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Dre Guazzelli: como o DJ e empresário usou os meses de isolamento para produzir música e tirar sonhos do papel

DJ e empresário Dre Guazzelli falou sobre seus meses de isolamento e como ele conseguiu tirar sonhos do papel: músicas autorais e gravadora própria (Foto: Divulgação/@befazio)

Um fato sobre Dre Guazzelli é que ele nunca para de sonhar. O trocadilho infame com o nome da gravadora que ele lançou neste semestre – a “Never Stop Dreaming” – é válido porque reflete muito da alma e do trabalho deste DJ e empresário que tem mais de 17 anos de carreira e alguns milhares de fãs.

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Dono de um estilo único dentro da música eletrônica, André Guazzelli é hoje, aos 35 anos de idade, um dos nomes mais expoentes do gênero por aqui, assumindo as pick-ups de festas mais pop’s e de festivais pequenos e exclusivos Brasil adentro.

A versatilidade do artista foi construída, segundo ele, pela miscigenação musical que viveu ao lado de sua família. “Do lado dos meus pais, vinha uma vibe música como Pearl Jam. Da minha vivência, o eletrônico mais pesado. Do meu irmão e primos, o punk rock, como Blink 182”, disse ao RG, contando que se aventurou pela primeira vez em festivais aos 16 anos.

Hoje, seu estilo “camaleônico”, como ele mesmo se define, fez com que desse vida ao “Sábado Dre Tarde”: uma festa que acontece a cada 2 meses – em cenários pré-pandêmicos – com 6 horas de sets e muitas trocas de experiências entre os mais de 4 mil festeiros, que acompanham o DJ.

Nos meses de isolamento, Guazzelli afirma que seu maior presente foi algo intangível: o tempo. Por meio dele, pela 1ª vez na carreira, conseguiu se jogar dentro de seu próprio estúdio no rooftop de um hotel em São Paulo para produzir músicas autorias. Coisa que, então, nunca havia acontecido e era seu maior sonho.

“Meu maior presente foi o tempo e como eu reutilizei este tempo a meu favor para eu ser, durante a pandemia, uma versão melhor do que era antes”, disse, emocionado.

Abaixo, você lê na íntegra o papo com André Guazzelli e entende um pouco de como ele chegou e como ele quer continuar vivo dentro do mundo da música.

Dre Guazzelli realizou sonhos durante a pandemia: criou músicas autorais e lançou gravadora própria (Foto: Divulgação/@befazio)

 

RG – Como é que a música entrou na sua vida? Foi por influência da família?

Dre Guazzelli – O mais maluco é que, pelo o que eu consigo lembrar, eu tenho muita presença de viagens com meus pais e a música sendo escutada no carro – e são músicas que eu carrego comigo até hoje. Vim fazendo essa pesquisa comigo mesmo nos últimos meses, mas realmente o grau artístico na minha família é zero. Só eu mesmo. Lembro de ir nas primeiras baladas escondido dos meus pais aos 15 anos e, logo aos 16, eu já estava indo para o meu primeiro festival. Na época, eles eram bem pé na natureza, poucas pessoas. Aquilo me chamou muita atenção. Em um certo dia, quando eu já estava no ensino médio, um dia depois de voltar de um festival como este no Goiás, eu resolvi fazer um curso de DJ com dois amigos. Logo depois desse curso, eu fui fazer intercâmbio na Califórnia e, voltando, fiz a primeira festa aos 17 anos e, ao mesmo tempo, foi nessa festa que toquei para um público pela primeira vez fora do meu quarto! E desde então, eu venho fazendo isso e já soma metade da minha vida. 17 anos que estou na estrada, desde os meus 17 anos. Acabei de fazer 35 anos. O que mais me fascina e me deixa preparado é que eu sempre tive o incentivo, principalmente do meu pai, de ter uma mente e uma cabeça empresarial. Eu aprendi a cuidar de uma empresa mas, ao mesmo tempo, não perdi meu caráter artístico, de ser um artista. Fiz um lado ajudar o outro: sou um artista mais equilibrado, mais consciente e um empresário mais humano. Só o tempo me trouxe isso e demorei muito para acontecer isso. Hoje em dia, estes dois lados se interdependem.

RG – E quais foram as suas referências para você chegar no som e no estilo de música eletrônica que tem hoje?

Dre Guazzelli – Do lado dos meus pais, vinha uma vibe música como Pearl Jam e coisas similares. Da minha aventura pela vida, vinha essa música eletrônica mais forte. Do meu irmão e dos meus primos, vinha um pouco de punk rock, como Blink 182, Bad Religion. Essa miscigenação de estilos me levou em um estilo meu, que hoje tenho uma característica meio “camaleônica” de pista. Posso pegar uma de um jeito e entregar de outro, desde tocar no CarnaUOL depois do Vintage Culture e antes de uma atração de axé até uma tocada em Ibiza que é um som mais conceitual. Isso me traz a possibilidade de tocar em um festival e tocar em 3 pistas diferentes, por exemplo. E não deixar de ser eu, que é o mais legal. Quanto mais eu me aprofundo nas leituras e na meditação, tenho a certeza que estou no caminho certo. Hoje em dia, não enxergo como competição, não encaro outros DJs como rivais. Simplesmente tenho meu próprio caminho e uma auto-suficiência emocional para realmente conseguir seguir meu coração.

RG – E falando um pouco sobre a pandemia, como você lidou – individualmente falando – com estes meses da sua agenda travada, sem trabalhar, tocar?

Dre Guazzelli – Aproveitei para ver a parte boa e a parte ruim, como temos que fazer com tudo desta vida. Fiz uma análise de tudo que eu tinha feito na vida até aquele momento, agradecer antes de mais nada, não me desesperar. Fazendo esta análise, vi que minha alimentação já estava bem boa, minha prática de meditação e yoga estavam em dia, meu esporte diário já vinha sendo feito. O que eu tinha, que era um sonho, que eu demorei 15 anos para realizar, que era um estúdio próprio na cobertura do hotel Transamerica, em São Paulo. Completou 1 ano que eu tinha ele, quando a pandemia estourou. Era meu sonho ter meu estúdio para fazer minhas músicas próprias. Eu deixei isso no pause, porque eu sabia que precisava criar uma festa antes, ter uma empresa de eventos (como a que eu tenho hoje). Precisava fazer outros caminhos para ter experiência o bastante para, quando eu parasse para produzir, tivesse uma base bem sólida. Nestes meses, olhei para o lado e vi meu estúdio parado, não tinha tempo para me dedicar como devia a isso. Então me joguei nele e produzir muita música autoral. Estou conseguindo tocar outros projetos musicais, como um que eu tocava eletrônicos mais étnicos no festival Burning Man. Aproveitei para fazer uma análise crítica de tudo que eu vinha fazendo, ponderando como eu devo continuar e tudo mais; e aproveitar o tempo que eu tava ganhando porque, vendo pelo lado bom, estava ganhando tempo porque, com a agenda cheia, era difícil sair do ritmo e ir para o estúdio. Organizei meu tempo e agradeci por estar consciente disso. Meu maior presente foi o tempo e como eu reutilizei este tempo a meu favor para eu ser, durante a pandemia, uma versão melhor do que eu era antes.

DJ Dre Guazzelli durante gravação de set totalmente autoral no topo de um prédio em São Paulo (Foto: Divulgação/@befazio)

RG – Então, depois destes meses, você tem material novo para estrear?

Dre Guazzelli – Tenho, sim, músicas para lançar. Agora tenho propriedade musical para fazer colaborações com outras gravadoras, que agora consigo fazer. Fiz até um projeto que soltei um vídeo com 70 minutos de músicas autorais, com músicas que ninguém tinha escutado, gravado diretamente do topo de um prédio na Marginal, aqui em São Paulo. Eu, com 17 anos como DJ, entrei em um outro portal, um sonho mesmo de entregar sons meus. Eu sabia que uma hora ia chegar, e agora chegar. Foi graças a pandemia que consegui encontrar este lugar que tem muito a minha cara.

RG – Interessante demais! E neste meio tempo você lançou sua gravadora, certo? A Never Stop Dreaming?

Dre Guazzelli – Sim, isso mesmo. Foi exatamente isso! Igual quando eu criei a minha festa para ter autonomia, a relação com a gravadora é lançar músicas minhas, sem depender da aprovação ou do aval deste meio. Fiz, também, para ajudar outros artistas a lançarem os sons deles. Ao mesmo tempo que vira um imã de novas possibilidades por ajudar a lançar novas pessoas, e também lançar tudo que eu quero.

RG – E você pretende fazer 100% solo ou se aliar a outras gravadoras?

Dre Guazzelli – Eu adoraria me aliar a outras. Acho que tem tudo a ver, multiplica nossas chances. Só esperar a hora certa para que isso seja uma parceria com alguém que valha a pena.

RG – E como é seu lado “hunter” de talentos? É aguçado?

Dre Guazzelli – Na verdade, eu não encontro. As pessoas não necessariamente vem até mim, mas de acordo com o movimento do universo, vou pegando certas pistas de possibilidades para ajudar e ser ajudado. Sempre na política do ganha-ganha. Pego uma pessoa e tento imaginar como um diamante, que vou lapidando, e tenho a aprender com esta pessoa também. Tenho um faro para isso. Meu coração fala mais que a minha mente.

RG – Falando um pouco do seu lado empresário, como é que foi você como manager nestes meses de pandemia? Conseguiu manter seu time ou teve de dispensar alguns?

Dre Guazzelli – A gente conseguiu e fez questão de manter o time. Tiramos algumas coisas que eram terceirizadas. Conseguimos manter nossos fornecedores, e adiar dinheiro para quem precisava. A gente teve de reduzir alguns salários por conta da falta de eventos, mas não precisamos reduzir a equipe, mas sim, reduzir o ganho de cada um deles. Muito olhando para o lado humano que comentei, porque seria muito mais fácil demitir todo mundo, mas como fica o lado humano deles? Como remonta o time quando voltar? Toda essa questão era parte do entendimento.

RG – Sobre a festa, “Sábado Dre Tarde”, que já existe há 5 anos. Sua última edição foi quando?

Dre Guazzelli – A última foi no dia 7 de março, antes da pandemia estourar, e chegou a 4.200 mil pessoas.

Um dos principais nomes da música eletrônica, Dre Guazzelli é dono da festa “Sábado Dre Tarde”, que teve mais de 4 mil pessoas na última edição (Foto: Divulgação/@befazio)

RG – Eu nunca fui na sua festa. Qual é a pegada dela: é mais para quem é seu fã já ou é uma vibe meio comercial?

Dre Guazzelli – A vibe é inclusiva. Vão diferentes grupos de pessoas: pessoas que me conhecem ou que não me conhecem, mas que vão convidadas por pessoas que já me conhecem. Nosso crescimento é muito orgânico, passamos de 300 pessoas na primeira edição para mais de 4 mil. São 31 edições, em média, 6 por ano. Uma a cada 2 meses. É relativamente bastante. Eu toco 6 horas seguidas nelas. Então, por isso, eu me preparo por meio do esporte, da meditação, da alimentação, para que seja prazerosa. Raramente, uma pessoa vai e não se sente bem, porque é uma energia surreal, construída do zero. Tem uma viagem sonora a ser explorada, eu toco muito sons, diversos momentos. É só a pessoa querer embarcar comigo.

RG – Muitos artistas e DJs que eu já entrevistei relatam um crescimento do estilo e um amplo espaço da música eletrônica Brasil a dentro. Como é que você enxerga isso?

Dre Guazzelli – Eu acho que o crescimento era natural, porque antes a música eletrônica era restrita a um grupo de pessoas e, hoje, ela popularizou muito mais. Os estilos de música eletrônica aumentaram bastante e fazer e ter o sonho de ser DJ também bateu nesta na cabeça das pessoas e incentivou o crescimento. O ofício de DJ agora ser entendido como fonte de renda também é um termômetro claro da parada de popularização do rolê. O Alok, seja bom ou seja ruim, é fato de que ele ajudou a popularizar todo o rolê. Era natural, não tem jeito!

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