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Ramille: “Os pretos precisam ocupar cada vez mais espaços”

Foto: Carlo Locatelli

Melissa não gosta de samba, Melissa não gosta de trabalhar. Ela quer ficar rica do dia para a noite e é ousada, safadinha. Essa é a personagem da carioca Ramille, de 24 anos, que está se destacando na série “Encantado’s”, do Globoplay. Moradora do bairro de Irajá, subúrbio do Rio de Janeiro, ela é formada em publicidade e propaganda, mas sua veia artística sempre falou mais alto, e teve o apoio dos pais.

Morou três meses na China atuando como cantora e dançarina no espetáculo brasileiro, “Ginga Tropical”, também já foi passista do Salgueiro e na TV, participou do reality “Got Talent Brasil”, da Record TV.

Vivendo sua primeira personagem na TV e também seu primeiro trabalho como atriz, ela declara: “Melissa é uma jovem mimada, affro-Patty do subúrbio, abusada e safadinha, uma menina mulher cheia de atitude, mas que não gosta de trabalhar e que não curte e não se envolve com o samba.”  E finaliza: “Estou vivendo um sonho acordada”.

A série, que tem elenco predominantemente preto, a representa. Ela diz que o fato de olhar para o lado e ver preto, é uma coisa importante e incrível. “Essencial. Superimportante, necessário, eu acho que já estava tarde para isso acontecer”, diz. Determinada e louca pelas redes sociais, Ramille é uma jovem bastante ativa na internet. Acredita que posicionar-se nas redes é fundamental para despertar o pensamento alheio. “Com certeza, porque querendo ou não a gente influencia as pessoas, as coloca para pensar. Então, eu acho importante, sim, eu me posiciono, e acho que é nosso papel de certa forma, embora eu ainda seja micro, se eu puder pôr um pensamento na cabeça de alguém para questionar… Acho importante.”

Leia a seguir o papo que RG teve com a artista via Zoom.

Você nasceu no subúrbio do Rio, como foi sua infância?

Minha infância foi maravilhosa, eu sempre brinquei na rua, meus pais sempre me deixaram livre para eu ser quem eu quisesse, então me envolvi desde sempre com arte, fazia street dance, fui passista, na escola eu me enfiava em tudo para poder participar. Então foi uma infância bem leve, bem divertida. Meus pais sempre ficaram muito no meu pé com a questão dos estudos, eu sempre estudei muito. Hoje em dia eu penso, às vezes, ai que saudade de ser criança.

Foto: Carlo Locatelli

Como se descobriu atriz, porque você estudou publicidade, certo?

Desde muito pequena eu via filmes e tudo o que passava na TV e sempre fiquei muito encantada, até que em 2014 a minha vontade de fazer teatro ficou muito forte dentro de mim. Pedi para os meus pais e eles embarcaram comigo, me colocaram no Tablado, onde estudei três anos. Daí me afastei um tempo do teatro e fiquei só com a música, até que no fim de 2019, quando eu voltei da China, minha mãe sugeriu que eu retomasse com tudo a carreira de atriz. Me inscrevi em um curso de verão da CAL (Casa das Artes de Laranjeiras) e foi onde conheci minha professora, com quem faço aulas até hoje de interpretação para TV e cinema. Durante a pandemia eu estudei muito, muito, muito, e as oportunidades foram vindo e quando eu vi aconteceu “Encantado’s”.

E o que você foi fazer na China?

Eu fui participar de um espetáculo de dança e música que mostrava a cultura do Brasil, morei lá por três meses. Foi uma experiência complexa, mas enriquecedora para mim como ser humano, como mulher.

Quais foram seus primeiro trabalhos como atriz?

Eu fiz os trabalhos de finalização dos cursos. Também participei de um projeto de um colega que estava se formando em cinema e fiz uma personagem. Mas trabalho, trabalho mesmo “Encantando’s” é o meu primeiro.

Como surgiu a oportunidade de gravar a série “Encantado’s”, do Globoplay?

Eu já havia feito vários testes na Globo, mas que acabaram não rolando. Até que um dia estou em casa e recebo um telefonema do produtor de elenco, o Hudson, ele me convidou para fazer um teste para a série, eu me lembro que foi tudo muito rápido, no dia seguinte eu já mandei um self tape, na sequência fiz um vídeo e logo depois recebi a informação de que havia sido aprovada.

Conte sobre Melissa, sua personagem?

Melissa não gosta de trabalhar, é uma menina do subúrbio, mimada pelo pai e pela mãe, é apaixonada pelo menino que trabalha no açougue, mas ele não dá bola para ela. É uma menina cheia de atitude, um pouco abusada, ela não gosta de Carnaval. Se pudesse, ela queria ficar rica do dia para a noite, mas trabalhar, não.

Como se preparou para o papel?

Tivemos preparação com a equipe da série na Globo, mas, à parte, eu fazia aulas com a minha preparadora particular. Pesquisava na internet, Instagram, TikTok, a molecada, tudo o que estava acontecendo. Coloquei um pouco de mim, das minhas amigas, da galera que eu vejo. Mas foi muito interessante viver esse lugar [de não gostar de samba], porque eu já fui do samba… Fui experimentando e vendo o que cabia ou não na personagem, foi bem interessante.

O fato de você ser do subúrbio e a série ser ambientada em um também ajudou na construção de sua personagem?

Definitivamente, sim. A série fala de pessoas com as quais eu convivo, de onde eu vim, quem eu sou, as pessoas que eu amo são daqui, então foi muito fácil, é um pouco de quem eu sou. A maneira de falar, já estou acostumada. Foi bem natural.

É sua estreia na TV, está muito feliz?

Muito, sempre falo para a minha mãe: “Caramba, mãe, estou em uma série na Globo”. Eu fico me vendo na TV e penso onde cheguei, estou muito feliz.

E como você tem recebido a resposta do público com o seu trabalho?

Graças a Deus estou recebendo de forma muito positiva. Ainda é um pouco micro, porque a gente só está no Globoplay, e nem todas as pessoas têm acesso, mas quando for para a TV aberta espero que as pessoas gostem. Está sendo muito positivo, espero que continue assim.

Foto: Carlo Locatelli

Como é trabalhar em um série predominantemente de atores negros?

Essencial. Superimportante, necessário, eu acho que já estava tarde para isso acontecer. Os pretos precisam ocupar cada vez mais espaços, a gente vive no Brasil… Quando estou atuando e olho para o lado e vejo tantos pretos atuando comigo, penso que é o nosso lugar, o Brasil é diverso, e essa diversidade tem de ser representada, eu me sinto representada na série. Quando eu era pequena não via na TV tantos pretos nos representando, é importante que isso esteja acontecendo agora. Que as pessoas vejam que a gente é lindo do jeito que a gente é. E nós temos que ocupar esses espaços porque a gente estuda e somos capazes de estar ali.

Além de atriz, você é cantora e dançarina, pretende se lançar na música também?

Vou te falar… Estou aberta às oportunidades, a música é outro amor meu muito grande, o que vier e for interessante para a projeção da minha carreira eu vou abraçar. Antes de eu ser atriz, eu era muito da música, acho que a atuação e a música andam muito lado a lado em tudo o que faço. E eu sou aspirante a dançarina, como sempre digo, porque não sou dançarina profissional, mas eu me jogo nas coisas.

Participaria de um reality?

Acho que sim, hein? Agora vendo “Big Brother Brasil” penso que loucura seria se eu estivesse lá.

Quais são os próximos projetos?

Algumas propostas, Graças a Deus, apareceram, mas algumas eu tive que recusar porque conflitava com a segunda temporada de “Encantado’s”. Fiz alguns testes, mas não posso falar muito sobre isso ainda.

Como você lida com as redes sociais?

Eu sou viciadas nas redes sociais, passo o dia na internet, e sou uma aspirante de blogueira (risos). Posto bastante, eu dançando, na academia, meu cachorro… Eu amo internet, o que é o brasileiro? Brasileiro na internet é tudo.

Acha importante ter um posicionamento político-social nas redes?

Com certeza, porque querendo ou não a gente influencia as pessoas, as coloca para pensar. Então, eu acho importante, sim, eu me posiciono, e acho que é nosso papel de certa forma, embora eu ainda seja micro, se eu puder pôr um pensamento na cabeça de alguém para questionar, acho importante.

Que dicas daria para jovens que estão começando na carreira?

Estudar, estuda e estudar, se aprimorar, fazer cursos. Não desistir do sonho porque essa vida do mundo artístico é muito difícil, as oportunidades não estão na nossa cara. É preciso ter um foco e não desistir. Eu sempre digo que as oportunidades vêm se você está capacitado e preparado. Poste vídeos, se mostre, porque em algum momento se tiver que acontecer, vai.

Como cuida da beleza?

Eu malho, apesar de não gostar muito de academia, tenho até um personal. Cuido muito do meu cabelo, que eu amo. Tem que beber muita água para a pele ficar linda. Uso protetor solar, uns cremes, me alimento bem, eu faço o básico.

Tem algum personagem que você gostaria de fazer?

Nossa, que pergunta… Não sei bem se um personagem, mas eu adoraria ter feito “Avenida Brasil” (novela da Globo).

Então você toparia fazer uma novela em TV aberta?

Sim, sim, é muito diferente. Em outros trabalhos você já sabe o começo, meio e fim, e na TV aberta as coisas mudam, acho isso interessante. Também acho que seria legal conviver com a resposta imediata do público… Quero muito.

Foto: Carlo Locatelli

Você acha que vem a terceira temporada de “Encantado’s”?

Eu rezo para que sim (risos). Há muitas histórias para serem exploradas naquele mercado, muita coisa.

Na série você convive com muitos atores experientes, como é isso?

É muito interessante. Como foi meu primeiro trabalho pensei se as pessoas seriam legais comigo, com seria tudo… Caraca, a Tia Nastácia é minha avó… Todos, todos me abraçaram, em nenhum momento me fizeram sentir como uma iniciante, todos me ajudaram e tive muito apoio. Quando a gente se viu parecia que nos conhecíamos há muito tempo. Rolou uma química incrível. Somos amigos agora.

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