Foto: João TK
“Ubu Rei”, de Alfred Jarry, nova produção de Os Geraldos, de Campinas (SP), entra em cartaz no Teatro Anchieta, no Sesc Consolação, no próximo dia 27. A nova parceria do grupo com o diretor Gabriel Villela segue em temporada até 12 de março, sexta e sábado, às 20h, e domingo, às 18h. Com tradução de Bárbara e Gregório Duvivier e adaptação do grupo e do diretor, a peça – um clássico do teatro ocidental, marco de ruptura e transgressão no século 19 – revela-se mais contemporânea do que nunca, ao fazer uma sátira do Brasil atual.
O espetáculo marca o segundo encontro do diretor Villela com o grupo Os Geraldos. A primeira parceria resultou no espetáculo “Cordel do Amor sem Fim – ou A Flor do Chico”, de Claudia Barral, que tem circulado por importantes circuitos teatrais brasileiros.
Foto: Stephanie Lauria
O teatro popular é o território que liga o grupo ao diretor, que, com uma estética vinculada às raízes culturais do Brasil profundo, trabalha na criação de pontes de sentido entre os clássicos e o contexto do espectador. “Ubu Rei” faz uma sátira do poder obtido por usurpação e exercido com tirania, ao apresentar Pai e Mãe Ubu, um casal entregue à barbárie que invade a Polônia e, assassinando o rei, assume o seu trono.
Considerado por dadaístas e surrealistas como precursor desses movimentos, assim como do teatro do absurdo e da performance, Jarry oferece o material dramático de que Villela e o grupo Os Geraldos precisam para responder, com beleza e humor ácido e inteligente, a este momento histórico de caretice, autoritarismo e vulgaridade, que exige ruptura, por meio do pensamento e da arte, como o fez historicamente essa peça.
Responsável pela produção do projeto, o grupo campineiro Os Geraldos, que completa 15 anos em 2023, contou com nomes relevantes do cenário nacional das artes cênicas, como o diretor Villela, o assistente de direção Ivan Andrade, os preparadores vocais Babaya Morais e Everton Gennari, dentre mais de 30 pessoas, que estão diretamente envolvidas na produção do espetáculo, com 14 atores no elenco.
Sobre o espetáculo, Villela ressalta a vinculação direta com a situação sócio-político-cultural brasileira. “Nós criamos um delírio tropical, em que fazemos uma sátira afiada do nosso País, respondendo, com violência poética, à selvageria e à estupidez destes tempos”, declara o diretor.
Foto: João TK
Atualidade no palco
Mesmo se tratando de um texto escrito no final do século 19, o texto de “Ubu Rei” fala muito sobre os dias atuais. Para transpor a nova versão para a obra de Jarry (considerado o pai do teatro do absurdo), Os Geraldos e Villela optaram por fazer uso da estética e da música para deixar ainda mais evidente o surrealismo da linguagem. A ideia é provocar no espectador uma sensação de vertigem, sair do prumo, balançar o extremismo posto em cena, fazer o espectador embarcar num delírio tropical, universal sobre os extremismos postos.
Entre as coisas que unem o grupo paulista e o diretor mineiro é o modo de usar a música para contar a história. São 18 canções (entre íntegras, versos, pedaços, melodias etc.), interpretadas ao vivo pelos atores – com acompanhamento do maestro Gennari, responsável pela direção musical (com Babaya), ao piano. E uma inusitada homenagem a Miriam Batucada, com os artistas tocando caixa de fósforo.
São músicas do cancioneiro popular brasileiro e latino-americano – como Geraldo Vandré, Raul Seixas, Inezita Barroso, entre outros compositores. As canções são elementos da dramaturgia, servindo tanto como prólogo (protofonia musical) até para juntar cenas e atos, ou mesmo para levar as cenas para outro lugar.
Foto: Stephanie Lauria
Se na primeira parceria entre os artistas (“Cordel do Amor sem Fim”) o lirismo estava em cena, com a estética romântica que remete às cores de uma tempestade – azul, vinho… -, em “Ubu Rei” é o deboche que está em cena. Para a versão desse clássico do absurdo, o cenário e os figurinos trazem muito brilho, cores quentes, quase uma estética de cabaret, numa referência ao programa do Chacrinha.
O figurino traz diversas referências, com elementos do Japão, da África, porém misturado com estilos que remetem ao brega, trajes de festa envelhecidos, datados, desatualizados, com cortes desiguais, que mostram a decadência daquela sociedade posta em cena.
Sesc Consolação – Rua Doutor Vila Nova, 245, São Paulo, SP (Metrô Higienópolis-Mackenzie )