Dentro do processo de recuperação – assim como em qualquer processo –, a “melhora” não é garantia de um futuro promissor, isento de fracassos, frustrações ou sofrimentos. Pelo contrário, ela é apenas um sinal de que as providências e as garantias necessárias para atingi-la estão sendo tomadas e efetivadas.
Ela é um ganho, um prêmio valioso, decorrente do trabalho árduo e do esforço contínuo e permanente da recuperação. Nesse sentido, ninguém sai pela rua, no meio da noite, em lugar ermo e perigoso, com um objeto de valor – que levou meses, muitas vezes anos para adquirir, à custa de muito trabalho e esforço – ingenuamente à mostra no pulso ou no pescoço.
Com a “melhora”, deve acontecer a mesma coisa: ela não é um escudo, um campo de força, mas, sim, uma joia valiosa extremamente vulnerável a recaídas. Por isso, deve ser sempre protegida – pelo tratamento e pela reformulação do estilo de vida –, ao invés de exposta a fatores de risco como prova de bravura.
O ouro não se presta para o feitio de escudos, mas, sim, para aquisição desses.
Marcelo Ribeiro, psiquiatra, membro do Programa de Pós-graduação do Departamento de Psiquiatra da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), docente do Curso de Medicina da Universidade Nove de Julho (Uninove), diretor do Centro de Referência de Álcool, Tabaco e outras Drogas (Cratod) da Secretaria do Estado da Saúde de São Paulo, presidente do Conselho Estadual de Políticas sobre Drogas de São Paulo (Coned).