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Gustavo Vaz fala sobre romance de estreia, que reflete sobre masculinidade tóxica e saúde mental

Gustavo Vaz

O ator Gustavo Vaz acaba de lançar seu primeiro romance, “Como não morrer de uma só vez ” – Foto: Caio Oviedo

Talvez você o conheça por sua participação na série “Coisa Mais Linda”, da Netflix, na qual interpretou Augusto Soares, par de Lígia, personagem de Fernanda Vasconcellos. Na produção brasileira do streaming, o ator Gustavo Vaz era um homem violento que cometeu feminicídio. O tema da masculinidade tóxica voltou a aparecer em seu trabalho, mas no livro “Como não morrer de uma só vez”, seu primeiro romance.

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A obra apresenta a história de Walter, um homem que comete suicídio e tem a chance de voltar a viver e mudar sua própria história, graças a um pacto com o Nada. Neste retorno, no entanto, seu corpo limita sua ações, ele luta contra crises de pânico, faz descobertas assombrosas e se depara, mais uma vez, com o pai violento.

“A relação com o pai é uma representação clássica do patriarcado. Um homem violento, misógino e racista. Walter quer fugir desse pai e se transformar em outra coisa”, afirma Vaz. “Acho que é o momento que estamos vivendo. Certamente nós homens estamos bastante perdidos. Vejo uma parcela tentando fazer um movimento de mudança, mas o privilégio está ligado a conforto, facilidade e racionalmente é difícil as pessoas quererem abrir mão.”

Capa de “Como não morrer de uma vez só”, primeiro romance de Gustavo Vaz – Foto: Divulgação

Além das relações de gênero, o livro traz outros temas extremamente atuais, como saúde mental e a busca por sentido. “Esse personagem é uma representação simbólica das pessoas que não encontram sentido nesse mundo que está posto. Não é um mundo feito para contemplar os sentidos das pessoas, as múltiplas formas, desejos e maneiras de existir, ou você se enquadra em um formato ou você está fora”, diz o autor.

“Não há nenhum desejo de romantizar o suicídio, muito pelo contrário. mas sim de trazer essa situação provocativa para a gente olhar para a nossa própria finitude. Olhar para essa certeza de finitude me parece importante.”

Foto: Caio Oviedo

No Brasil, assim como em outras regiões das Américas, existe uma dificuldade em conter o aumento do número de suicídios, na contramão do que vem acontecendo em outras partes do mundo. Segundo dados do DataSUS, as mortes por lesão autoprovocada entre 2011 e 2020 aumentaram 35%.

“Para quem conseguiu perceber, talvez a pandemia tenha trazido o quanto o contato com o outro é importante”, pontua Vaz. Ele próprio, durante esse período, passou por “um lugar de muita dor e crise existencial”. “O livro surgiu dessa necessidade de encontrar sentido. Não é um livro biográfico mas carrega sensações que estavam me atravessando na época”, conta.

A obra consolida o início oficial de sua trajetória como autor, mas isso é algo que ele já vem fazendo há anos à frente de seu projeto ExCompanhia de Teatro, um coletivo de artistas que trabalham com múltiplas formas de expressão, incluindo peças e ocupações artísticas nas ruas. “Ali eu comecei a escrever, me tornei dramaturgo do grupo.”

Foto: Caio Oviedo

Na literatura, ele ressalta, existe um perigo: “Não tem nenhum personagem para me proteger enquanto autor”. “No livro, apesar de existirem os personagens, você está lidando com a palavra direta, uma criação autoral. É um trabalho arriscado, mas muito provocador, no sentido positivo”, afirma.

A iniciativa mais recente de sua companhia de teatro é um projeto no Centro Cultural Penha, um audioguia que leva os ouvintes a andarem pelas ruas do bairro, resgatando a presença negra na região. “A gente parte da história oficial para a visitar uma história invisibilizada. É um bairro que tem uma presença preta super importante, um legado muito triste de escravidão. A Penha é um microcosmos do Brasil, essas vivências estão em todo lugar mas normalmente não são faladas.”

Um produtor cultural nato, Vaz está sempre em movimento, guiado pelo propósito de transformação social por meio das expressões artísticas. “O teatro é essencialmente um lugar ritualístico. Tanto que quando você assiste a uma peça ruim, normalmente, é muito ruim, e quando é boa, é inesquecível. Acho que eu, viciado em teatro, acabo buscando esse ritual nas coisas que faço. Esse sentido, esse propósito.”

“Tento me aproximar de projetos que tenham um propósito claro de por que existem no mundo. Sei que existe a necessidade de pagar as contas, as redes sociais, os algoritmos que ninguém sabe o que fazem, mas ainda assim eu me agarro à utopia.”

Livro “Como não morrer de uma só vez”, de Gustavo Vaz

R$ 79,90

Disponível aqui

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