é isso mesmo”. Senti um prazer tão grande de estar ali com aquela com aquela galera, né? E me senti muito próximo daquele mundo. Isso foi em 2005, 2006, mais ou menos.

RG – Como foi o convite para fazer Ítalo, de “Cara e Coragem”?

A novela já estava praticamente toda fechada e a partir da saída de um ator do projeto, eles resolveram abrir testes para o Ítalo e nessa eu fui chamado pela Bruna Bueno para ser testado. Inicialmente entre 15 atores, até ficarmos três atores para o final e finalmente consegui fazer o meu primeiro protagonista.

RG – Como se preparou para o papel, que tem grande destaque na trama?

Nessa questão da preparação, eu tive tive o apoio da Cris Moura, que é uma preparadora de elenco incrível e a gente trocou muito, muitas referências. a gente foi em algumas referências mais óbvias do trabalho de guarda-costas como o clássico “O Guarda-Costas”.

Pegamos também referências não tão óbvias assim, não tão diretas em outras séries e filmes. Por exemplo, para a gente entender um pouco da relação homem-mulher para Clarice e o Ítalo, então a gente viu “Cenas de um Casamento”, da HBO, que é incrível. Teve “Cenas de Um Casamento” e teve “Lupin”, série da Netflix com Omar Sy, que é incrível, uma série de aventura, de mistério, de ação. A Cris Moura e o Marcelo Boechat foram pessoas fundamentais nesse processo de construção.

RG – De que maneira vem sentindo a receptividade do público com seu personagem?

Sinceramente, é difícil ter uma noção da proporção do trabalho. É a primeira vez que faço um personagem desse tamanho, e eu espero que abram novas portas pra mim, estou tendo oportunidade de mostrar meu trabalho, é um personagem com mais camadas, envolvido na trama.

RG – Faz diferença estar de volta à TV Globo? Se sim, como?

Eu acho que faz muita diferença a volta para Globo. Eu acho que eu volto no momento muito mais maduro como ator. Tive oportunidade de ter outras experiências fora e volto no momento mais maduro. A volta para Globo é super importante porque tem uma visibilidade inegável, muito maior, e consequentemente um reconhecimento maior do nosso trabalho.

Paulo Lessa – Jorge Bispo

RG – Você acha que a representatividade preta no audiovisual avançou? O que mais falta?

Acho que a representatividade no audiovisual aumentou sim, isso relacionado aos atores, alguns diretores também e equipe técnica de forma geral, mas acho que o que falta é o audiovisual ser mais pensado por pessoas pretas. Acho que o avanço agora é no sentido dos autores por exemplo, eu acho que as histórias precisam ser contadas com maior propriedade e é inegável que quem vive essas histórias na vida real consequentemente vai saber contá-las de maneira muito mais íntima e própria.

RG – Acha importante manter um discurso antirracista nas redes sociais?

Muito mais importante do que manter um discurso antirracista nas redes sociais é manter o discurso antirracista na vida real, com as atitudes do nosso dia a dia. Não adianta nada a gente colocar um discurso bem bonito e super ativista na rede social quando as nossas nossas atitudes do dia a dia não dizem não dizem isso.

Eu procuro dividir bem isso. Às vezes eu não estou tão presente na rede social. Vou me adaptando, mas com certeza na minha vida real, no meu dia a dia real, eu me movimento bastante na luta antirracista.

RG – De que maneira toca hoje a Casa Afrodai? O que o local oferece exatamente?

Por causa de algumas dificuldades, a gente tentou colocar diversos empreendedores pretos juntos para tocar a casa. Hoje existe uma dificuldade muito grande entre os empreendedores de pretos de ter um capital de giro, de ter uma expertise em liderar os próprios negócios.

Estou agora nesse momento em busca de parceiros e instituições que tenham essa experiência para assumir um compromisso de administrar os projetos sociais, valorização da cultura negra, profissionalização de vários jovens. Hoje, o polo fica na Lapa, uma região que apesar de ser muito turística, de ter um apelo turístico muito grande, existe um descaso da prefeitura e do estado em relação ao bairro. Existem ali muito jovens desempregados no entorno, muito jovens envolvidos em venda de droga, no tráfico. É uma área que, apesar de todo o glamour da Escadaria Selarón e dos Arcos da Lapa, precisa de muito cuidado e atenção do poder público e privado também.

Ator está à frente de projeto social que incentiva o protagonismo negro – Foto: Jorge Bispo

RG – Quais são os próximos planos com o fim da novela? Vem teatro, cinema ou streaming por aí?

Meu próximo plano pós novela é férias com certeza absoluta. Já estou com viagem marcada para Cabo Verde, mas não vou ter muito tempo de férias. Não posso dizer muita coisa ainda, mas é um projeto para TV.

RG – Como você cuida da beleza e saúde?

Eu procuro muitas atividades ao ar livre. Seja uma corrida na praia, um treinamento funcional na praia. Por causa da pandemia, a gente não conseguiu frequentar academias em locais fechados. Então essa atividade ao ar livre deu uma grande opção, eu adoro e não troco mais.

RG – E do cabelo, como cuidar?

A questão do cabelo é o contrário do que muita gente pensa. Foi difundido durante anos que dread é largado, que não precisa lavar, que é cheio de piolho, essas coisas que a gente tem que ouvir anos e anos. Muito pelo contrário, eu cuido muito bem do cabelo. Faço uma manutenção da raiz do dread de quinze em quinze dias, pelo menos. Lavo o cabelo pelo menos a cada três dias.

RG – Como vê a arte no atual momento do País?

Eu vejo a arte como resistência, como um ponto de reflexão e resistência, mesmo no país diante de tudo que a gente esta vivendo, esse movimento totalmente contrário à arte e à ciência. Mas gente vai mudar esse quadro logo, logo.

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