Cultura

Bruno Fagundes: “As comparações com meu pai não incomodam, porque não existem”

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Foto: Italo Gaspar / Assistente de fotografia: Iago Kulesis / Styling: Thiago Biagi

Doce, articulado, inteligente, Bruno Fagundes é o tipo de pessoa que todos deveriam ter por perto. Gente boa, difícil não se encantar com o ator nos primeiros minutos de prosa. Essa, talvez, seja algumas das características herdadas de seu pai, o ator Antônio Fagundes. Filho de um dos atores mais consagrados da dramaturgia, Bruno garante não ter regalias por ser filho de quem é. “Nunca, em momento algum, relaxei pelo fato de ser filho do meu pai. Nunca usufrui disso para abrir portas ou conseguir qualquer coisa. Não acredito em resultado fácil”, diz. Prova disto, é seu retorno para as novelas. O artista estreia em breve em “Cara e Coragem”, nova trama das 19h da TV Globo. E, contrariando o que muitos  pensam, não teve colher de chá. Sua aprovação aconteceu por meio de teste. 

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Na trama, ele será o vilão Renan, coreógrafo de dança aérea. “É um personagem muito desafiador. Sou o oposto radical do que ele é. Renan usa a todos ao seu redor para manipular. Estou adorando esta vilania, porque me permite ter a liberdade criativa para justificar o injustificável.”

Visivelmente mais sarado, Bruno conta que precisou intensificar seus treinos e entrou em uma dieta balanceada. “Dança aérea é um esforço quase sobre-humano (risos). Precisava adquirir força e equilíbrio para as cenas e a rotina de exercícios intensos, obviamente, me trouxe um resultado. A estética veio em segundo lugar, mas é bacana se sentir satisfeito com seu corpo.” 

Além dos desafios do personagem, o artista enfrenta também a adaptação de morar em uma nova cidade, o Rio de Janeiro. Nascido em São Paulo, ele admite algumas dificuldades na nova rotina longe da família e amigos. “Estou me redescobrindo em uma cidade que conheço pouco. Tem momentos de solidão, introspecção”, conta. 

Solteiro por opção, o ator revela que relacionamentos não estão em seus planos. Focado em seus projetos, Bruno, que pode ser visto na série “3%”, da Netflix, e prestes a estrear outra, “Só Se For Por Amor”, na mesma plataforma, ele diz estar bem com seu “estado civil”. “Minha libido está 100% no meu trabalho”, brinca.    

Foto: Italo Gaspar / Assistente de fotografia: Iago Kulesis / Styling: Thiago Biagi

Após oito anos, desde “Meu Pedacinho de Chão”, está de volta às novelas. O que o público pode esperar do Bruno em “Cara e Coragem”? 

Sim, estou de volta para rede Globo em uma novela. E o que o público pode esperar é um Bruno bastante animado, muito grato por esta oportunidade e com um personagem incrível. Nosso trabalho é acumulativo. Então cada personagem que a gente faz, vai acrescentando um tijolo nessa construção do aprendizado do que é o ofício do ator. E cada vez mais me sinto preparado para diferentes personagens. E esse é um que tem me desafiado muito e me sinto presenteado por ter um personagem que exige bastante de mim. 

Renan é um coreógrafo de dança aérea. Já conhecia este universo? Fale um pouco de sua preparação…

O universo especificamente da coreografia da dança não é muito familiar para mim. O que tenho familiaridade é com o circo, que virou um esporte para mim. É uma coisa que amo fazer e está na minha vida há mais de seis anos. Virou um hobby e um dos meus passatempos favoritos. Faço o trapézio volante, que é o voador, e faço também a modalidade do trapézio fixo, que você sobe e faz vários truques. E tenho noção de acrobacia também. Faço um pouco de tecido, cama elástica… Mas a dança aérea, especificamente, é uma coisa nova. Obviamente, essa minha consciência corporal que o circo me trouxe, encurtou muito o caminho e tem me ajudado muito. 

A preparação foi bastante intensa, porque é uma modalidade que exige muito. Tem que estar o tempo todo em hipertrofia do abdômen lombar, porque tem que sustentar o corpo a 90 graus do chão com os pés na parede dando a ilusão de que a parede é um chão. Então isso, além de ter um certo desconforto da posição, existe toda uma nova consciência corporal. O eixo do corpo está de certa forma invertido, de lado, e isso não é uma coisa que se adquire só mentalmente. O corpo tem que se acostumar com isso. E, para isso, exige um tempo. Tem sido desafiador.  

Este hiato na TV aberta foi uma escolha ou aconteceu?

De forma alguma foi uma escolha. As coisas foram acontecendo de uma forma muito natural. Sou muito estratégico com a minha carreira, mas existe uma forma natural de as coisas se conduzirem. Eu estava em cartaz com “Zorro”, no teatro, em São Paulo e gravando “Meu Pedacinho de Chão”. Uma maratona dupla de trabalho e, assim que a novela terminou, segui com essa minha peça, fiz uma turnê internacional. E, na época, não pude emendar em uma outra novela, porque estava já comprometido com a peça viajando. E em 2016, entrei para fazer uma participação em “Sense8”  e desde então fiquei na Netflix. Fiz segunda, terceira e quarta temporada de “3%”, e meu último trabalho foi em “Só Se for Por Amor”, série que está para estrear, que terminamos de gravar em 2021. E o fato de eu estar lá em projetos grandes, não tive como estar em outro lugar. E quando acabaram as gravações, eu já estava escalado para a novela. Tinha feito o teste e passado. Foi um encaixe perfeito. 

Foto: Italo Gaspar / Assistente de fotografia: Iago Kulesis / Styling: Thiago Biagi

A novela fala sobre dublês. Você já encarou alguma cena de ação ou deixa mesmo para os dublês? 

Estou brincando com os diretores que eu não quero ter dublê nesta novela por conta de toda essa minha familiaridade com a acrobacia. Quero fazer as minhas cenas de ação, mas, claro, existe uma medida onde isso é possível. Por enquanto, não usei dublê. Veremos conforme a dificuldade aumentar, vamos ver a necessidade.

Você vai ser um vilão. O que tem de mais gostoso nesse perfil de personagem? 

O gostoso do vilão é que, em alguns capítulos, tenho uma cena apenas, mas ela, por menor que seja, é algo conflituoso com o Renan, porque ele é um personagem de conflito, muito ardiloso, extremamente inteligente e muito focado no que ele quer. Ele friamente é capaz de qualquer coisa para atingir seu objetivo. Toda vez em que ele aparece, tem uma tensão no ar, porque nunca se sabe como ele vai agir. E, na maioria das vezes, ele faz e fala as maiores atrocidades. Ele cruza essa linha entre instrutor carrasco, professor e amante  com a namorada dele, bailarina da companhia. Ele tem uma exigência doentia com ela. Um pouco por proteção, porque gosta dela, mas também tendo consciência de que se ela for bem, ele vai colher frutos por isso. Renan é um prato cheio para mim, que não tem nada a ver com este perfil. Sou o oposto radical do que ele é. Ele usa a todos ao seu redor para manipular. Estou adorando esta vilania, porque me permite ter a liberdade criativa para justificar o injustificável.

Durante este tempo, esteve em cartaz com a peça “Zorro”, no teatro, e na série “3%”, na Netflix. Acha importante o ator ocupar todos os espaços? 

Com certeza! E não fiz só isso, essas foram algumas coisas que eu fiz, como eu falei, gravei “Só se For Por Amor”, que é uma série musical, sertaneja, que tem um tom totalmente diferente de “Zorro” e “3%”, fiz a peça “Baixa Terapia” também, entre outras. Fiz filmes e rodei bastante neste período. Então, para mim, não sei se é ocupar todos os espaços, mas ocupar espaços diversos, que são importantes para minha carreira, que eu gosto, almejo e mora a minha ambição. O meu desejo é que alguém um dia olhe para a minha carreira e fale: “Caramba, que carreira plural! Todo dia me esforço para criar novas oportunidades. Eu não paro! Mesmo agora gravando a novela, já penso na próxima peça que vou fazer, que vai ser um personagem que eu ainda não fiz na minha carreira. Essa diversidade é muito importante para minha carreira. É uma meta. Sou bastante inquieto. Nunca entrei em zona de conforto. 

Está visivelmente com o corpo transformado. O que você fez? Estas mudanças tiveram a ver com a composição de seu personagem?

Assim que eu soube do Renan, que é praticamente um acrobata, um atleta, para mim não faria muito sentido se eu não fosse atrás de um corpo mais preparado para isso, mais  pronto para esse desafio. Nem pensei em estética, na verdade. O que mais penso é em prontidão e preparo físico. A dança aérea e o circo exigem muito. É um esforço quase sobre-humano. O que fiz foi intensificar a minha preparação com treinos específicos de dança aérea, de acrobacia, de corda para equilíbrio, explosão e força e isso, obviamente, traz um resultado. Adicionei a tudo isso uma dieta balanceada. A estética veio em segundo lugar, mas é bacana se sentir satisfeito com seu corpo. 

Você é filho de Antônio Fagundes, um dos atores mais renomados da dramaturgia. Comparações é algo que lhe incomoda? 

Não sou comparado a meu pai há muito tempo. Elas não me incomodam, porque não existem. Tenho uma carreira totalmente independente da dele, trabalho independente do dele. Até a minha forma de construção e de entendimento do trabalho, construção e entendimento, é diferente do dele, porque eu sou uma pessoa e ele é outra. 

Filho de galã, galã é? Esse adjetivo te agrada ou incomoda? 

Não sei não… (risos). Acho que isso não é determinado por genética ou biologia. Isso é uma questão de trajetória e carreira. Meu pai ganhou esse rótulo por causa dos personagens que ele fez, que tinham essas qualidades e podem ser vistas como um galã, apesar de eu discordar disso. Até parafraseando o meu pai: “Não sou um ator bonito, eu sou tão bom ator, que eu faço todo mundo acreditar que sou bonito (risos)”. Ele sempre fala isso, com humor, claro! Porque sempre foi bonito, mas acho isso incrível, porque também entendo o trabalho do ator desta forma. O que importa é o que você faz com o trabalho e o que as pessoas enxergam ou rotulam, vem depois. E eu deixo isso para as pessoas decidirem. O que estou fazendo é o meu trabalho, indo atrás do que acredito com muita dedicação. Nunca, em momento algum, relaxei pelo fato de ser filho do meu pai. Nunca usufrui disso para abrir portas ou conseguir qualquer coisa. Não acredito em resultado fácil. Gosto de ir atrás do desafio.   

Foto: Italo Gaspar / Assistente de fotografia: Iago Kulesis / Styling: Thiago Biagi

Acredita que as pessoas te enxergaram de um jeito diferente depois desse trabalho? 

Espero que sim. Faz muito tempo que fiz “Meu Pedacinho de Chão” e, apesar de ter tido uma carreira muito prolífera na Netflix, sabemos que atinge públicos diferentes do que em um trabalho em TV aberta. Tenho a sensação de que as pessoas têm uma referência do meu trabalho ainda um pouco nebulosa. Quem não me assistiu na Netflix e nem no teatro, não conhece o meu trabalho, e são essas pessoas que quero que me conheçam. E sou grato que este momento seja agora, de uma forma mais madura, no auge dos meus 33 anos. Quero que vejam meu trabalho em potência máxima .

E você ainda tem uma série para estrear, certo? Pode contar mais? 

Exatamente. Como disse antes, tenho a série “Só Se For Por Amor” para estrear, que é um projeto lindo. E quando comecei a fazer a série, já existia Renan. Os personagens são absolutamente opostos. Vou ter dois trabalhos simultâneos e as pessoas poderão acompanhar o exercício do ator, e é um privilégio. A série é um musical com elenco maravilhoso:  Lucy Alves, Filipe Bragança …Eu canto, toco piano. Vou ter a oportunidade de mostrar coisas bem diferentes do que estou fazendo na novela. Deve estrear agora, no segundo semestre.

Seu trabalho está sendo cada vez mais reconhecido pelo grande público. Como tem sido a troca nas ruas? 

Tem sido muito bom. Além das ruas, o termômetro que temos são as redes sociais e eu recebo muito carinho diariamente de pessoas que conhecem o meu trabalho. Não é apenas uma tietagem, são pessoas que pararam para acompanhar os meus trabalhos. Isso me emociona. E percebo cada vez mais a minha independência da figura do meu pai. As pessoas nem lembram de quem sou filho, no sentido bom. Tenho o maior orgulho de ser filho de quem sou. Amo meus pais, são profissionais excelentes, referência. 

Com o reconhecimento, vem também a exposição. Como lida com ela? 

A exposição é uma consequência. Quanto mais você se expõe na via pública, mais visto será. Mas ainda acho que existe uma beleza na preservação. Cresci vendo profissionais e atores fazendo isso. Eu vi de perto o que é essa exposição máxima, que foi meu pai na época de o “Rei do Gado”, “Renascer”. Era muito voraz. A audiência não era tão pulverizada e vi meu pai se preservar muito por uma questão de saúde mental .

Para a novela, precisou sair de São Paulo para morar no Rio de Janeiro. Como está sendo esta adaptação?

Está sendo bem desafiador. A última vez que vim para cá (Rio de Janeiro), em “Meu Pedacinho de Chão”, estava em cartaz em São Paulo e fiquei assim a novela inteira. Gravava de segunda a quinta, ia para São Paulo fazia a peça sexta, sábado e domingo e voltava para gravar segunda de manhã. Agora quis fazer diferente. Quero viver a experiência do Rio, criar laço, criar rotina. Trouxe a maior quantidade de coisas que eu pude trazer e estou instalado. Isso é um desafio. Não é minha cidade, não é onde está minha famíli, minha raiz. Meu pai mora aqui, mas minha mãe, meus irmãos não são daqui e meus melhores amigos não são daqui. Estou me redescobrindo em uma cidade que conheço pouco. Tem momentos de solidão, introspecção.

Você está solteiro? Há quanto tempo não namora? 

Estou solteiro, faz um tempo que eu não namoro. Sou muito voltado para o trabalho e a pandemia foi um momento muito conturbado, para todo mundo, obviamente. Assim, que comecei a trabalhar. Minha libido está 100% no meu trabalho. Confesso que não estou pensando em relacionamento no momento. Estou pensando em produtividade. Correr atrás do tempo perdido. Estou muito bem e feliz assim. Me sinto muito bem acompanhado com meus livros e estudos, minhas séries e trabalho. 

Foto: Italo Gaspar / Assistente de fotografia: Iago Kulesis / Styling: Thiago Biagi

Você é mais discreto em relação a sua vida afetiva. Prefere preservar esse lado, já que a profissão já te expõe?

Fui muito exposto na minha adolescência através dos meus pais e isso muda você. Te transforma. Tem muita gente que hoje busca a fama. E quem busca, óbvio, não sentiu na pele. Agora estamos na era da fama a qualquer custo, que todo mundo quer expor tudo o tempo inteiro. E pelo fato de ter crescido em um lugar onde tudo era muito exposto acho saudável me preservar. Me lembro que quando era criança, meus pais se separaram e eu não  entendia, tinha oito anos. Na escola lembro uma vez um colega jogar uma revista no meu colo. Na capa, era meu pai e minha mãe com um raio separando os dois. Isso machuca e me traumatizou. Hoje tenho maturidade para entender o que gerou o trauma: me senti invadido. Isso, com certeza, gerou um Bruno que age desta forma hoje em dia. Acho saudável preservar o meu direito de ficar mais recluso quando eu quiser.

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