Cultura

Curol quebra paradigmas da cena eletrônica e vive melhor fase da carreira

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Curol comandou apresentação de peso no Rock in Rio 2022 – Foto: Phillipe Guimarães

A música é um importante vetor de mensagens transformadoras. E é capaz de carregá-las mesmo sem precisar de letra. Prova disso é o trabalho de Carolina Ribeiro, a DJ Curol. Natural de Belo Horizonte, Minas Gerais, ela chegou até o palco do Rock in Rio 2022 ajudando a romper as barreiras que foram colocadas para mulheres, pessoas negras e comunidade LGBTQIAP+ na cena eletrônica. “Ainda existe muito preconceito com as pretas, gays e mulheres… se juntar tudo isso numa pessoa só, como é o meu caso, pior ainda!”, comenta.

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O espaço que ela vem ocupando suscita um questionamento: quantas pessoas negras na cena eletrônica você conhece? A verdade é que, na maior parte dos ambientes, dá para contar nos dedos. Essa falta de representatividade é sintoma da estratégia de embranquecimento do estilo musical, que também aconteceu com vários outros gêneros, como o rock. Para entender esse cenário na música eletrônica, é preciso voltar para os anos 1980.

Naquela década, em Chicago, no Estados Unidos, os clubes underground fervilhavam com a música house, em um movimento capitaneado por DJs negros como Frankie Knuckles e Ron Hardy, que experimentavam com bateria eletrônica e sintetizadores pela primeira vez. As mulheres negras também desempenharam um papel central na difusão da cena house. Kym Mazelle, por exemplo, é conhecida como a primeira-dama da música house e creditada pela expansão do estilo para o Reino Unido. No início, o público que frequentava as festas de house era predominantemente negro, latino e queer, até serem descobertas por DJs e produtores brancos.

Essas décadas de apagamento se refletem até hoje. Atualmente, pessoas negras, mulheres e LGBTs lutam para conseguir inclusão na cena, apesar de terem sido as pessoas que construíram as bases para a música eletrônica como a conhecemos hoje.

“Já ouvi de dois DJs brancos que as oportunidades que surgiram para mim são provenientes do apelo da inclusão de mulheres na cena, riscando e anulando toda minha qualidade musical e talento a isso”, compartilha Curol. O que algumas pessoas talvez não enxerguem é que o que ela tem feito pela música house no País fala por si só.

“O lado alegre do Brasil e da África são reconhecidos, justamente, pelas músicas típicas de cada um deles. Nem preciso citar as músicas marcantes do Carnaval, esse sincretismo musical que só o Carnaval brasileiro tem. Por que não trazer essa alegria ao house music? Faço isso misturando elementos orgânicos com percussões e brazilian bass no house”, explica.

Palco New Dance Order durante show de Curol no Rock in Rio 2022 – Créditos: Phillipe Guimarães

Até desenvolver essa sonoridade e estilo próprios, ela passou por diversas frentes na música. “Já toquei violão na igreja, montei uma banda de garagem, frequentei muitos eventos de música eletrônica”, conta. Antes de comandar o mixer, inclusive, ela passou por trás das lentes, prestando serviço fotográfico para agências de DJ e registrando eventos e muitos artistas, como Alok.

“Como sempre fui curiosa, no fundo, eu sabia que meu lugar era no comando da CDJ (Compact Disc Jockey, aparelho usado por DJs) e não atrás das lentes. Desde que tomei essa decisão, deixei tudo de lado e foquei todos meus esforços em aprender ao máximo e criar minha própria identidade musical. Sou inquieta, estou sempre atenta às tendências e desenvolvendo formas de me diferenciar, fazendo músicas que vão além do instrumental, mas que também carregam mensagens, mesmo que sem um vocal.”

Para atingir esse estágio de sua carreira hoje, além de enfrentar o preconceito, precisou superar obstáculos financeiros e “talvez um pouco de falta de fé das gravadoras em relação ao estilo” que faz. “Sempre aquela insegurança que pairava: ‘existe espaço nesse mercado para uma artista como eu?’”. Ao estrear no line up do Rock in Rio, em um palco onde tocaram nomes consagrados da EDM como Kaskade e Lost Frequencies, ela própria responde essa dúvida positivamente.

“Quem tem poder de influência e atua há mais tempo no mercado precisa ver que pessoas como eu e muitas outras com características distintas e diversas podem dar certo e apoiar. O mercado precisa dessa diversidade, isso vai tornar o cenário mais maduro e profissional.”

Daqui para frente, as sementes que ela plantou devem continuar abrindo caminhos para outras mulheres e pessoas negras, até que seja possível dizer que ela foi uma das primeiras na cena, mas que não é uma das únicas.

“Quero ser lembrada por mudanças marcantes no aspecto de inclusão e da diversidade, tudo isso pautado por um trabalho minucioso, criativo e bem feito. Desejo que minha música seja interpretada para além do óbvio e que seja transformadora na vida de muitos. Meu corpo e minha história é política e quem sou como artista está intimamente ligado a isso. A luta é constante, mas a evolução igualmente”, afirma.

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