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Defensora das mulheres, Kenia Maria é dos principais nomes contra o racismo

Foto: Rodolfo Sanches

A carioca Kenia Maria é uma mulher ímpar. Atriz, escritora e artista plástica, ela também é uma ferrenha ativista contra o racismo. Kenia  é defensora das mulheres negras pela ONU Mulheres Brasil. É tida como um dos cem maiores influenciadores segundo o Mipad (Most Influential People African Descent), premiação da Nações Unidas que homenageia anualmente os afrodescendentes mais influentes do mundo. Ah, ela também é diretora artística da Fundação Beatriz Nascimento, no Harlem, em Nova York.

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Em 2019, foi vencedora do Leão de Ouro, em Cannes, como consultora no especial de Natal, “Juntos a Magia Acontece”, com Milton Gonçalves, grande ator de TV, cinema e teatro que morreu no último dia 30 de maio.

A convite de Bethania Nascimento – afro-brasileira a se tornar a primeira bailarina em uma companhia de balé internacional, e filha da ativista Maria Beatriz Nascimento -, Kenia foi a Nova York, mais precisamente no bairro do Harlem, para assumir ao lado da bailarina Ingrid Silva, a diretoria artística da Fundação Beatriz Nascimento. Maria Beatriz, sergipana, negra, mãe, roteirista, historiadora, poeta, ativista, entre tantas contribuições, trouxe o conceito do quilombo não só como organização histórica, mas como movimento ideológico dentro da luta dos negros. 

“Poder participar disso torna este um dos momentos mais bonitos da minha vida, me sinto honrada e abençoada. Conheci Bethania em 2019, no Harlem, quando cheguei lá com meus dois filhos na intenção de morar naquele país e desde então nos tornamos amigas. Em maio de 2022, ela me convidou para compor a diretoria artística da fundação.” 

Kenia também é artista plástica e aproveita a ida aos EUA para  se reunir com galeristas e desenvolver projetos, uma vez que durante o isolamento da pandemia deu asas a uma vontade antiga de se expressar por meio da pintura.

Formada pela escola Waldorf, onde estudou artes plásticas, criou uma coleção de quadros com elementos da cultura e deuses do Yoruba, com referências nos movimentos pop arte e afrofuturista.

“Hoje me sinto em casa quando estou no Harlem. Acho importante conhecer a experiência da luta negra nos Estados Unidos, trocar e entender que no Brasil o racismo opera em uma estrutura que propicia a sua manutenção com extrema sofisticação. Temos diferentes desafios, mas somos o mesmo povo.”

Foto: Rodolfo Sanches

Leia a seguir entrevista com Kenia Maria feita por RG.

Você estudou na Waldorf, como isso ajudou na sua formação?

A formação artística, teatro, dança, artes plásticas, música. Ter arte durante a minha adolescência foi fundamental para a minha vida, pensamento crítico. Eu percebo a influência do ensino Waldorf até hoje na minha vida .

Lá atrás, como nasce a atriz Kenia Maria? 

Aos 9 anos na escola quando comecei a fazer teatro. Eu simplesmente amava brincar de ser outra pessoa.

E como surgem a escritora e a artista plástica? 

A escritora surgiu quando ganhei um concurso de redação na Eco 92 na escola. Com a chegada da Lei 10/639 surgiu a vontade de colaborar de alguma forma com essa proposta de levar a história da África para escolas e assim nasce “Contos de Um Brasil que Eu não Sei”.  A minha coleção infantil que já tem dois livros lançados.

Vem exposição por aí? 

A primeira foi dia 20 de julho, no Brooklyn, no aniversário de 80 anos da ativista Beatriz Nascimento. Teremos a minha segunda exposição dia 10 de agosto no Brooklyn,  no evento organizado pelo Fiot (Laboratório Fantasma). A próxima deve ser na Nigéria, em outubro.

Você é uma atriz muito premiada, como é ter essa marca na sua carreira? 

Sou uma ativista premiada. Comecei a me dedicar à luta pelos direitos humanos aos 18 anos.

Como é ser tida como uma dos cem maiores influenciadores segundo o Mipad (Most Influential People African Descent)?  

Esse prêmio tem uma relação direta com a resistência de um povo que luta por um sistema de opressão, o racismo. Não tem muito a ver comigo, esse é o meu dever. O reconhecimento é importante para dar visibilidade à luta negra no Brasil.

Foto: Rodolfo Sanches

E seus projetos no Brasil pela ONU, conte sobre eles.

Estou como madrinha da nova agenda para mulheres refugiadas e emigrantes junto ao Moverse e a ONU Mulheres Brasil. Essa agenda tem um compromisso com o caso das mulheres refugiadas no Brasil. Como é o caso das venezuelanas que são mais de 150 mil vivendo com suas crianças em Roraima, na fronteira do Brasil.

Como foi sua experiência no Harlem, quando esteve por lá?

É a quarta vez que venho ao Harlem. É mágico!  A conexão com a ancestralidade negra, a história viva nas ruas, estátuas de homem e mulheres negros espalhadas pelas avenidas … Isso tudo me cura de alguma forma, a ausência do confronto diário com pessoas racistas alivia a ansiedade que o racismo causa.

Você, ao lado da bailarina Ingrid Silva, assumiu a diretoria artística da Fundação Beatriz Nascimento. Como isso se dá?

Conheci Bethânia, fundadora da fundação e filha de Beatriz Nascimento em 2019 e, desde então, nos tornamos grandes amigas. Bethânia tem se dedicado ao legado da sua mãe com muito cuidado. Um dos objetivos da fundação é promover encontros entre intelectuais e artistas negros da disporá aqui em Nova York. O olhar da Ingrid Silva, a competência de Eduardo brechó ( diretor artístico) e  o amor incondicional de Bethania pelo legado de Beatriz fará da fundação um lugar de potência para a comunidade negra.

O que Kenia Maria pretende fazer hoje pelos afrodescendentes?

Estamos na década do afrodescendente (2015 a 2025), criada pela ONU, onde 194 países se comprometeram a eliminar o racismo. O racismo só será eliminado quando o que o criou deixar de reproduzi-lo. Eu pretendo continuar me aliando a instituições e movimentos que estejam comprometidos com esta agenda.

Foto: Rodolfo Sanches

Você é feminista?

Não.

Quais são seus próximos projetos na carreira?

Me dedicar às artes cênicas e às artes plásticas.

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