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Gustavo Vaz: “Estou numa fase de produção profundamente autoral”

Foto: Caio Oviedo

Gustavo Vaz é daqueles caras que não param de produzir. Seja no teatro, no streaming, no cinema, onde for. Com uma sede insaciável de criar, ele está com vários projetos em andamento, o que inclui livro e podcast. Premiado ator e dramaturgo, além de autor, diretor e locutor, Vaz é uma “máquina” de conteúdo e faz tudo em prol da arte.  

Depois do do sucesso em “Coisa Mais Linda”, ele retorna à Netflix como o antagonista de “Só Se For Por Amor”, série que estreou no último dia 21. O ator também estará em “A Vida Pela Frente”, série do Globoplay e GNT, prevista para 2023, e irá lançar projetos no teatro e na literatura.

Além das duas novas séries (Netflix e Globoplay), o ator também pode ser visto em “Aruanas” (Globoplay) e em “Os Homens São De Marte e É Pra Lá Que Eu Vou”, no GNT, onde faz par romântico de Mônica Martelli na última temporada. Em 2020, criou, escreveu, atuou e produziu “Se Eu Estivesse Aí”, em parceria com o Gshow, websérie selecionada para festivais no Brasil e no exterior.

Leia a seguir o papo que RG teve com o artista.

Foto: Caio Oviedo

O que você estudou?

Além de alguns cursos pelo caminho – e que até hoje busco frequentar como forma de reciclagem – estudei interpretação na Escola Técnica de Teatro Martins Penna. Foi ali que aprendi a importância da arte, do artista e onde me apaixonei pelo palco.

Quais foram as principais inspirações para sua carreira como artista?

Tudo. Tudo inspira, atravessa, alimenta, provoca, ensina, destrói e molda o que somos. O artista precisa usar tudo o que tem para ser o que precisa ser.

Você também é diretor e autor, como nascem essas habilidades no seu dia a dia?

Surgem de uma angustiante e excitante vontade de se expressar, por todos os poros. Tenho focado meu trabalho mais na escrita nos últimos anos, apesar de ainda me aventurar na direção de projetos pontuais. Meu último trabalho como diretor chama-se “Vozes da Independência” e se trata de uma obra sonora 3D permanente e gratuita, presente no Parque da Independência, em São Paulo. Trazemos vozes apagadas pelo tempo e que também foram pilares na construção da história brasileira.

O que vem na frente, o ator, o diretor ou o autor?

Depende do projeto, do momento de vida. Todas as três se alimentam umas das outras pra fazer de mim o artista que sou e me levar a ser o artista que quero ser. Sempre aprendo muito sobre a vida em cada uma delas, de maneira diferente, o que também amplia meu olhar sobre o ofício, no geral.

Depois do sucesso de “Coisa Mais Linda”, chega agora “Só Se For Por Amor”, nova série da Netflix, já em cartaz. Conte sobre a série e sobre seu personagem, o César.

O César é um ambicioso empresário e produtor musical que passa por uma profunda crise no casamento ao mesmo tempo em que tem de se reinventar rapidamente diante de uma tragédia.  Ele é o antagonista que atravessa o caminho do Tadeu e da Deusa e que, por isso, acaba participando de conflitos importantes na trama. ‘Só Se For Por Amor’ é uma grande produção brasileira, que imprime na tela a pluralidade de sotaques e a beleza da nossa música, além de trazer um elenco de caras novas apaixonante.

Foto: Caio Oviedo

Como se preparou para o papel?

Ouvi músicas bregas e sertanejas, clássicas e atuais, para entender a série pelo lugar do sensível. Via alguns documentários relacionados ao sertanejo e ao universo de grandes shows, além de ler alguns livros sobre. O universo de produção musical.

Como se ambientou com a realidade sertaneja da série, era distante para você?

Sim, era. Só havia me relacionado com esse universo através de músicas que cantava em rodas de violão e karaokês. Mas a preparação feita e essa busca sensível pelo personagem me ajudaram muito a chegar no César que construí.

César é machista. Como é para você representar um machista convicto?

César não se vê como um machista, porque sua ambição e busca pelo sucesso não o deixam enxergar. Até que diante da crise no casamento, ele finalmente percebe melhor seus contornos e ações, e abre espaço para alguma transformação real que, quem sabe, pode ser mais explorada numa próxima temporada.

Você também está no elenco de “A Vida Pela Frente”, série Globoplay/GNT, onde interpreta o pai da protagonista Nina Tomsic e ex-marido da personagem de Leandra Leal, que também dirige a série, que terá dez episódios e que tem como ponto de partida um suicídio em uma escola. Conte sobre esse trabalho. Pode nos adiantar algo sobre o personagem?

Ainda não posso falar muito sobre o trabalho, mas meu personagem entra na série e modifica estruturas importantes, e, com isso, acaba também fazendo parte da trama central.

Como surgiu a oportunidade para essa série?

Entrei no projeto a partir de um convite da querida Leandra, com quem já havia trabalhado em “Aruanas”. Durante a série, também reencontrei o Bruno, que já havia me dirigido no mesmo projeto.

Como se preparou para o papel?

Ivo tem uma profissão que trabalha com instantes únicos, o que faz com que ele transfira ou expresse parte de sua personalidade para o que faz. Nesse sentido, busquei olhar para o mundo através dos seus olhos, de suas lentes, nessa busca pelo prazer, liberdade e por momentos irreproduzíveis.

Quais são os próximos projetos? O que vem pela frente?

Estou numa fase de produção profundamente autoral. Em breve lanço meu primeiro romance “Como Não Morrer de Uma Só Vez”, um podcast chamado Artigo de Escuta e um novo espetáculo, chamado “O Idealista”.

Acha que uma eventual mudança de governo vai melhorar a situação para os artistas?

Sem dúvida. Todo líder totalitário historicamente persegue e cala artistas contrários ao governo que representa. Atualmente, além da disseminação de calúnias constantes contra os profissionais da cultura, também estão sendo feitos cortes sistemáticos em programas e editais afetando contrarregras, camareiras, cenotécnicos, técnicos de som, além de artistas de vários segmentos e funções. É um projeto de desmonte consciente, que, além da cultura, atinge áreas como a ciência e o meio ambiente. E por que? Para impossibilitar que a informação chegue até as pessoas de forma clara, para que os cidadãos não pensem e não questionam os que governam e para explorar a terra e enriquecer os de sempre, cada vez mais.

Como vê a arte nos dias de hoje?

Tão essencial quanto o ar que respiramos. Se a arte desaparecer, em pouco tempo, tudo morre.

Como avalia a necessidade do ócio no processo de criação?

Fundamental. Não só no processo de criação como na vida. Existem inúmeras experiências de sucesso em outros países onde menos trabalho significa mais produtividade de qualidade e trabalhadores mais felizes. O tempo é um de nossos bens mais preciosos, porque com ele podemos pensar, sorrir, doer, questionar, viver. E para o neoliberalismo capitalista, para os lideres totalitários da ultra direita, um ser humano alimentado sensivelmente e consciente de si é perigosíssimo. Por isso, são usadas todas as estratégias possíveis de destruição das economias para precarizar o trabalho e obrigar os cidadãos a não terem o tempo ao ócio necessário para reagirem.

Que tipo de personagem/papel sonha em fazer?

O próximo. E depois o outro. Todos. Todos os possíveis.

Você também atua com a voz, como surgiu esse interesse?

Da necessidade de me expressar, de colocar para fora o que penso, o que não consigo conter em mim.

Que cuidados toma com a voz?

Aqueço pela manhã, antes da minha meditação diária, e procuro beber muita água.

Em que pé está seu primeiro monólogo – “O Idealista”?

Ele esta sendo construído com o público via Instagram no perfil @oidealistateatro. Lá, divido algumas provocações, imagens e enquetes que vem me ajudando a entender o humano através do virtual além de contribuir na criação da dramaturgia base do espetáculo. Em breve, o personagem central vai começar a conversar diretamente com o público por lá. Estou ansioso por isso.

Do que se trata?

Eu me descobri um idealista nos últimos anos. Isso é incrível e terrível ao mesmo tempo porque essa força utópica, ao mesmo tempo que me move pra frente com coragem, também me frustra no contato seco com a realidade. Parti disso pra criar uma trama que envolve tecnologia, política e morte, três temas que, cada vez mais, vejo misturados nos meus trabalhos autorais.

Foto: Caio Oviedo

Como é seu processo de criação?

Disciplinado e organizado para poder me deparar com o caos, com o vazio e com o abismo que sempre é criar qualquer obra.

Você mesmo vai interpretar ou pretende dirigir alguém?

Eu mesmo atuarei, minha primeira experiência sozinho no palco.

Você está escrevendo seu primeiro romance, certo? Do que se trata “Como Não Morrer de Uma Só Vez”?

Parto de um suicídio de um personagem, da morte, para falar da vida. É uma história que se apoia no cotidiano, nas banalidades que escondem experiências gigantescas, que trata nossa jornada sobre a vida como algo compartilhado, nessa constante, linda e confusa busca por sentido e propósito. Espero lançá-lo no ano que vem.

Como surgiu a ideia de escrever um livro?

Durante a pandemia, especialmente no início e assim como muitos, passei por momentos de muita solidão, angústia e confusão. Precisava elaborar tudo de alguma forma, e, nesse sentido, a arte sempre é o lugar onde vou para curar o que for preciso. A ideia do romance já existia havia alguns anos, mas só durante o isolamento tive o tempo e espaço necessários para colocá-lo no mundo. Como ‘Não Morrer de Uma Só Vez’ é um chamado ao assombro diante dessa experiência incrível que é estarmos todos aqui.

Tem ainda o seu podcast, “Artigo de Escuta”. Qual será o diferencial?

Tenho encarado o podcast, que espero lançar ainda este ano, como uma nova experiência artística em áudio. Como se trata de um artigo em áudio, os textos tem caráter opinativo e não jornalístico, além de possibilitarem espaços de licença poética sobre os assuntos que abordarei. Meus grandes temas – tecnologia, política e morte – devem nortear o trabalho.

O que podemos esperar do podcast, tipo, por que ouvir?

Porque sair da tela e embarcar em experiência de áudio é também dar espaço para a imaginação. E porque proponho um formato de escuta que irá possibilitar ao ouvinte o áudio mono – comumente usado em podcasts – mas também o áudio 3D, alvo da minha pesquisa há cerca de dez anos na ExCompanhia de Teatro e que apresenta ao público uma experiência imersiva única e inesquecível.

O projeto do podcast é só seu?

Sim.

Como concilia tantas atividades paralelas?

Disciplina e organização, respeitando meus momentos de dúvida ou falta de criatividade. E, acima de tudo, uma profunda necessidade de me comunicar com as pessoas, no formato que for possível.

Foto: Caio Oviedo

Você é ligado em redes sociais? Como lida com elas?

Uso com parcimônia. Sei como a presença constante pode ser tóxica. Precisamos tratar as redes sociais online como ferramentas. Precisamos ter consciência de que podem ser muito importantes por um lado, mas, por outro, também precisamos ter o cuidado de lembrar que são espaço feitos também para que empresários bilionários lucrem cada vez mais com nossa intimidade, hábitos e informações. Há de se ter logo, espero, uma discussão mais qualificada e aprofundada sobre a regulação dessas redes no cotidiano dos usuários no Brasil, assim como já acontece na Europa, por exemplo.

Tem algum recado que gostaria de deixar para jovens iniciantes nas funções que executa?

Sonhem, sempre.

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