Top

Monica Carvalho e Klaus Schneider ocupam o complexo Frade, em Angra

Foto: Divulgação

Por Bruno Calixto

A previsão do tempo para o fim de semana em Angra dos Reis (RJ) estava entre 18ºC e 24⁰C, com possibilidade de chuva, quando as vassouras da artesã e artista plástica carioca Monica Carvalho varreram para bem longe as nuvens carregadas, abrindo um clarão no céu, com direito a lua cheia.

É dela a exposição “Habitat Brasil”, inaugurada no último fim de semana, dentro do complexo Frade, na praia de mesmo nome, onde fica o Hotel Fasano. Aberta ao público até o fim deste mês, a mostra reúne trabalhos de Monica e também do marido, o alemão Klaus Schneider, um exímio colecionador de dentes de tubarão, coletados em uma praia holandesa há mais de 20 anos.

Monica Carvalho – Foto: Divulgação

Moradora do bairro Peixoto, no Rio, Monica é conhecida por transformar elementos recolhidos na natureza em obras de arte, daí as dezenas de vassouras transportadas para Angra, além de muitos outros trabalhos únicos, criados a partir de sementes, fibras, troncos, pedras e sobras orgânicas.

“As vassouras sempre existiram em minha trajetória, desde 1998, e isso foi se perpetuando de uma maneira muito simplória”, diz Monica. “A vassoura é capaz de encantar homens e mulheres, crianças e velhos. Em todo filme, tem alguém varrendo. Elas são arquétipos, associação imediata e familiar, sua origem vem das cavernas e nunca se modificou, uma reunião de gravetos, quase que um DNA próprio. E ainda representa o território de onde vem este material, aqui por exemplo temos um capim-vassourinha, de Minas Gerais.”

Madeiras, plantas e troncos de árvores descartados ou subaproveitados para produzir arte, entenda por isso Land Art, um tipo de arte em que o terreno natural, em vez de fornecer o ambiente para uma obra de arte, é ele próprio trabalhado de modo a integrar-se à obra.

Foto: Divulgação

Pelo seu aspecto real-naturalista, “Habitat Brasil” é um diálogo na outra ponta da circunferência com as obras emblemáticas cuja temática é natureza morta. Entre elas, “Girassóis” (1888), de Van Gogh, “Cesto com frutas” (1596) de Caravaggio. “Cesta de maçãs” (1893), de Cézanne, “Viva la Vida” (1954), de Frida Kahlo, e “Natureza morta com melão” (1872), de Monet.

É um convite para nos aproximarmos do nosso imenso e diverso Brasil. “Os materiais, conectados de forma tão inventiva, conversam com linhas e cores, ganhando novos corpos, novas possibilidades de existência até se tornarem, finalmente, objetos de arte”, afirma Monica.

A mostra também reúne criações que homenageiam a flora e fauna brasileiras. Uma espécie de presépio está montado no fim do salão, com uma série de bichos criados, nomeados e batizados por Monica, com a ajuda de Klaus, que cuidou de acrescentar o signo de cada um. Do “queridinho” é o aquariano “Egberto” (primogênito de papel marchê e com pênis retrátil, do fruto de jequitibá) à geminiana “Margalagarta”, uma homenagem da artista à sogra.

“Uma floresta imaginária. Devaneios de liberdade. Pura diversão. Uma família heterogênea. Criaturas possíveis”, descreve Monica que, há 25 anos, percorre o Brasil numa relação de troca e aprendizado com comunidades indígenas, populações ribeirinhas, artesãos e produtores artesanais, coletando e cultuando o que chama de “presentes da natureza” – sementes, fibras, troncos, pedras e sobras orgânicas.

Schneider, desde menino, usava seu canivete para esculpir tocos. Quando adolescente, a curiosidade pelos materiais orgânicos levou-o a desenvolver o hobby de fazer móbiles. O fascínio pela madeira abriu um universo único de criação. Atualmente, esculpe o cedro brasileiro e queima sua superfície. O resultado deste processo são ripas que precisamente alinhadas e equilibradas, formam móbiles, painéis e esculturas. Nada é descartado, pois o que resta depois de cortado leva a outras formas de criação.

“Para somar ao paralelo com a biografia deste lugar que preserva o ambiente ao seu redor, apresentamos ainda algumas fotografias de José Senna, morador do Frade há mais de 30 anos, que mostram as belezas locais e as fases de vida em decomposição da matéria orgânica e foram selecionadas especialmente para a exposição”, conta Fernanda Moreira, diretora de marketing e comercial do Frade Vilas.

Foto: Divulgação

As obras do casal de artesãos Monica Carvalho e Klaus Schneider são um recado de alerta que ressignifica o clichê “menos é mais”, revelando-nos que o luxo está no conforto ligado à natureza, na sofisticação das formas geométricas. Em breve, alguns destes objetos irão para uma exposição em Miami – a primeira fora do Brasil -, a convite da Fundação Copper Bridge, mantida pelo cubano Geo Darder, que prioriza artistas latinos.

“Habitat Brasil” reúne o propósito e a essência de um complexo de ideias e valores. Quase um sobressalto orgânico, e de frente para o mar verde esmeralda de Angra. Uma galeria de arte sem igual.

Frade Vilas / Fasano. Vila Maris. Praia do Frade, Angra dos Reis (RJ): Rod Gov. Mário Covas Km 512.Visitação: diariamente, das 9h às 17h. Até 31 de julho. Grátis.

Mais de Cultura