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O ‘chiclete chic’ de Clara X Sofia não vai sair da sua cabeça

Dupla pop Clara x Sofia lança seu álbum de estreia, “Nada disso é pra você” – Foto: Victor Faria e Bruno Maluf

“Nada disso é pra você”. Um título sugestivo que entrega a montanha-russa de sentimentos retratada no primeiro álbum da dupla mineira Clara x Sofia, das cantoras Clara Câmpara e Sofia Lopes. O disco condensa as diversas fases para a superação de um término de relacionamento por meio de versos descritivos e extremamente relacionáveis, sonoridade pop e linguagem visual simples e cheia de emoção.

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A partir de um trabalho minucioso que consiste não só em fazer, mas pensar a arte que é feita, o duo de cantoras de Belo Horizonte cunhou um termo que resume o tipo de música que fazem como nenhum outro: “chiclete chic”. O significado nada mais é do que um pot-pourri de referências que vão do pop punk dos anos 1990, como Blink-182 e The Offspring, ao estilo mais comercial de símbolos do pop nacional contemporâneo, como Jão. Tudo isso embalado com toques excêntricos do indie europeu, e temos um passeio por diferentes estilos que acompanha a jornada honesta pelos mais variados sentimentos do fim de uma relação afetiva marcada pela intensidade.

Clara Câmpara e Sofia Lopes – Foto: Victor Faria e Bruno Maluf

O resultado está em melodias ora suaves ora agressivas, que acompanham versos que fogem dos clichês do “pop farofa”. O passe livre para abraçar tanto o lado cor-de-rosa – rosa chiclete! – dos sentimentos quanto o lado que tentamos colocar debaixo do tapete – a birra, a revolta, a angústia, o desespero. “É um álbum muito humano, empático, relacionável. É sobre aceitar e acolher até os sentimentos que não são tão lindos, que são julgados, mas que todo mundo sente”, contam. É tão poderoso quanto libertador.

Leia a entrevista completa ao RG:

RG – Como vocês definiriam Clara x Sofia para quem caiu de paraquedas?

SOFIA – Somos uma dupla mineira de Belo Horizonte, somos um duo pop. A gente vem lapidando esse pop e criamos um conceito que chama “chiclete chic”. Esse conceito engloba exatamente o que nós somos: uma dupla pop, que canta pop, que se veste como pop, consome todo o universo pop, com um toque refinado, um toque de estranheza chique. “Chiclete chic” é um termo ótimo pra definir o que nós somos tanto na sonoridade quanto na estética.

CLARA – E uma dupla de amigas!

RG – Como vocês se conheceram?

CLARA – Na verdade, a gente é dupla antes de sermos amigas. A gente estava num happy hour de amigos e estava rolando open mic. Um amigo estava tocando violão e falou que eu cantava. Aí alguém falou que a Sofia também canta e colocaram a gente para cantar uma música juntas. A gente nem se conhecia. Aí um amigo que faz evento aqui em BH perguntou se a gente topava tocar na festa dele na semana seguinte. A partir desse primeiro, fomos conseguindo fechar novos shows.

RG – Como vocês chegaram nessa sonoridade do chiclete chic?

CLARA – A gente sempre foi pop, até antes de trabalhar no autoral nossa veia sempre foi do pop. Quando a gente decidiu fazer nosso álbum, fizemos um processo denso de investigação de identidade, de aprofundamento em quem nos somos, o que a gente que. E foi aí que a gente chegou no termo chiclete chic. Sempre foi ele, mas a gente não sabia colocar em palavras. Durante a pandemia a gente imergiu demais nisso de pesquisar referências, pesquisar sobre nos mesmas. É maravilhoso ser uma dupla, mas existe essa dificuldade. Existe a Clara, existe a Sofia e existe a Clara e Sofia. A gente precisa parar pra escutar ela. Fizemos 800 pastas de referências no Pinterest, 800 listas. Foi um trabalho muito profundo para que na hora que as pessoas escutem e assistam nosso material visual elas entendam o que estamos querendo passar.

RG – Vocês trazem no álbum um passeio por vários estilos e ritmos. De onde surgiu essa escolha?

CLARA – É esse mix de sentimentos mesmo. A gente fala que o álbum passa por todas as fases do luto de um relacionamento, e tem uma maneira muito intensa de lidar com esses sentimentos. O álbum é baseado em histórias reais, e as músicas foram escritas, acima de que tudo, como uma forma de desabafo. Um alicerce para a digestão de sentimentos. Eu sou muito intensa, sinto que é sentindo tudo que passa. São fases intensas: raiva, depressão, negação, superação. São sentimentos quase antagônicos, mas que fazem super parte do fim desse processo. Cada musica pediu o que ela precisava. Se você ouvir o álbum sem a letra, você entende o que está acontecendo. A gente queria ser muito fiel a esse sentimento de sentir sem filtro, se entregar ao sentimento em todas as frentes possíveis, música, letra, produção, visual, tudo se complementa para existir a experiência completa do que é você se entregar para um sentimento e ele te trazer uma cura.

RG – E essa vulnerabilidade de você assumir alguns sentimentos muito bonitos e outros nem tanto. Tem esse “quê” de birra, né? Mesmo o título: “Nada disso é pra você”. A gente sabe que no fundo também é, mas não quer dar o braço a torcer.

CLARA – Tem um quê de birra. Até a superação tem a birra. Vamos assumir!

SOFIA – É um álbum muito humano, empático, relacionável. É sobre aceitar e acolher até os sentimentos que não são tão lindos, que são julgados, mas que todo mundo sente.

RG –  E dá para sentir essa honestidade nas letras. São coisas muito específicas, mas que todo mundo passa, desde o domingo na casa da família até passar na rua da pessoa. Como é esse processo de escrever? Vocês sentam juntas? Porque parece um fluxo de consciência de precisar colocar aquilo para fora naquele momento.

CLARA – Normalmente eu começo com a composição porque durante a pandemia eu passei pelas diferentes maneiras de compor e entendi esse fluxo do que a gente precisa falar. Aí ia comentando com a Sofia e nosso produtor Lipe: esse sentimento está vindo aqui, canetava e mostrava pra eles um esboço inicial.

SOFIA – Foi um álbum quase descritivo. A gente pensa muito em uma maneira de não passar por uma composição trivial. Você pode ter uma composição relacionável sem cair num clichê. Tem um cuidado muito grande de escolher a palavra pra passar o sentimento de que vivemos aquilo de verdade, para não ficar tão genérico.

CLARA – Nossa aposta nesse álbum é que ele é muito relacionável. Então a gente teve o cuidado de deixar ele palpável. Amamos colocar elementos de descrição, dissecar alguns momentos que são simbólicos nesses sentimentos. O almoço de domingo, passar na rua da pessoa, conselho da mãe. Todo mundo tem isso!

RG – Sobre as referências, tem uma vibe bem anos 2000 principalmente nessas mais pop punk. Me senti com 13 anos de novo mandando indireta pro crush na bio do MSN. Quem são as suas referências?

CLARA – Meu deus, as pessoas faziam isso, né? Botava a musiquinha no nickname (risos). Nossas referências vão de A a Z nesse trabalho. De Cindy Lauper, anos 1980 na veia, até Avril Lavigne, Blink-182, Offspring. Nosso grande ídolo Jão é uma referencia absurda. A gente sente que o pop dele é o suco primoroso do pop, tem muito dele em “Fevereiro”. É um pot-pourri de referencias exatamente porque a gente sentiu que cada música pedia uma expressão diferente.

SOFIA – E influência do pop europeu, que traz esse tom do esquisito do chiclete chic. A sonoridade, a maneira como descrevem, o vocabulário, os clipes.

RG – E as artes visuais, com a capa em referência à Frida Kahlo?

SOFIA – Criatividade, inspiração, vem quando a gente menos espera. Você começa a falar daquele tema e dá um estalo: nossa mas tem aquela pintura, aquela foto, que também diz isso. A gente já tinha a ideia de que a capa seria os nossos rostos numa pintura, numa fotografia. Só que a Clara trouxe essa referência de “Duas Fridas”. Um quadro lindíssimo, as duas uma do lado da outra, uma com o coração partido e a outra com o ele inteiro. Representa essa dualidade de sentimentos que a gente fala no álbum. Uma pessoa que acabou de sofrer por amor e que foi traída no amor mas que ainda acredita no amor, que ainda tem esperança, esse lado de que vale a pena a gente acreditar.

CLARA – Foi um insight do nada. A gente tinha outra capa pronta, a gente na frente do quadro que representa o “Nada disso é pra você”, que é construído no visualizer da música que dá título ao álbum, esses sentimentos que estavam sendo colocados para você. Eu pensei: “Mas o que é isso? Como deixar isso na imagem?”. Veio na hora essa obra da Frida, essa entrega aos sentimentos. A gente é muito fã da história dela, da figura que ela é pra nos mulheres.

RG – Foi um visualizer para cada música, né? Como foi gravar?

SOFIA – Foi, menina. Representa de uma maneira sucinta o que gente está querendo fazer. Só que acabou não sendo tão sucinto assim. Eles passeiam bem pela nossa estética como um todo a parte visual é extremamente importante e que conta a historia da musica e do chiclete chic. Fizemos 3 num dia, 3 no outro. “Sem Maldade” já era um visualizer. “Fala” e “Fico Mais Leve” eram clipes. Aí gravamos um em cada dia.

RG – O visualizer de “Quem Me Dera” é muito emocionante.

SOFIA – Foi o ultimo que a gente gravou na nossa segunda diária então foi um dia que a gente estava cansada e é um visualizer de muito sentimento. A música dá a sensação de que a gente está correndo e correndo e não chega a lugar nenhum com aquela relação. O que representa isso melhor do que uma esteira? É um sentimento fácil de traduzir correndo na esteira, a intensidade vem.

RG – Conforme a gente vai chegando no final do álbum, esse sentimento de frustração que essa música passa vai dando lugar para uma libertação.

CLARA – Exatamente, quão libertador é você entender um sentimento. Saber que você está sentindo saudade, mas não vai voltar atrás. Isso é angustiante, mas de uma maneira que te liberta. Esse é o objetivo, levamos a construção do álbum para no final ter um sentimento de liberdade.

RG – Essa questão de você se colocar em primeiro lugar enquanto mulher. Como é isso na parte profissional, de ser uma mulher jovem entrando no cenário da musica pop brasileira?

SOFIA – É um caminho que definitivamente fica muito mais suave sendo uma dupla, podendo se apoiar. Tendo uma a outra, as decisões são muito mais certeiras. E focar em fazer o nosso trabalho, que a gente acredita muito, botamos muita vida no que a gente faz. Isso ajuda a dar a proporção que as outras coisas tem que ter, a focar no principal.

CLARA – É muito simbólico ter o espaço do álbum, principalmente a gente falando sobre entrega aos sentimentos. Isso é tão feminino, tão empoderador poder explorar nossa sensibilidade. Esse álbum completou a gente em varias camadas, inclusive enquanto mulheres no meio da música.

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