Ney Matogrosso – Foto: @marcoshermes
Desde que surgiu à frente da explosão dos Secos & Molhados, em 1973, Ney Matogrosso passou a representar a liberdade personificada, um símbolo de insubmissão artística e comportamental. Faz o que quer, como, onde, quando e com quem ele decidir. Torna-se especialmente impactante para um artista com essa personalidade o isolamento a que todos fomos submetidos no último ano e meio, presos em casa e sem grandes perspectivas de saída.
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Criar era questão de vida, de voo. O álbum “Nu Com a Minha Música” (Sony Music) é resultado desse período. Mais do que um retrato desses tempos sombrios, o trabalho representa um mecanismo de libertação. Ou, como define o cantor, uma via para sair da escuridão. É um projeto especial na trajetória de Ney Matogrosso em muitos aspectos, portanto. Emocionais, artísticos, afetivos.
Quando concluiu que tinha as 12 faixas do álbum definidas, Ney foi entender os próximos passos dessa produção tão peculiar, muito diferente de todas as que fez no passado. Por razões óbvias, encontros com os músicos, preparações presenciais ou quaisquer outros tipos de aglomeração estavam descartados. O processo teria que ser um tanto mais solitário, feito remotamente, cada um em seu lugar seguro. Ney tirou os tons pelo telefone, combinou arranjos a distância e chegou às gravações das vozes sem nenhum ensaio. Tudo muito novo. Mas, se por um lado o método trouxe esses entraves logísticos, por outro abriu condições para que o álbum não tivesse que ficar restrito a apenas um estúdio, uma banda, um produtor, como costuma acontecer em tempos de normalidade.
Sob essa prerrogativa, Ney foi atrás dos quatro produtores com quem vem trabalhando mais nos últimos tempos. Dividiu o repertório em quatro e entregou um trio de canções para cada um: Sacha Amback, Marcello Gonçalves, Ricardo Silveira e Leandro Braga. Também deu carta branca para que usassem as formações que achassem mais adequadas.
“Nu Com a Minha Música” é especial também por essas razões, já que o modo de produzir arte modifica necessariamente sua estética. As cores se abriram. Se há no álbum momentos densos de voz e piano, há também o Carnaval e a sacanagem em arranjos grandiosos. Toda essa diversidade criou um roteiro que mistura ficção e memória, como aconteceu também nas melhores obras geradas nesse período pandêmico. Todo esse sentimento está espelhado no repertório final do álbum de Ney.