Por Vanda Jacintho
“Darling, esta sala está impraticável. Vamos tomar um drink no Claridge’s?” Foi assim meu primeiro encontro profissional com Isabella Blow, a icônica e excêntrica editora inglesa com quem tive o prazer de trabalhar. Era 2005. O hotel Claridge’s combinava com ela. Não à toa, era seu lugar favorito para reuniões de trabalho. Sempre com um dry martini em mãos.
Isabella tinha um talento para o novo. Apostava em gente fresh. Assim descobriu um jovem Alexander McQueen, um promissor chapeleiro Philip Treacy, um sem-fim de modelos em começo de carreira… e assim apostou em mim, então uma menina brasileira com pouca experiência. Tinha visto uma matéria minha para uma revista inglesa.
O tema era futebol e Brasil. E ela adorava esse país. Era louca pela Fernanda Tavares. Lembrou que já havia editado uma matéria minha para o jornal Sunday Times e me mandou um e-mail. Voltei para Londres correndo. Não é todo dia que se recebe uma mensagem com aquela remetente. Antes de tudo, acho que ela gostou de mim pelo meu estilo. Como Isabella, adoro cores. E sempre fui um pouco excêntrica também. Tínhamos ainda em comum o dry martini com pouquíssimo Vermute.
Depois da primeira reunião, me fez o convite. “Quer trabalhar comigo?” Aceitei prontamente. Era um privilégio estar perto dela. Isabella estava sempre overdressed. Era vibrante. Gostava de cores, de looks completos e de temas. Um dia era 100% Moschino. No outro aparecia de poás ou com estampa de naipes de baralho. Sempre combinava suas roupas com chapéus altíssimos de Philip Treacy. Nunca vou me esquecer de um dia: quando cheguei à editora, haviam quebrado, a pedido dela, o batente de sua sala. Para que ela pudesse entrar sem tirar seus chapéus. a minha coleção deles, aliás, só fez sentido depois de ver os dela, que eram muito mais excêntricos, como um de lagosta, que ela adorava. Acho que que foi por causa dele que ela quebrou as paredes.
Isabella era espirituosa, engraçada. Falava alto, muito alto. Tudo nela era exagerado. Andava cercada por um sem fim de assistentes. Mas não fazia o tipo o diabo veste Prada. Pelo contrário. Estava sempre aberta a ouvir quem estava ao seu redor. Era dali que vinham as suas inspirações. Nunca se pautou por tendências, até porque gostava de descobrir as suas próprias. Avant-garde em todos os sentidos. E tinha uma queda pelo erótico, tema que sempre permeou os seus trabalhos.
Me lembro da última vez que a vi. Fomos ao Claridge’s, claro, para mais uma reunião. Ela pediu um dry, como de costume. As roupas seguiam coloridas, mas a sua essência… Isabella estava deprimida. “Sinto que estou em um quarto escuro e não consigo acender a luz”, disse, sem saber que, ainda assim, iluminava aquele hotel inteiro. Morreu no dia 8 de maio de 2007, aos 48 anos de idade, depois de ingerir remédios. Deixou a moda carente, bem menos autêntica, muito mais sem graça. Deixou um legado multicolorido. Deixou histórias e saudades.
Soube da exposição em sua homenagem, que acontecerá em Londres, na Somerset House, neste mês. Estou de volta à cidade, para uma temporada de cursos. Me lembro dela por aqui. Quero assistir. Vou vestir a minha saia Matthew Williamson e colocar meu chapéu amarelo Victoria Grant na cabeça. Com um look à altura dela, vou ao Claridge’s tomar o seu dry martini. E brindar ao legado de uma mulher que é a síntese do que a moda deveria ser. Antes todas fossem iguais a você, Isabella. Cheers, darling. E obrigada por tudo.