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“Um Inimigo do Povo”, do norueguês Henrik Ibsen, entra em cartaz no Aliança Francesa

Cena de “Um Inimigo do Povo” – Foto: Ronaldo Gutierrez

O encenador José Fernando Peixoto de Azevedo radicaliza as questões políticas propostas pelo clássico teatral “Um Inimigo do Povo”, do dramaturgo norueguês Henrik Ibsen (1828-1906). O espetáculo homônimo estreia no dia 7 de abril, no Teatro Aliança Francesa, onde segue em cartaz até 1º de maio, com sessões de quinta a sábado, às 20h, e aos domingos, às 18h. O elenco é formado por Augusto Pompeo, Cesar Baccan, Clara Carvalho, Lilian  Regina, Lucas Scalco, Raphael Garcia, Rodrigo Scarpelli, Rogério Brito, Sérgio Mastropasqua, Tatah Cardozo, Thiago Liguori.

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Com uma crítica extremamente atual, o texto de Ibsen acompanha o drama do médico Thomas Stockmann, que é ameaçado pelos interesses econômicos e a corrupção do poder público ao descobrir e denunciar que as águas de sua cidade – cuja principal atividade é um balneário e termas – estão contaminadas. O anúncio gera um enorme conflito quando os empresários locais mobilizam, com apoio da imprensa, a opinião pública contra o protagonista, transformando o herói da cidade em um inimigo do povo – a massa forjada nos confrontos de poder. E tudo ganha uma proporção ainda maior porque ele é irmão do prefeito e casado com a filha adotiva de um grande empresário.

A encenação de Azevedo acentua a exposição pública do médico fazendo com que o episódio ganhe ares de terror. Para contribuir com essa atmosfera, o trabalho tem como referência cinematográfica o clássico “A Noite dos Mortos Vivos” (1968), do norte-americano George A. Romero, que traz um protagonista negro tentando sobreviver em um país onde as pessoas da classe média branca se transformam em zumbis, por conta de uma epidemia. Nessa sociedade armada e organizada em milícias, que quer eliminar a todo custo os mortos-vivos, o personagem vivido pelo ator Duane Jones acaba “confundido” com uma das criaturas e é assassinado.

E o diálogo com o audiovisual não para por aí. Assim como em outros trabalhos dirigidos por Azevedo, como a bem-sucedida montagem de “As Mãos Suja”s (2019), de Sartre, a nova peça traz para o palco um dispositivo em que a câmera contracena com os atores, desdobrando-se na materialidade da imagem, em jogo.

A discussão proposta pelo dramaturgo norueguês ainda é radicalizada pela presença de atores negros no elenco -, trazendo para a cena a dimensão dos conflitos raciais que nos tomam no tempo presente e também contribui para a discussão sobre a presença de artistas negros no teatro brasileiro.

“A racialização dos corpos em cena potencializa, certamente, aspectos de um debate sobre as dimensões do racismo no Brasil, e nos faz ver que a trajetória de mobilidade social numa sociedade em que a violência é estrutural, quase sempre é vivida como um filme terror. A pandemia apenas evidenciou esse teor, quando cada vez mais vimos o sentido efetivo de uma sociedade confinada: aqui, desde sempre,  populações inteiras são marcadas, cercadas e alvejadas pela violência do Estado a serviço do capital; cercadas e assassinadas ao vivo”, comenta o diretor.

Todas essas questões são acentuadas pelo impacto do momento em que vivemos, já que a contaminação das águas proposta pela peça escrita em 1882 pode ser facilmente comparada à pandemia de Covid-19 e as nefastas disputas políticas e econômicas em torno da catástrofe, diariamente televisionadas.

Teatro Aliança Francesa – Rua General Jardim, 182, Vila Buarque, SP.

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