O Museu de Arte Sacra de São Paulo (MAS-SP) apresenta a exposição “O Sexto Dia”, do artista Efrain Almeida, sob curadoria de Paulo Azeco, que discorre sobre a trajetória do autor/artista, em primeira pessoa, narrando sua história e pautando suas escolhas no decorrer dos anos. “A exposição se chama ‘O Sexto Dia’ porque foi quando foram criado os homens e os animais, segundo velho testamento. A mostra, a gente retrata a figura do artista, superconhecido, já teve obras exposta do mundo inteiro, como no MoMa, na Pinacoteca, participou da Bienal. Como ele usa a própria imagem nas obras dele, então é uma exposição biográfica, e a gente acaba contando a história dele e tem uma parte LGBTQIA+, porque ele é gay e nunca foi levantada essa questão dentro de suas obras”, explica Azeco.
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O momento em que Efrain Almeida teve revelado o seu real papel como artista, quando uma súbita sensação de entendimento da sua essência criativa, quase um sonho irrealizável de conscientização sobre sua procura, ocorre em uma visita à sala de ex-votos em uma congregação local. “Enquanto imagens, relíquias, artefatos votivos são instrumentos de adoração e por vezes causadores de êxtase entre fiéis, no caso de Efrain, a epifania foi estética. Aquilo era o máximo de força criativa que já havia visto e é esse o ponto fundamental de sua produção artística”, explica o curador.
“O Sexto Dia”, dia da criação dos animais e do homem, segundo as escrituras, marca o momento de sua epifania por sua profunda compreensão da essência das coisas e de sua inserção no todo. Dos desenhos feitos na areia em um pequeno município do interior do Ceará, o artista arquiteta seu sexto dia participante, com objeto de arte, como parte da trajetória que conta a história como personagem de sua própria obra.
Seus delicados beija-flores, em pleno voo, beijam as paredes para dar as boas-vindas já que, em algumas culturas antigas, são seres de luz e portadores de boa sorte. “Eles abrem a exposição, para contar a história desse artista, que esteticamente está muito ligado ao cristianismo, mas que usa o seu corpo, e sua vida como testemunho do seu tempo, partindo de códigos próprios norteados pelo pensamento contemporâneo”, explica Azeco.
O equilíbrio harmônico é desafiado pela série de aquarelas, lembranças do momento pandêmico onde o artista foi infectado e, afetado pela febre elevada, insere o beija-flor em uma delas talvez, inconscientemente, buscando a cura. As aquarelas são seguidas por delicadas pinturas a óleo, reposicionando a figura humana como tema central, elaborada com a precisão geométrica dos concretistas e sofisticadas técnicas e seleção de paletas de cor.
“Cabeça-Vermelha”, que compõe a sala expositiva, é uma instalação inédita criada por Efrain para esse momento específico. Está diretamente vinculada às lembranças de sua viga pregressa com pessoas agora ausentes, carinhos do coração. O curador explica: “Seu pai, marceneiro, sempre cortou os cubos de madeira para Efrain esculpir… Tempos depois de sua morte, Efrain encontra essas últimas peças de madeira esquecidas e as esculpe, uma a uma, em um momento de intimidade sublime entre seu trabalho e a lembrança de seu pai. Obras impregnadas de emoção que, de alguma forma, buscam no espectador cumplicidade frente a delicadeza e força do trabalho”.
Finalizando a exposição, temos uma imagem de Santa Luzia, santa de devoção de Efrain e protetora dos olhos os quais, nas representações escultóricas ela os carrega em sua mão, e que se tornaram elementos constantes nas criações do artista. Em um desse trabalhos – a instalação “Boys” – uma série de bonés de veludo onde o artista utiliza a cor marrom que remete a San Francisco, EUA, e que, de certa forma, fala sobre sua história e ressoa o minimalismo queer, fica posicionado à frente do par de olhos. “Seriam todos esses olhos vigiando ou culpando o artista?”, comenta o curador, deixando a resposta em aberto.
“Efrain é daqueles poucos artistas que sempre se manteve fiel à sua arte e sua verdade, se afastando de modismos e mostrando que seu trabalho, por vezes tido como regionalista, é na verdade universal, graças a sofisticação de pensamento, execução. Enfatiza, também, que por tratar um tema tão delicado como a igreja e a fé com força, coragem e respeito, é capaz de criar uma poética tão precisa e coesa… e sim, uma exposição no principal Museu de Arte Sacra do país, podendo falar sobre suas verdades e memórias, quebra mais um paradigma. E como na criação do homem, no sexto dia, o artista aqui, também está nu”, finaliza Azeco.
MAS-SP – Avenida Tiradentes, 676, Luz, São Paulo (ao lado da estação Tiradentes do Metrô).