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Caco Ciocler: ator se casou na pandemia, está fazendo faculdade e não para de trabalhar

Foto: Yuri Graneiro

Caco Ciocler é um ator, diretor e produtor que todo mundo tira o chapéu. O cara é um tipo de artista queridinho da mídia e não é à toa, o talento aqui fala bem mais alto. Dono de personagens famosos na TV, ele enaltece, sobretudo, seu trabalho no cinema e no teatro.

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Por conta de seu casamento com a psicóloga e terapeuta Paula Cezari durante a pandemia, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde vem fazendo produções de cinema e aprendeu algumas coisas durante o isolamento, como cozinhar o básico e reformar sua casa em São Paulo. Cheio de projetos no cinema, Caco é um cara que não para, sua mente está sempre a mil com projetos audiovisuais e teatro, que ele espera retornar assim que a pandemia passar e for possível, novamente, haver um contato direto.

Ele é tão ativo e pensante, que está cursando uma faculdade de biologia a distância. Interessa-se por formigas, tartarugas, a natureza e quer expandir seus conhecimentos em como lidar com o outro, estudando. “Minha profissão tem muito de estudar o ser humano, mas eu estava um pouco exausto de ver apenas pela ótica do simbolismo, eu queria ver um pouco mais na prática”, explica.

Judeu, ele foi criado na comunidade e ali deu seus primeiros passos na arte de interpretar. Frequentou escola e clube judaicos, e era cheio de amigos que também se tornaram referência na dramaturgia, como Dan Stulbach.

Leia a seguir o papo que RG teve com o ator via Zoom.

Foto: Yuri Graneiro

Como tem passado com a pandemia?

Eu me casei durante a pandemia. Eu estava namorando, mas a Paula [Cezari] mora aqui no Rio e eu estava em São Paulo, então estávamos nesse vaivém. Primeiro, que na pandemia isso não fazia mais sentido, viajar começou a ficar estranho. Segundo, que ficávamos sozinhos cada um em sua casa. Aí ela me pediu em casamento e eu me mudei para o Rio.

Viu sua netinha?

Eu vi minha netinha porque fomos para Florianópolis, que é onde eles moram, e eles três pegaram Covid-19, meu filho, minha nora e minha neta.

O que você quer fazer quando acabar essa loucura toda?

Nossa, são tantas coisas. Eu quero fazer teatro, passar um tempo perto do meu filho, da minha neta e da minha nora, passar um tempo com os meus pais, que também estão isolados, passar um tempo com os amigos, abraçar muito as pessoas. É que eu acho que não vai ser uma coisa assim, a partir de hoje acabou, mas se houvesse um marco, acho que as pessoas sairiam se abraçando nas ruas, acho que seria uma comoção humana.

Você aprendeu alguma coisa diferente nesse período?

Eu reformei minha casa em São Paulo, antes de me casar, pintei a casa inteira troquei tomada quebrada, fiz uma horta, essas coisas que todo mundo fez. Aprendi a cozinhar o básico. Mas eu fiquei muito ocupado na pandemia. Primeiro que eu criei a Lista Fortes [ação voltada às empresas no combate à pandemia], isso tomou muito tempo porque muita gente quis participar, eu me senti um empresário mesmo, porque eu tinha que tomar conta de uma coisa que eu não imaginei que fosse tomar esse volume. Antes da pandemia eu tinha entrado na faculdade de biologia, curso a distância, então eu cumpri o primeiro ano já.

Foto: Yuri Graneiro

E por que biologia?

Por alguns motivos. Quando eu era um pouco mais novo, eu li um livro sobre formigas, e eu fiquei muito fascinado, comecei a ver filmes de formigas, de cupins. Ali me deu uma vontade de estudar isso, mas passou. Depois eu tive uma piração com tartarugas, queria participar do projeto Tamar, mas passou também. Recentemente eu li um livro sobre árvores, a inteligência das árvores, e um cara que estava criando robôs, assunto pelo qual sou fascinado também, baseado na lógica e na inteligência dos vegetais. Minha profissão tem muito de estudar o ser humano, mas eu estava um pouco exausto de ver apenas pela ótica do simbolismo, eu queria ver um pouco mais na prática. Juntou isso tudo e resolvi estudar biologia.

Como nasce o Caco ator?

Eu sou judeu e estudava em uma escola judaica, eu fazia parte de uma grupo muito familiar, meus amigos eram todos muito próximos, os pais todos se conheciam, e nós tínhamos um tipo de adendo da escola que era o clube Hebraica, do qual eu era sócio, então nós saíamos da escola e íamos para o clube, era quase um quintal de casa. E, lá, fazíamos as modalidades de esportes, mas eu fazia também, desde muito pequeno, escola de artes, expressão artística, porque eu era muito tímido e minha mãe achava que isso faria bem para mim, além de que dois dos meus grandes amigos também faziam. Aí eu fui fazer dança folclórica judaica, que era uma coisa que a turma inteira fazia. E em um dos ensaios nosso coreógrafo falou que uma pessoa queria dar um recado. Aí chegou o Heitor Goldflus dizendo que estava abrindo um grupo de teatro para ver quem se interessava em participar, de cara eu não me interessei. Posteriormente, um amigo meu disse que estavam montando uma peça, “O Gênio do Crime”, e que estavam precisando de gente, aí eu fui e não saí mais. Fiquei anos fazendo teatro amador, com vários diretores, virei diretor de teatro, depois coordenador e por aí vai.

Foto: Yuri Graneiro

Paralelo ao teatro, eu fui fazer engenharia química. No segundo ano da faculdade, a comunidade judaica foi fazer uma peça, “O Violinista do Telhado”, que é um musical, eram 200 pessoas em cena e dez atores profissionais. Eu fazia um dos personagens centrais, e no meio da temporada uma das atrizes principais faleceu, colocaram no lugar dela um atriz amadora, e dividiram o salário da atriz que morrera entre mim e o Dan Stulbach. E esse foi meu primeiro salário como ator. O diretor dessa peça era o Iacov Hillel, que morreu no ano passado, e ele era também o diretor da Escola de Arte Dramática (EAD) da USP, e me convenceu a fazer o curso. Eu prestei a EAD e entrei, durante dois anos fiz os dois cursos juntos. Em 1995, alguém me viu em um espetáculo profissional e me chamou para fazer um teste para “O Rei do Gado”, da TV Globo, eu passei no teste e larguei de vez a engenharia. A EAD eu também não consegui terminar. Mas vou terminar agora biologia (risos).

Quais são os principais personagens da sua carreira?

Olha, é difícil essa pergunta pelo seguinte, os personagens ruins, aqueles que eu não dei conta, e foram alguns, na verdade são os mais importantes para a carreira. Tipo um personagem longo, de uma novela, que ele não acontece, é uma experiência muito sofrida, mas é onde eu acho que a gente mais aprende. Acho que contribui mais para a carreira do que os personagens que deram certo. Mas as boas lembranças eu tenho dos personagens que deram certo. Tem alguns, o Geremias Berdinazi foi o meu primeiro, na TV. Bento Coutinho, de “A Muralha”, foi um personagem que alavancou a minha carreira dentro da televisão; Dom Miguel de “O Quinto dos Infernos”,  personagem que eu amo; depois o Ed. Talbot, de “América”, que foi outra alavancada, isso tudo dentro da televisão.

No cinema, tem “Bicho de Sete Cabeças”, que foi minha estreia também e foi super legal; tenho muito orgulho de ter feito “Quanto Vale ou É por Quilo?”; “Quase Dois Irmãos”; “Dois Coelhos”; ah, todos. São como filhos, cada um a gente gosta de um jeito e por um motivo, mas ama igualmente todos.

No teatro, eu não diria personagens, mas trabalhos, companhias das quais fiz parte, foi o momento mais criativo e profundo da minha carreira.

E o seu mais recente trabalho lançado, o “Boni Bonita”?

É um filme que eu já fiz há algum tempo, é uma coprodução Brasil-Argentina, eu sempre fui fascinado pelo cinema argentino, é um filme de dois atores, eu e a Aillín Salas, então foi um sonho fazer um filme argentino, de apenas dois atores, pequeno. O diretor é um jovem [Daniel Barosa], e eu adoro fazer filmes de jovens diretores. Acho que se a gente gosta do roteiro, tem a obrigação de nos colocar à disposição dos novos diretores. É um filme difícil porque ele não é óbvio; você acompanha a vida desse casal por meio de fragmentos, não tem grandes acontecimentos, mas acontece muita coisa, como na vida. Os personagens não são carismáticos, é um filme árido.

Foto: Yuri Graneiro

E como você se preparou para o seu personagem?

O filme acontece em quatro momentos da vida do casal, e o Daniel [diretor] conseguiu separar esses quatro momentos de fato. Fizemos a primeira, aí eu voltei para São Paulo e ela, para Buenos Aires. Seis ou sete meses depois a gente se reencontrou para fazer a segunda parte, e assim sucessivamente. Era um filme de experiência. Então a grande preparação era o reencontro com a Ailín, porque eu não sabia como ela viria, nem fisicamente nem como pessoa, porque a gente muda, né? De seis em seis meses a gente muda. Então o grande aspecto do filme foi o fato de nós nos colocarmos à disposição do que iria acontecer.

E para 2021, quais são seus projetos?

Então, nessa pandemia também eu lancei o “Partida”, que é um filme que eu dirigi. Foi muito importante porque foi feito de maneira muito autoral, sem patrocínio, sem lei de incentivo, foi feito assim no susto, de maneira colaborativa. E ele foi muito surpreendente.  Começou a ganhar alguns prêmios, boas críticas, foi para fora do País, Espanha, Portugal, então foi um grande susto bom, que me fez pensar no próximo. Eu já filmei o próximo de maneira remota, um aprofundamento nessa história que é uma mistura entre ficção e documentário, eu gostei disso, e estou neste momento montando o filme. Eu prefiro não dizer o nome ainda, mas eu quero lançá-lo muito rápido, porque faz muito sentido durante a pandemia.

Teatro, eu estava ensaiando uma peça chamada “Língua Brasileira”,  que é um musical dirigido pelo Felipe Hirsch, dessa companhia Ultralíricos, da qual eu faço parte e que ele dirige. É um musical a partir de canções de Tom Zé, que fala da origem da língua brasileira. A gente estava para estrear, foi quando veio o isolamento. O Tom Zé já havia composto três músicas inéditas, agora já compôs seis. Então, quando a pandemia acabar, nós devemos ser um dos primeiros a estrear.

E na televisão, eu não tenho nada confirmado, mas eu tenho alguns convites bacanas de séries, mas também não sabemos ainda quando será possível acontecer.  É uma série sobre o Betinho. Tem ainda a “Unidade Básica”, da Universal TV, que eu faço e dirijo também, e estamos indo para a terceira temporada, mas precisamos esperar a pandemia passar.

E projetos para YouTube/Instagram?

Eu participei de uma projeto de teatro online do Sesc, que é incrível, mas que foi difícil, eu achei um horror, porque para mim teatro tem a ver com o público. É um jogo, quando você faz um monólogo, você tem que sentir como está chegando no público, e eu estava sozinho em casa com uma câmera, não sabia o que estava acontecendo. Mas foi a minha experiência pessoal.

Agora, esse filme que eu estou montando, não sei se alguma produtora vai ter interesse em lançar, senão eu lanço em alguma plataforma.

Mas você tem um lado de humor que nem todo mundo conhece, como sua brincadeira no Instagram ao ler uma bula do Luftal. De onde vem essa sua veia humorística?

As pessoas não conhecem, é engraçado, mas eu tenho esse lado do humor. Quando me chamaram para fazer o filme “Um Namorado Para a Minha Mulher” com a Ingrid [Guimarães], falaram: mas o Caco, o Caco é tão sério! Eu não sou essa pessoa tão séria, não sei por que passei ou quis passar essa imagem, eu sou muito brincalhão. Como veio essa ideia [do Luftal] mesmo? Eu estava conversando com alguém e pensamos: o que vamos fazer agora? E eu disse: vamos ler umas bulas de remédio. E aí, um dia eu estava aqui sem ter o que fazer e me lembrei da ideia da bula, e resolvi fazer.

Como você vê a arte no momento atual do País?

Nós estamos passando por um momento muito terrível, isso é fato, a gente está sendo governado por um time… Eu não sei, sinceramente, quantas peças de teatro o Bolsonaro [Jair] assistiu, a quantas exposições ele foi, eu não sei, a sensação que eu tenho é que foi muito pouco. A sensação que eu tenho é que o clã que governa este País hoje em dia tem muito pouco contato com a cultura, entende pouco, nem para o que serve, do que se trata. A começar pelas pessoas que ele chama pata conduzir o que hoje é a pasta de cultura. Já fomos rebaixados a pasta. A sensação que passa é que ele acha que tem que colocar algum ator, alguém da “tchurma”. Mas é um profundo desconhecimento, porque a pessoa que ocupa esse lugar não é alguém para representar a classe, é alguém para cuidar da cultura no País. Claro, representa a classe também, mas tem que acessar o público como estratégia de educação, como estratégia de um país.  Então acho que tem uma confusão aí do que seja cultura, para começar. Houve um ataque profundo aos artistas e à cultura, isso me deixou por uma lado triste e, por outro, feliz. O lado triste qual foi? Acho que teve uma questão vingativa, porque uma grande parcela dos artistas se colocou contra o Bolsonaro, e aí as pessoas não entenderam por quê, pois a outra opção era o PT, e tinha comprado a ideia de que o PT era o grande problema do Brasil. Claro que tiveram problemas, as pessoas não entendiam como os artistas podiam apoiar este monstro que a mídia construiu como sendo o PT, não estou descartando os erros. Mas mesmo com os erros, diante das opções, a maioria dos artistas optou pelo PT. A única maneira de fechar essa conta na cabeça das pessoas era que a gente estava tirando alguma vantagem. Eu acho que teve uma revanche violenta, burra, agressiva, mas uma reposta à nossa negação a eles. Isso prejudicou muita gente, acabou com muito edital, foi um desmonte violento, e acabou atingindo justamente as pessoas que dependiam de edital. Foi muito triste. E não só os artistas,  mas os técnicos, muita gente do entorno dos artistas que perdeu seu emprego e ficou em uma situação muito ruim. Essa pequena parcela do orçamentos que é destinada à cultura comparada com o retorno que a cultura dá aos cofres públicos é gigantesca.

Dito isso, eu me senti honrado porque todos os governos fascistas de direita e de esquerda de toda a história a primeira coisa que atacam é a ciência e os artistas. Então isso é um reconhecimento de que eles sabem a importância e a força que nós temos e o estrago que nós somos capazes de causar. Não é à toa que todo regime autoritário, de direita e de esquerda, a primeira coisa é queimar livro, acabar com a ciência, com os artistas, com professores. Isso foi um sinal de que, opa, sabem com quem estão mexendo, embora o preço tenha sido muito alto.

Aí, veio a pandemia, e a história dá um jeito de corrigir as coisas, os cientistas que estavam renegados a segundo plano, desacreditados, voltaram a protagonizar; o SUS, que estava renegado, voltou a protagonizar; e os artista também.

Podem até dizer que as pessoas não tinham nada para fazer então estão vendo filmes. Eu acho que é uma coisa muito simples e profunda ao mesmo tempo, as pessoas voltaram a se humanizar. Por quê? Porque voltaram a sentir medo de morrer, porque voltaram a sentir sua finitude, porque voltaram a encarar as incertezas da vida. As pessoas estavam em um momento de muita certeza. Eu acho que a pandemia desestruturou as certezas, e a arte não sobrevive nas certezas. Por meio de um remédio muito amargo eu acho que a gente recuperou uma coisa muito importante.

Foto: Yuri Graneiro

E com foi o convite para você escrever no livro do Marcus Montenegro?

O Marcus Montenegro é um empresário, ele convidou algumas pessoas para escrever alguns capítulos e eu não sei por que ele deu essa honra. Eu estou há muitos anos com o Marcus, ele me respeita muito, não sei o porquê. Eu escrevi e a editora achou que tinha cara de posfácio, e assim foi. Que “responsa”.

Como você lida com as redes sociais?

Eu lido muito mal. Mas não com crítica, porque eu parei de ler. Às vezes, eu bato os olhos nas primeiras, mas são 200 ou 200 e poucos comentários, eu não entendo quem consegue fazer isso, eu não consigo. Eu acho que a pessoa contrata alguém para responder como se fosse ela. Não é possível. As poucas vezes que eu tentei responder isso me ocupava o dia inteiro, por você responde e a pessoa faz o mesmo. Eu acho que não é um lugar para discutir. Às vezes, eu vejo briga entre as pessoas que comentam, e eu penso, não vou me meter. Então eu só coloco o que eu quero e deixo. Infelizmente, eu adoraria ler tudo, mas não dá.

Lido muito mal porque vejo o Instagram dos colegas, mais ou menos o que cada um está fazendo, meus amigos e tal, e muitas vezes já me peguei achando que tinha que dizer algo sobre alguma coisa também. Mas aí eu pensei, Caco, você queria mesmo ter dito algo a respeito disso?  Então hoje em dia eu lido mal porque não tenho muita vontade de postar.  De vez em quando eu quero, como o lance do Luftal, por exemplo, ou a morte da Nicette [Bruno].

Eu sei a força que as redes sociais têm, quando vou fazer um trabalho de publicidade, a primeira coisa que eles pedem é um relatório da sua rede social para ver quantas curtida você teve e tal. Eu podia até estar aproveitando melhor esse canal, eu posto o que tenho vontade, mas não tenho a ânsia de entrar nessa engrenagem, acho que ela consome demais. E é uma maluquice. Quando eu me peguei olhando quantas pessoas tinham curtido uma postagem, pensei, o que eu estou fazendo? Eu já não consigo ter tempo para as coisas importantes… como as pessoas conseguem, eu não sei.

E você está lendo alguma coisa interessante neste momento? 

Eu estava lendo um livro sobre polvos, “Outras Mentes”. Eu achei que eu fosse gostar mais, mas estou gostando.

Tem alguma coisa que você não come de jeito nenhum? 

Polvo. Eu já não comia, depois de ler esse livro, jamais.

Como você cuida do seu corpo?

Eu faço ginástica funcional, faço com o Marcão, fazemos remotamente.

 

 

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