Por Lígia Krás
“Bichos Tubulares Mares Internos” está em cartaz no Parque Cultural Casa do Governador, em Vila Velha, Espírito Santo – Foto: Divulgação
Conversar com Isabela Sá Roriz é fazer uma imersão no universo de alguém que respira arte em toda sua subjetividade. Mestre em Linguagens Visuais pela UFRJ, premiada em primeiro lugar na XX Bienal de Santa Cruz de La Sierra alguns anos atrás, a artista visual que vive e trabalha no Rio de Janeiro, está agora com um projeto imperdível no Parque Cultural Casa do Governador, em Vila Velha, Espírito Santo. Quem passear pelo parque vai encontrar peças escultóricas que convidam ao silêncio e ao olhar interior.
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RG – Conta um pouco mais sobre seu novo trabalho?
Este projeto se chama Bichos Tubulares Mares Internos e tem como ponto de partida a frase do autor Deane Juhan: “O ser humano é uma coisa que a água inventou para poder sair andando por aí.”
Em nosso âmago, somos liquidez atuando em parceria com vasos e tubos. Mantemos padrões de movimento, esponja e pulsação dos bichos tubulares, seres pré-vertebrados do mar em nossas células. Todo organismo pulsa. Somos 70 por cento água, 80 por cento fluido, apesar de nos sentirmos tão sólidos.
Assim, o trabalho é inspirado poeticamente na ideia de que, se as primeiras células orgânicas estavam no mar, a partir do momento que viramos seres multicelulares, o mar veio para dentro de nós. “Somos mares, oceanos, rios internos” (Bonnie Bainbridge Cohen)
RG – Então, por que falar sobre água, sobre a liquidez de nossos corpos na arte contemporânea?
Tem uma frase no espetáculo da Cia. Dani Lima Aonde Estamos Imersas que acho maravilhosa: “Eu sou molhada por dentro, você é molhada por dentro”. Conjugada a essa ideia, sabemos que estamos vivendo processos de desertificação, tanto no clima, como no social, no humano e no político: o aquecimento global e a manutenção de práticas destrutivas e exploratórias de recursos naturais e humanos, sustentadas pela onda ultraconservadora das políticas de extrema direita, ressecam o meio ambiente e nossos corpos. Não estão fora de nós, mas em nós. Nossos afetos e subjetividades também sofrem com esses processos. Pois somos água. Assim o aquecimento global, os processos de desertificação que estamos vivendo não estão lá, no ambiente, mas em nós.
Foto: Divulgação
RG – Quais obras resultaram da sua ideia?
São três esculturas moles, em dimensões que se relacionam entre a escala humana e a da paisagem, em formatos tubulares. Elas foram produzidas manualmente em elastômeros usados na produção de próteses humanas, assim possuem densidades corpóreas e uma textura de carne. Elas estabelecem uma relação íntima e silenciosa com as árvores com as quais estão conectadas, dentro do bosque de ocupações temporárias do Parque Cultural Casa do Governador.
RG – Para finalizar, gostaria que você falasse um pouco sobre a introspecção presente na sua obra.
A ideia desse trabalho é trazer uma reflexão sensível, buscar uma atenção no corpo, convidando ao olhar interior e ao silêncio.
O conceito de silêncio faz referência às possíveis qualidades que dele se propagam, tais como a delicadeza, a invisibilidade, a sutileza, o mistério, o anti-espetáculo… Um esvaziamento do mundo exterior para deixar transbordar os sentidos mais sutis. “Bichos Tubulares, Mares Internos” convidam ao silêncio e a uma abordagem introspectiva, buscando um estado de presença e de atenção no corpo. Um convite à poesia e ao fortalecimento sensível e a compreender-se como parte integrante do ambiente, e não separado deste.
“Bichos Tubulares, Mares Internos”, de Isabela Sá Roriz
No Parque Cultural Casa do Governador, em Vila Velha, Espírito Santo.
Até 31 de maio de 2023.