Talvez você não a reconheça pelo nome, cuja grafia não é simples, mas, com certeza, já deve ter visto um dos papeis que interpretou ou que escreveu para outros. Priscila Sztejnman, atriz e roteirista, é Helena de “Vai na Fe”, trama das 19h da TV Globo, e que tem feito sucesso.
Helena é a personal de Clara [Regiane Alves], que é casada com Theo [Emilio Dantas], com quem vive um relacionamento abusivo. Cada vez mais próxima de sua professora, Clara e Helena terão um relacionamento, mostrando mais uma vez a diversidade na televisão brasileira. “Helena é protagonista de sua vida. Autêntica, segura e delicada. Se eu tivesse que escolher uma parte do corpo para definir a Helena, seria o plexo solar.”
Formada em cinema e artes cênicas e com pós-graduação em letras e artes cênicas, Priscila é daquelas pessoas que estão sempre produzindo alguma coisa, e, no momento, ela está concentrada tanto em sua personagem na novela como escrevendo para futuras séries, inclusive para o streaming. “Um produtor já se interessou em produzir uma série de “dramédia” que eu escrevi. Estamos no início desse processo de desenvolvimento”, conta.
Leia a seguir papo que RG teve com a atriz e roteirista Priscila Sztejnman.
Sou formada em duas faculdades: cinema pela PUC -RJ, e artes cênicas pela UniverCidade. Me formei recentemente numa pós-graduação em letras e artes cênicas pela PUC-RJ, chamada “O corpo e a palavra nas artes da cena e da imagem”. Agora estou namorando um mestrado também em letras que assim que possível vou fazer.
Começou a partir do encantamento. Me sentia encantada quando era eu criança e ia no teatro com os meus pais. Pedi para estar no palco, quando estava na plateia, apontava, quase como quem aponta um arco e flecha, dizendo que queria estar lá. Meus pais me levaram para o Tablado (escola de teatro-improviso, fundada pela Maria Clara Machado), onde estudei dos 10 aos 20 anos. Aos 15 anos, eu já estava com meu primeiro emprego como atriz, de carteira assinada, morando e atuando numa peça em São Paulo. Eu fazia parte de uma companhia teatral que fizemos peças no Rio e São Paulo. Depois, aos 18, fui morar um ano em Israel, onde escrevi, dirigi e atuei em hebraico numa peça de teatro no Kibutz em que morei. Quando voltei, entrei para a Oficina de Atores da Globo e comecei a trabalhar em novelas. Então ao longo desses 20 anos de profissão comemorados este ano, já atuei em 7 filmes (destacando: “Segundo Tempo”, “4×100, Correndo por um sonho”, “Maria do Caritó”), 11 peças de teatro (destacando: “Rita Formiga”, “Como a Gente Gosta”, “O Céu Está Vazio”), 6 séries (destacando: “Justiça”, “Questão de Família”, “Sob Pressão”), e 6 novelas (destacando “Vai na Fé”, “Totalmente Demais”, “Novo Mundo”).
A escrita está presente na minha vida desde sempre, mas acho que levei mais tempo para entender essa prática como uma profissão. Escrever sempre foi uma paixão, uma necessidade. Escrevia as peças de fim de ano do Tablado, das mostras de esquete… Escrevia e criava meus próprios jogos quando era criança. Era fluido e natural para mim escrever. Sempre pensava em mim como atriz, mas como autora veio depois. Mesmo assim também foi uma carreira que comecei nova, aos 22. Quando criança escrevia muitas cartas, poesias e redação era sempre meu destaque na escola. Até que na faculdade de cinema, que fiz para me formar com foco em roteiro, eu era aluna da Clélia Bessa que leu um trabalho meu e me apresentou para a Rosane Svartman que estava montando a primeira equipe de novela dela. Ela me encomendou alguns textos, eu escrevi e, aos 22 anos, já estava trabalhando na equipe de roteiristas da minha primeira novela. De lá para cá, já trabalhei em equipes de novela, minissérie, programas de variedade. Estreei como autora titular com o especial de Natal “O Natal Perfeito” e desenvolvi uma novela como titular que fiquei quatro anos escrevendo. Fiquei como autora exclusiva da TV Globo dos 22 anos aos 34 anos, sendo a autora mais jovem a assinar algum projeto. Essa semana li uma frase do meu livro atual “As Margens e o Ditado”, que me identifiquei bastante. Dizia assim: “Quando escrevo sou apenas uma sensibilidade”. Na verdade, me sinto assim como artista, tanto quando atuo, quando escrevo, sinto que sou principalmente uma sensibilidade.
O Paulinho Silvertini, diretor artístico, viu meu trabalho no filme “4×100, Correndo Por um Sonho” e me ligou me convidando para atuar na novela. Eu já havia trabalhado alguns anos com ele na dinâmica diretor-autora e, desde lá, ele já me dizia que eu era o tipo de atriz que ele gosta de escalar. E não deu outra. Ele honrou com a palavra e me chamou para dar vida a Helena. E como eu também confio totalmente no texto da Rosane, para mim foi um convite perfeito.
Helena é protagonista de sua vida. Autêntica, segura e delicada. Se eu tivesse que escolher uma parte do corpo para definir a Helena, seria o plexo solar. Ela é peito aberto, bem resolvida, alto-astral, iluminada. Quando sorri, ilumina o espaço e o outro. Ela vive como acredita. Não passa por cima de seus ideais para agradar ninguém. Luta por equidade.
Não. Minha estreia como atriz no cinema foi interpretando a personagem Ju, do filme “Pequeno Dicionário Amoroso 2”, que era uma garota bissexual. Foi a primeira personagem que fiz que se envolvia com outra mulher. Fiz par com a Fernanda Vasconcellos. E agora a Helena, que é lésbica e nunca nem namorou com homem nenhum. Adoro esse histórico dela. Acho corajosa uma pessoa que desde nova se envolveu somente com quem quis, que abraçou seus próprios desejos sem ser afetada pelo que a sociedade muitas vezes pode acabar impondo, com um padrão ultrapassado e relacionamentos exclusivamente heterossexuais. Helena é uma mulher livre.
Totalmente. Acho necessário e urgente falarmos com todas as possibilidades de público. Precisamos ter mais representatividade em todas as áreas. A verdade é que as pessoas não cabem em estereótipos e a dramaturgia de um tempo para cá está conseguindo suprir mais a complexidade dos personagens, com menos dicotomia e mais autonomia. Assumirmos as multiplicidades que compõem a nossa sociedade.
Ela é uma parceira incrível que está sempre atenta a tudo. Muitas gravações ficamos só nós duas, então conseguimos aprofundar as conversas, ter trocas genuínas. Ela é uma ótima atriz, com muita experiência e carisma. Está fazendo um trabalho incrível com a Clara [personagem de Regiane Alves].
Maravilhosa. É bom interpretar uma personagem cativante, positiva e que o público torce para ter mais história. Helena está sendo um presente. Acompanho os grupos de fã clube que vão surgindo e o carinho é recíproco.
Trabalhei com o Kaue Telolli em um filme que atuamos juntos e ele me indicou para o diretor Rubens Rewald, que me chamou para fazer o teste para o filme novo dele. A princípio ele achou que eu não tinha o perfil da personagem, porque eu sou carioca e a personagem era paulista. Ana é mais nova que eu e nós somos bastante diferentes. Eu sou alegre, extrovertida, solar, sorridente e Ana é meu extremo oposto. Mas eu acredito muito em fazer teste e experimentar. Por exemplo, em dois trabalhos seguidos já interpretei uma advogada de 30 e poucos anos que era um mulherão e uma atleta de 20 e poucos anos que era uma super menina. Já passei pela experiência de me verem e acharem que eu não tinha o perfil de determinada personagem, mas depois de fazer o teste eu peguei o papel. E foi assim no filme, fiz o teste para Ana e peguei o papel. Agradeço ao Rubens por ter confiado em mim para dar vida a Ana.
Ana é uma menina que ama ler. É apaixonada por poesia. Trabalha numa biblioteca. Vive com o que acha necessário. Sem excessos. Tem uma relação conturbada com o irmão e é muito próxima do pai, que é alemão. Ana está atravessando uma depressão. E vai precisar mergulhar nas suas sombras para se encontrar.
O filme é sobre a busca da identidade, sobre ir de encontro às suas raízes, sobre o processo, o percurso. Sobre o caminho ser tão importante quanto o destino final. Conta a história de dois irmãos, Ana e Karl, que depois de perderem o pai, vão para a Alemanha tentar reconstruir e conhecer a história da família. É lindo o filme, todo mundo que o assiste se conecta, se emociona e adora. O filme participou de vários festivais e ganhou prêmio de melhor Filme no festival de Punta Del Este. As histórias sempre nos chegam fragmentadas e incompletas e cabe aos personagens irem tentando construir esse quebra-cabeça.
Eu fui a autora mais nova a assinar como titular lá na Globo. Comecei muito nova. Com 22 anos já estava na minha primeira equipe, na primeira novela da Rosane Svartman. Depois escrevi “Na Moral”, do Pedro Bial. Trabalhei com o Daniel Burman (diretor e escritor argentino) em uma minissérie. Criei a dramaturgia de especial de Natal na emissora. Assinei o especial “O Natal Perfeito”. Desenvolvi uma novela como titular. Agora, depois de 12 anos contratada exclusiva, vou ter um relacionamento aberto com a Globo, podendo tanto trabalhar lá, quanto em todas as outras plataformas. Estou animada com o que está por vir. Acho que será um movimento importante para a minha carreira. Me lançar em novos voos.
Estou desenvolvendo alguns projetos paro o audiovisual. Tanto filmes quanto séries. Uma série já está sendo desenvolvida, mas não posso ainda detalhar. Cada projeto tem o seu tempo de maturação. Estou organizando todos os meus projetos e ideias para apresentar para as plataformas e produtoras. Vai ser divertida essa nova fase. Estou conversando com algumas possibilidades de atuação no cinema e em série também. E pretendo voltar para os palcos. Minha última peça foi o monólogo “Rita”, do Domingos Oliveira, e agora estou estudando novas ideias.
Sim. Um produtor já se interessou em produzir uma série de “dramédia” que eu escrevi. Estamos no início desse processo de desenvolvimento.
Acho que o streaming percebeu que precisa estar sempre em dia com a diversidade. Assim como em todas as áreas. É necessário ter mulheres ocupando todas as camadas de uma empresa e principalmente em cargos de liderança. O mundo está progredindo em relação à representação das mulheres, mas ainda há muito a ser feito. Temos capacidade, potencial e condições de ocupar todos os lugares que também são nossos, por direito.
Tenho fases. Eu coloco um tempo limite para a minha rede social. Porque é comum perdermos a noção de tempo quando um clique gera outro e, quando vemos, estamos automaticamente passando para o lado vídeos aleatórios. Parei de dormir com o celular perto, para não cair em tentação. E prefiro usar o tempo para ler meus livros antes de dormir. Acho que a pandemia me gerou um incômodo de postar vida pessoal. Fiz uma creche para a minha filha por exemplo, algo que foi magnífico para ela, durou um ano inteiro e eu não postei nada sobre isso porque achava que a pandemia estava causando muito sofrimento para todos e não me sentia tão confortável de postar essa solução que pude ter a oportunidade de criar. Quando a pandemia passou que me senti melhor de falar sobre isso com a perspectiva de inspirar. Gosto de postar conteúdos que façam bem para a saúde mental alheia. Sinto mais prazer em postar sobre minha vida profissional do que pessoal porque não gosto de expor meus amigos e familiares, que não necessariamente escolheram uma vida profissional pública. Mas é nítida a sensação de ansiedade que a rede social pode, às vezes, causar, existem inúmeros estudos sobre isso. Então precisamos estar atentos aos nossos limites, saber o quanto nos faz bem e o quanto nos prejudica. É fundamental respeitarmos os nossos limites. Acho muito útil me conectar com conteúdos que me inspiram e me acrescentam. E confesso que os momentos mais legais da minha vida eu não estou postando, estou vivendo.
Obrigada :). Comecei a cuidar da minha pele recentemente, usando creme antes de dormir. Tenho uma rotina que minha dermatologista me passou e me acostumei a fazer. Fiquei alguns anos sem ir à dermatologista, o que está errado e hoje em dia entendo o cuidado com a pele como uma atitude referente à minha saúde. Não é sobre estética, isso é consequência. A causa mesmo é a saúde. É limpar e hidratar o maior órgão do nosso corpo que é a nossa pele. Então toda noite, lavo com um sabonete, passo um tônico adstringente e depois um creme hidratante. Tudo manipulado de acordo com a minha pele. Entrou nas minhas práticas de higiene como escovar os dentes. E passei a usar filtro solar diariamente. Me obriguei a criar esse hábito necessário. No meu dia a dia, não costumo muito usar maquiagem, ando mais com a cara lavada, bem natural. Além de ter preguiça de tirar maquiagem, fora os dias de gravação, não me incomoda uma olheira como um dado de realidade, por exemplo. Uma espinha nascendo fruto da TPM. Uma cicatriz de uma história da infância. Acho que são dados reais, de uma vida concreta, uma história de vida. Por que as mulheres são incentivadas a se maquiarem, esconderem seus traços, e os homens não? Por que a mulher é estimulada a pintar o cabelo enquanto o homem grisalho é associado à maturidade saudável? Gosto da beleza natural, sem muitas interferências. Consigo ver beleza nas coisas e nas pessoas além da aparência. Acho que a beleza é resultado do estado de espírito da pessoa. Consequência de quem ela é. Acho que é sobre estar em dia com os seus desejos, sobre fazer alguma atividade que você se sinta bem, seja caminhar, fazer ioga, um esporte, correr, malhar, dançar… Eu, por exemplo, me sinto linda quando acabo uma prática de ioga, quando leio um ótimo capítulo de um livro, quando medito, quando acabo de escrever mais uma página de algum projeto, quando volto de um bom dia de gravação. Porque significa que fiz algo que me fez bem. Que me fiz companhia e me conectei com a minha essência.
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