Lucas Oranmian: “A cultura brasileira é potente e merece respeito”

Ator Lucas Oranmian – Foto: Marcio Farias

Lucas Oranmian é um ator baiano radicado em São Paulo. Com raízes no teatro de Salvador, foi no longa-metragem “7 Prisioneiros“, da Netflix Brasil, que seu nome ganhou grande projeção e destaque nacional e internacional. Para o artista, muito além de falar sobre futuro, trabalho ou presente, é preciso valorizar nosso material cultural nacional.

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“A cultura brasileira é potente e merece respeito”, disparou ele, completando que sonha com um novo governo a altura do nosso País para o próximo ano. “Me dá um brilho no olho pensar que daqui a exatamente um ano vamos poder ter um novo governo sendo eleito, diferente do atual e formado por pessoas preparadas e realmente interessadas no desenvolvimento do nosso País em várias camadas, como deveria ser”, finaliza.

Além do longa-metragem dirigido por Alexandre Moratto, do aclamado filme “Sócrates“, Oranmian se prepara para estrear três outras produções: “Grande Sertão“, dirigido por Guel Arraes e Flávia Lacerda; “Travessia“, dirigido por Bia Lessa; e “Intimidade Pública“, dirigido por Luciana Canton. Fora isso, ele está em fase de captação do curta-metragem “AYÔ“, com temática gay que contracenará com Caio Blat.

Veja abaixo a íntegra do papo de RG com o ator Lucas Oranmian sobre seu ofício como ator, cultura nacional e futuro do País.

Ator Lucas Oranmian – Foto: Marcio Farias

RG – Seu último grande trabalho foi o filme “7 Prisioneiros”, em cartaz no catálogo da Netflix Brasil. Como foi viver Isaque?

Lucas Oranmian – Foi uma adrenalina maravilhosa. O Isaque é bem diferente de mim, é cabeça quente, não pensa muito antes de agir, briga, grita, mas tudo isso em busca de justiça, e respeito. Eu sou mais pragmático, reservado, penso bastante antes de entrar numa discussão, mas se estou lutando por algo que acredito vou atrás com toda a força que eu puder. No longa-metragem, estamos falando de pessoas que estão tentando sobreviver a uma situação horrível e que, infelizmente, ainda acontece muito. O tráfico humano e o trabalho análogo à escravidão. Estudei bastante pra tentar me colocar naquela realidade e conversar com pessoas que passaram por isso me fez ter ainda mais noção da responsabilidade que tinha ao fazer esse papel. Então, a forma como o Isaque quer lutar por sua liberdade, sem abaixar a cabeça ou ter medo de quem tem mais poder, ir atrás dos seus direitos, com sangue nos olhos, maravilhosa!

RG – Trabalhar com nomes grandes como Rodrigo Santoro e Fernando Meirelles te tocou de alguma forma? Como foi esse processo?

Lucas Oranmian – Primeiro tem aquele momento que parece meio inacreditável, né? Meu primeiro tapete vermelho foi no Festival de Cinema de Veneza (2021) com esse filme ao lado do Rodrigo que sempre admirei; do Alexandre Moratto, um diretor fantástico; o Ramin Bahrani, profissional do cinema reconhecido internacionalmente; e Fernando Meirelles, como produtor, um cara do qual eu sou fã desde sempre, mas, para mim, o mais legal é estar no ambiente de trabalho com toda essa galera e ver que estamos juntos na mesma frequência, empenhados em fazer um trabalho interessante para quem vai ver o filme e que nos dê orgulho. O set desse filme foi uma delícia. São muitas cenas tensas, e contar com colegas que trocam com toda a sinceridade e verdade é o que faz sentido pra mim.

RG – Você tem raízes no teatro, né? Como foi migrar deste lugar de experimentações para telas?

Lucas Oranmian – O teatro é onde eu comecei de fato a aprender sobre o ofício, não só a como atuar, mas como funcionava a engrenagem. Comecei em teatro de grupo, independente e todo mundo era meio que responsável por tudo. Fui criando autonomia e entendendo sobre a profissão na marra. Mas eu também sempre fui bem noveleiro desde criança, assistia muitos filmes, ensaiava cenas sozinho no espelho e fazer audiovisual era algo que eu sempre quis. Fazia faculdade de teatro na USP, mas também dava um jeito de fazer curso de cinema na New York Film Academy nas férias. Hoje, fazendo teatro e audiovisual, sempre pego algo que aprendi em um e levo pro outro. É uma maravilha ter o calor do público no teatro, ver a reação na hora, e também é incrível acompanhar as mensagens que chegam nas redes sociais de pessoas do mundo todo sobre o filme por causa do alcance que o cinema tem, ainda mais em um filme com estreia mundial na Netflix.

RG – Suas raízes baianas te ajudaram a construir seu eu-artístico de que maneira?

Lucas Oranmian – Desde criança, sabia que trabalharia com artes, só não sabia com o que exatamente, se seria na dança, na música, ou na atuação. Crescer em Salvador me possibilitou, por exemplo, que a minha primeira aula de dança fosse uma aula de axé music. Eu amava, e foi ótimo pra explorar as minhas vontades. Desde criança, ia com meus pais para o carnaval. Tive certeza de que seria ator depois de interpretar na escola um discurso que o Caetano Veloso fez durante a apresentação da música “É proibido proibir”, então tá tudo ligado. A Bahia tem um axé que eu nem sei explicar. Quando estou lá sinto algo diferente, e todo trabalho que eu fizer vai ter um pouco desse axé e desse dendê que me formou, porque é o que eu sou mesmo.

RG – Para este ano que acaba de começar, quais são seus principais planos pessoais e profissionais?

Lucas Oranmian – Sempre gostei de escrever buscando mais autonomia criativa, e finalmente tomei coragem e escrevi meu primeiro roteiro de cinema agora em fase de captação. É o curta metragem “AYÔ” que fala sobre a vida de um homem negro, gay, de classe média e seus afetos. Vou protagonizar e o Caio Blat vai fazer o par romântico da minha personagem. Desde que comecei a trabalhar como ator sinto falta de uma diversidade nas narrativas que contam a vida de pessoas pretas. Isso está mudando, mas ainda a passos lentos, e se deve muito ao fato de ainda termos poucas pessoas pretas chefiando as equipes criativas no audiovisual, apesar de haver ótimos profissionais disponíveis. Além disso, agora aguardo o lançamento de outros três filmes em fase de pós produção: “Grande Sertão“, dirigido por Guel Arraes e Flávia Lacerda; “Travessia“, dirigido por Bia Lessa; e “Intimidade Pública“, dirigido por Luciana Canton. Também quero muito voltar a fazer teatro, e estou torcendo para que venham mais personagens vibrantes no audiovisual.

RG – Qual sua esperança para o Brasil neste ano de eleições?

Lucas Oranmian – Me dá um brilho no olho pensar que daqui a exatamente um ano vamos poder ter um novo governo sendo eleito, diferente do atual e formado por pessoas preparadas e realmente interessadas no desenvolvimento do nosso País em várias camadas, como deveria ser. Estamos há quase dois anos vivendo uma pandemia, muitas pessoas não resistiram, impossível estar plenamente feliz nesse momento. Estamos machucados mas vamos lutar pra transformar isso, e que seja com muita empatia, diálogo olho no olho e muita garra.

RG – Você acredita na cultura do nosso País?

Lucas Oranmian – Acabei de fazer um filme só com diálogos escritos pelo Guimarães Rosa com direção de Guel Arraes, que também já adaptou o Auto da Compadecida, do Ariano Suassuna. Só de pensar nessa galera aí e no quanto contribuíram para a minha formação como ser humano, me dá muito orgulho, mas por outro lado também tristeza por tudo isso estar sendo tão desvalorizado. O cinema brasileiro está sofrendo uma porrada atualmente, e “7 Prisioneiros”, por exemplo, foi o segundo filme em língua não inglesa mais visto mundialmente na Netflix. Imagina se houvesse mais investimento ao invés de todo esse desmonte? A cultura brasileira é potente e merece respeito.