Marvvila: com apoio do público feminino e dos internautas, sambista brilha nas redes
Foto: Guto Costa
Ela é linda, canta muito e vive em um mundo dominado pelos homens: o pagode. Marvvila, 21 anos, tem uma força interna só dela e encanta quando solta a voz. Se foi fácil? Não! Mas ela ganhou dos internautas e do público feminino nas rodas de samba o apoio que precisava para tocar em frente.
Antes mesmo de se tornar uma cantora conhecida, já brilhava no YouTube e no Facebook cantando com parceiros músicos e compositores com vídeos caseiros. Começava aí uma brilhante história entre a artista e os seus seguidores – e dos que passaram a segui-la -, que apreciaram sua potência vocal. Natural de Bento Ribeiro, subúrbio do Rio de Janeiro, ela estreia na gravadora Warner Music com a música “Dizendo por Dizer”. Romântica e com uma pegada gostosa, a música já promete ser hit, ainda mais depois que ela gravou uma participação no EP “Numanice”, trabalho de pagode de Ludmilla, com quem fez duas lives também. Aliás, foi de Ludmilla que ela ouviu que tinha que se manter no gênero. “Marvvila, você brilha no pagode. Então vamos gravar comigo no EP de pagode”, disse Ludmilla. “Foi uma chance de Deus, mesmo, de eu voltar com esse peso e essa força para algo que eu amo”, conta Marvvila.
Leia a seguir íntegra da entrevista de RG com a sambista.
Como você tem se virado na pandemia?
No começo eu fiquei com aquele tediozinho, sem saber o que fazer, meio triste, mas depois eu comecei a ver de outra forma, então passei a ouvir mais coisas nova, mais referências, então a pandemia serviu muito para isso.
Eu tenho passado a pandemia com um amigo meu compositor, o BG, a gente fica muito junto, fazendo música nova, eu coloco a voz guia. Trabalhando.
Já trabalhou com outras coisas?
Eu nunca trabalhei nada de nada, mas sempre ajudei muito a minha mãe. Eu sempre me vi na música. Eu não tinha muita oportunidade, mas quando apareceu eu me joguei.
Como você se descobre cantora?
Eu comecei a cantar com cinco anos de idade na igreja. Na minha família ninguém toca nada, ninguém canta, não tem artistas, mas meus pais sempre me apoiaram muito. Então eu posso dizer que a Marvvila cantora nasceu na igreja.
Era uma brincadeira, mas meus pais vendo que eu tinha futuro, me apoiaram. Eu cantava por amor, nunca ganhei dinheiro com isso, cantava em algumas festas e tal.
E como foi o “The Voice”?
Em 2016, quando eu estava para fazer 17 anos, foi que família, amigos, colocaram aquela pilha para eu tentar o “The Voice”, embora eu achasse que era zero chance de conseguir. Eu era muito tímida, ainda sou, e não tinha um preparo, pois só cantava na igreja, festas, na escola, então eu não tinha muita expectativa. Mas quando deu certo no “The Voice” eu comecei a enxergar de outra forma, pensando que poderia, sim, tentar uma carreira profissional.
Aí, foi que de fato eu comecei a fazer uns vídeos de pagode na internet, e os vídeos começaram viralizar, e vários artistas começaram a me chamar. E deu muita repercussão. Quando eu vi, já estava no meio, e a galera que eu admirava estava me mandando mensagem. Para mim foi como um sonho, eu mal conseguia acreditar, porque eu me via tão pequena e depois com o que aconteceu na internet, de repente, eu pensei: dá para eu tentar.
Por que samba e pagode, porque vi que você tem umas coisas pop?
Como eu disse, comecei cantando na igreja, uma coisa mais voltada para o gospel. Na época da escola, quando eu tinha 12, 13 anos, eu tinha aula de música e os meninos levavam cavaquinho e outros instrumentos, tudo voltado para o pagode, e eu comecei a me inteirar desse universo. Eu lembro que eu ouvia muito o Ferrugem, cuja música me foi apresentada por um colega da escola, e eu comecei a me encantar. Ele [Ferrugem] é minha maior referência.
Aí, eu comecei a cantar pagode na escola, era uma coisa mais de descontração, mas eu peguei amor pela coisa toda.
Só com 18 anos eu comecei frequentar os pagodes. Eu queria me identificar com algo que me agradasse. E foi o pagode. Eu fiz um vídeo sem pretensão nenhuma, mas ele viralizou, eu estava, inclusive, cantando uma música do Ferrugem (“Paciência”), e um monte de gente começou a postar no Facebook. E eu apostei no pagode porque eu estava gostando de fazer e as pessoas gostando de ouvir.
E o pop?
Só que por um tempo eu não levei o pagode como minha música porque eu sabia que era um ambiente dominado por homens. Eu me via muito pequena para bater no peito e dizer: “Agora eu vou fazer pagode”. Então eu deixei de lado e fui tentar outras coisas. E muita gente na internet começou a me criticar, dizendo “o que você fez”? E eu passei a entender que eu deixara de lado algo que eu amava por medo de a galera não aceitar pelo fato de seu ser uma mulher. Mas na verdade as pessoas já tinham abraçado a ideia.
Foi um conflito, porque eu queria voltar para o pagode, mas não sabia como fazer, porque eu havia gravado outras coisas. De qualquer forma eu não parava de fazer meus vídeos em casa cantando pagode.
E como surge a Ludmilla na sua vida?
Foi quando a Ludmilla me chamou para fazer parte do EP (“Numanice”) dela de pagode, ela disse: “Marvvila, você brilha no pagode. Então vamos gravar comigo no EP de pagode”. Foi uma chance de Deus, mesmo, de eu voltar com esse peso e essa força para algo que eu amo.
Como foi fazer a live com ela, você ficou nervosa?
Eu fiquei muito nervosa. Eu já tenho um pouco de timidez quando chego em algum lugar para cantar, dá aquele frio na barriga, mas a gente tenta manobrar. Principalmente na primeira live com ela – porque na segunda eu já estava mais tranquila -, com aquele palco na piscina, aquela grandiosidade toda, com look de artista, e eu morrendo de medo de cair na água. Eu estava cantando parada, travada, com muito medo. Mas quando eu vi a resposta da live, tudo bombando, as pessoas compartilhando a música, meu nome nos trends do Twitter, pensei: “Caraca, meu Deus”!
Quais são suas referências, além do Ferrugem?
Eu sou uma pessoa muito eclética, eu acordo cada dia com um humor diferente, então escuto de tudo. Uma grande referência que eu tenho é a Beyoncé, a gente se inspira, não tem jeito, na vida, o vocal, tudo. O Ferrugem veio quando eu era muito nova, então ele virou um ídolo, de querer cantar tudo dele. Outra referência é a Alcione, de mulher do samba foi a que mais me inspirou, aquela força, aquele empoderamento que ela tem. Tanto que quando eu gravei meu primeiro vídeo, as pessoas começaram a falar que eu seria uma nova Alcione. E eu pensei, nossa, estão me comparando à Alcione, isso é incrível. Marília Mendonça também é muito minha referência, de ser essa força da mulher no sertanejo. Porque quando ela chegou não tinha ainda uma mulher que representasse o gênero com essa força. Do Péricles também eu sou muito fã. É uma mistura de pessoas que eu me inspiro muito para cantar. Tem a Jovelina, Dona Ivone Lara.
Você compõe também?
Eu já escrevi algumas coisas, mas ainda não viraram músicas. Eu não me considero uma compositora de mão cheia porque eu convivo com o meu amigo BG, que é tão surreal, ele vai no quarto, daqui alguns minutos ele volta com uma música. Então eu acabo não me considerando, porque ele é demais. E quanto a instrumento, eu dou uma “arranhada” no violão. Tem até uns vidozinhos que eu faço, às vezes, com o violão.
Como é essa estreia na Warner com “Dizendo por Dizer”?
Para mim é a realização de um sonho. Eu já acompanhava a Warner que já tem em seu casting artistas que eu admiro. Para mim era um sonho bem distante. Eu sempre fui de não criar muita expectativa da coisas por achar que eu nunca ia conseguir. E quando a gente concretizou que íamos assinar, foi bem no meio da pandemia, fizemos por live, foi bem surreal. O jeito que eles acreditaram em mim, me abraçaram, me fez também acreditar. E eles me deixaram muito livre para mostrar o que eu já amava fazer.
O mundo do pagode é bem masculino, como você encara esse desafio de ser um nome forte nesse universo?
Hoje eu encaro com mais garra, vou fazer, é isso o que eu gosto e pronto. Mas no começo eu tinha uma pouco de receio. O BG foi o primeiro a me abraçar na causa. No começo eu vi que tinha um certo preconceito de como mulher subir ao palco. As pessoas olhavam e pensavam: “o que essa menina vai fazer no palco?”, por ser uma parada muito predominante de homens. Só que o público do pagode tem muita mulher, e as mulheres e os homens gostavam, e havia aceitação. Foi quando de fato eu amadureci. Porque muitas mulheres vinham falar comigo, vibravam com aquilo que tinham visto, e homens também, então rolou uma aceitação geral.
Você acha que esses dois públicos, o feminino e os internautas, são uma grande força na sua carreira?
Com certeza. Tanto que nas minhas redes, no Instagram, o maior público é feminino. E chegam muitas mensagens de mulheres que cantam pagode, agradecendo, falando que eu sou uma força para o gênero, porque não tem mulher fazendo isso. Mas até tem, eu conheço muitas que estão na mesma luta que eu, são maravilhosas, justamente para dar voz àquelas que ainda não tiveram oportunidade.
Já a internet, para mim, foi uma coisa sensacional. Eu tive a força do “The Voice”, na TV, que foi incrível. Só que depois, a internet veio assim de uma forma muito louca. Vários artistas que eu admirava passaram a me escrever, dizendo: “você é demais, parabéns pelo seu trabalho”. Os caras mesmo do pagode me escreveram. Foi demais. A força da internet foi muito importante porque tem uma naturalidade. Você joga um vídeo caseiro e as pessoas se identificam.
Foto: Guto Costa
Tem algum artista que você gostaria de gravar ou cantar junto?
Ah, eu tenho uma listinha de pessoas que eu admiro. O Ferrugem é um que eu gostaria de gravar. Com a Marília Mendonça eu gostaria muito de unir essa força de gêneros, pagode e sertanejo, eu já consigo idealizar tudo, sonhar com isso. Uma mulher incrível no sertanejo e uma menina no pagode. Se ela me conhecer, quem sabe, né? Tem uma galera, o Péricles, a Alcione, eu acho que eu ia ficar muito nervosa se eu cantasse com ela um dia.
Quais são os próximos projetos?
Agora nós estamos a todo vapor com “Dizendo por Dizer”, mostrando ao máximo e estamos recebendo um feedback muito bom. Eu já gravei uma outra música, “Me Perdoa”, do BG, cuja composição é dele, do Thiaguinho e do Ferrugem. Estou muito realizada também por gravar uma música do Thiaguinho, que para mim é um exemplo no mundo do samba, do pagode. Já estamos com outras músicas em vista para lançar um EP.
E como você cuida da beleza?
Eu não tenho um ritual, não, eu gosto de ser camaleão. Hoje eu acordei com o meu [cabelo] black, outro dia quero colocar uma trança bem grande, ou usar uma cor diferente. Eu sou assim. Agora eu tenho uma pessoa que cuida do meu cabelo. Eu cresci com aquela coisa de você ter que ter o cabelo baixo. Graças a Deus a gente vive em uma época em que as pessoas vivem a aceitação. E a gente pode usar o cabelo do jeito que quiser, se vestir como quiser também.