Foto: Fábio H. Mendes
Com o isolamento social e uma necessidade constante de humor para amenizar o momento que estamos vivendo, as humoristas Andrezza Abreu, Anita Chaves, Karina Ramil e Lorena Comparato, que juntas formam a Cia de 4, criaram no Instagram um quadro semanal chamado “Jornal das 4”. Nele, as integrantes da Cia de 4 comentam as principais notícias da semana com um humor ácido, despretensioso, rápido e com embasamento.
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A atuação, roteiro e seleção das notícias são feitos por elas mesmas, que sempre buscam as informações fundamentais para a população e ao mesmo tempo em que consigam dar risada dos acontecimentos. “Como a situação política do País está cada vez mais bizarra, se torna mais fácil extrair o humor ácido para comentar matérias assim. A postura de certos membros do governo parece um filme dos “Trapalhões”. Algumas notícias também são tão surreais, que são engraçadas por si só, tipo a nuvem de gafanhotos, que apesar de ter sido uma ameaça séria, não tem como não achar no mínimo curioso!”, comentam.
Lorena Comparato – Foto: Fábio H. Mendes
Como o programa foi criado e é gravado durante a pandemia, com cada uma na sua casa, os desafios para o resultado final são grandes. Muito colaborativas, as meninas estavam acostumadas a criar sempre juntas, porém a distância não está impedindo ideias de surgirem. “As ideias fluem e vamos nos ajudando a encontrar o tom da interpretação ou até como fazer uma piada funcionar melhor. Mas a tecnologia tem nos ajudado bastante. Cada uma grava a sua parte e manda o que gostou para o grupo que aí dá sua opinião, dá um toque pra ver o que pode melhorar”, pontuam.
Com o novo quadro as meninas esperam trazer um humor de qualidade, ajudando as pessoas a superarem e suportarem esse período de isolamento tão necessário e ao mesmo tempo tão longo, assim como os acontecimentos políticos e sociais. O “Jornal das 4” pode ser encontrado no Instagram da Cia de 4 (@ciade4), sempre aos sábados, às 16h, pelo IGTV.
RG conversou com as quatro humoristas em um papo descontraído e gostoso. Leia íntegra da entrevista a seguir:
Como se conheceram?
Ah, faz bastante tempo isso (risos). A Cia de 4 Mulheres começou há 9 anos, inicialmente de uma forma despretensiosa. A Anita e Karina estudavam na mesma escola, e conheceram a Lorena em cursos de teatro. Paralelamente, a Andrezza entrou para a turma da Anita no Tablado, que a apresentou pra Karina, e através delas conheceu a Lorena.
Na época, todas dividíamos o mesmo sentimento de não aguentar mais ver as peças sendo protagonizadas por homens e todos os papéis legais serem masculinos. Só nos restava competir pelo único papel feminino maior, que geralmente se resumia à mocinha ou à bonita. Nós conversávamos sobre isso, sobre essa insatisfação.
Quando nos juntamos, foi justamente para poder criar os papéis que queríamos interpretar, fazer peças e projetos que tivessem mais mulheres na equipe e mais personagens femininos interessantes com suas próprias narrativas, antes mesmo de sabermos que já estávamos falando de feminismo.
Começamos a participar de festivais de esquetes com cenas que escrevíamos e interpretávamos. Até que na nossa terceira participação no Festival de Nacional Esquetes Universitário, o Festu, para nossa surpresa, vencemos o festival! Com o prêmio, montamos “Ricardo”, nossa primeira peça autoral com duas temporadas de muito sucesso no Rio de Janeiro e participação no Festival de Curitiba, escrita pela Cia de 4 e dirigida por Débora Lamm e Carolina Pismel. Foi então aí que a Cia de 4 se profissionalizou.
Andrezza Abreu – Foto: Divulgação
Como surgiu a ideia do programa?
O “E! NO FILTER WKND” surgiu de um encontro. O programa nos foi apresentado através do diretor e produtor Guilherme LaMotta durante o Rio2C (evento do mercado audiovisual). O Canal E! queria fazer pílulas de humor para passar nos intervalos dos filmes exibidos na grade – um projeto superousado e diferente para o canal, que até então sempre trabalhou com realities, e não tinha nada de ficção na programação. O Gui apresentou a Cia de 4 para o Canal E! como atrizes e roteiristas e eles acreditaram na nossa voz. O mais legal desse programa para nós foi poder trazer a nossa experiência do teatro, em que tudo é possível, nos roteiros e na atuação. Foi o primeiro programa de TV da Cia de 4 e interpretamos mais de 160 personagens, o que é extremamente divertido para qualquer ator. O resultado na telinha foi tão positivo que o Canal E! quis realizar a segunda temporada, o que nos deixou em êxtase.
Já o “Jornal das 4” surgiu pois há algum tempo queríamos fazer um programa em um formato rápido e despretensioso, unindo informação e humor. Nesse momento de pandemia, quarentena e distanciamento social, as duas coisas se tornaram quase cruciais para sobrevivência humana. Naturalmente, já compartilhávamos entre nós, as notícias da semana, que de tão absurdas pareciam piada e brincávamos com isso. A Andrezza teve a ideia e impulsionou o “Jornal das 4” (“J4”, para os íntimos): um jornal, conforme é a linguagem das redes sociais, que brinca de maneira tosca e traz o humor ácido da Cia no olhar para as notícias.
Resolvemos trabalhar a partir da limitação “do fazer em casa sem nenhum aparato técnico”, usando o tempo que tínhamos, para realizar um produto 100% feito pela Cia. E o retorno do público tem sido gratificante.
Por que humor?
O humor é natural para nós. A comédia surgiu desde a primeira cena que criamos, a visão crítica e bem humorada de enxergar o mundo certamente nos uniu. Olhar para uma situação incômoda e fazer uma análise que gera riso é levar a reflexão de uma maneira leve para o cotidiano.
E como somos criativas, já criamos projetos em outros gêneros também, mas acreditamos que a linguagem ácida da “dramédia” sempre aparece com grande força nas nossas urgências. Brincar com as nuances da realidade traz mais vigor as nossas obras.
Como vocês têm feito para roteirizar na pandemia? Como é a dinâmica? Fazem reunião de pauta por Zoom ou outro aplicativo?
Nessa quarentena, lançamos dois projetos: “Zodíaca de Bolso: Signos na Quarentena” (em parceria com o Hysteria) e o “Jornal das 4”. Já temos uma dinâmica de trabalho de mesa bem estipulada desde antes da pandemia, então basicamente a adequamos a esse novo formato. Fazemos reunião via Zoom para discutir o projeto e fazer um brainstorm de ideias. Em seguida cada uma desenvolve uma parte do roteiro individualmente e volta para a reunião para escolhermos as melhores e montar o roteiro final. Aí cada uma grava na sua própria casa, com seus recursos, envia para o grupo e damos o OK. No “Zodíacas”, enviávamos o texto para as três atrizes convidadas e as deixávamos livres para improvisar, criar em cima etc. Depois, elas nos mandavam e dávamos um feedback.
Já temos nove anos de companhia, então já temos sintonia, alinhamento e química. Fica mais fácil assim.
Como dividem o que vai ser feito por cada uma de vocês?
Sempre dividimos tudo igualmente, roteiros, atuação, e vamos fazendo rodízios de quem cuida do quê. Por exemplo, cada uma cuida das redes sociais por um mês e vamos nos revezando. Quando é pra ver quem vai fazer qual personagem, vai muito do que cada atriz quer fazer ou quem achamos que tem mais a pegada daquele papel. Por exemplo, no “E! No Filter WKND”, a gente escrevia os roteiros e Anita falava: “Eu quero fazer essa personagem”, ou a Andrezza dizia: “Eu escrevi pensando na Lorena”, ou todas concordavam que a personagem era a cara da Karina, essas coisas.
No “Jornal das 4”, pesquisamos notícias e escrevemos piadas individualmente. Depois, selecionamos as melhores juntas. Cada uma filma a sua parte. Quando rola uma dúvida, a gente manda no grupo para decidirmos juntas qual a melhor opção. Anita e Karina editam, Andrezza faz as aberturas e a Lorena posta.
Karina Ramil – Foto: Fábio H. Mendes
Geralmente é muito fluido porque não escondemos nossas vontades e não vontades. Quem quer fazer, fala, e quem não quer, também fala. Além disso, quando tem uma função mais burocrática, nos revezamos e todo mundo tenta passar por tudo para não ficar pesado para ninguém.
O legal é que como tivemos experiências diferentes em nossas vidas profissionais individuais, vamos complementando e fazendo a Cia crescer com isso também.
Tem algum personagem mais recorrente?
Temos vários, nos apaixonamos pelas personagens e não largamos a mão! No “E! No filter WKND” trouxemos de volta uma personagem inspirada em outra da nossa peça “Ricardo”, a Isabel (Anita). Criamos na primeira temporada vários personagens fixos, que apareceram em várias pílulas e, lógico, voltaram na segunda: Mano (Lorena), Gey (Andrezza), Caipira (Andrezza), Barbie Fascista (Karina), dentre vários outros. E alguns personagens que nem tinham relevância na 1ª temporada, voltaram na 2ª porque, na hora de filmar, ficaram hilários.
Queremos muito fazer novas coisas com essas personagens e pensamos em levá-los para o teatro também.
Como tem sido a receptividade das pessoas?
Tem sido incrível! Recebemos muitas mensagens carinhosas de pessoas que assistem ao “E! No Filter WKND”, curtem nosso trabalho e quando entram no nosso perfil, vêem o jornal! É bem bacana saber que tem gente que se inspira em nós, tem desejo de montar uma companhia, realizar um trabalho. E claro que amamos quando a pessoa se diverte.
Política é o assunto mais presente? Se sim, por quê?
Tudo é política. Até a água que tomamos é política. Morar no Brasil e não pensar sobre o que estamos vivendo diariamente é quase impossível e, como somos inspiradas pelo que está ao nosso redor, naturalmente o assunto sempre vem à tona.
O “J4″ nasceu da necessidade de expressar um olhar bem humorado sobre o difícil cenário atual. E é impressionante como não faltam matérias, toda semana tem notícias marcantes. O difícil é contornar quando o assunto é muito triste, mas sempre criticamos a causa do problema.
Pretendem fazer um espetáculo posteriormente, com o fim da pandemia?
Com certeza! Estamos todas morrendo de saudades dos palcos, com abstinência de fazer uma peça e estar em cartaz. Acreditamos muito na força do teatro e queremos contribuir de qualquer jeito para essa arte no mundo pós-pandemia, pois foi de onde viemos, onde nos conhecemos, é a nossa essência.
Sabemos que o teatro nunca vai morrer! É uma arte milenar, que sobreviveu ao rádio, cinema, TV… Só precisamos ter paciência para voltar na hora certa. Temos alguns projetos e uma peça pronta para montar, mas estamos de acordo com a total necessidade do isolamento.
Há planos de um canal no YouTube?
Esse é um assunto recorrente nas conversas da Cia. Temos o desejo de montar um Canal no Youtube, porém sabemos todo o cuidado e demanda que esse trabalho exige. E como cada vez surgem novos projetos que estamos envolvidas, ainda não conseguimos dedicar a devida atenção e colocar a ideia em prática. Mas enquanto isso, estamos engajadas colocando todo o nosso conteúdo audiovisual no nosso IGTV que vocês podem ver no @ciade4 (www.instagram.com/ciade4). Lá tem pílulas de humor que fizemos para o “E! No Filter WKND”, todas as edições do “Jornal das 4”, além dos episódios do Zodíacas de Bolso: Signos na Quarentena” e dicas de conteúdos para arrancar boas risadas.
Anita Chaves – Foto: Divulgação
Vocês trabalham com outras coisas além do programa?
Sim, estamos sempre desenvolvendo alguma coisa nova. Nos consideramos um núcleo criativo e trabalhamos desenvolvendo projetos artísticos para as mais diversas plataformas. Além das duas temporadas na TV do “E! No Filter WKND” no canal E!, criamos, escrevemos e atuamos no “Prato Frio”, o primeiro podcast de ficção brasileiro realizado pelo Spotify Studios em parceria com o Hysteria etc. Hoje existem vários podcasts, mas, há dois anos, a gente nem sabia se era possível fazer um podcast de ficção e comédia. Os 12 episódios de histórias cômicas sobre vingança estão disponíveis gratuitamente no Spotify.
E claro, a gente não para e já estamos desenvolvendo novos projetos que ainda não podemos falar!
Para além das nossas experiências como Cia, temos também carreiras como atrizes e roteiristas em paralelo. As quatros já participaram de novelas, séries e programas como atrizes e roteiristas. Andrezza fez participações em programas e novelas da Globo, Comedy Central, Multishow e Record, como “RockStory” e “Brasil a Bordo”, e no canal de internet “Parafernalha”. Fez diversas peças de teatro e atuou em publicidades, além de ser dubladora. Ela e Anita se formaram na UFF no Rio de Janeiro. Anita já atuou em filmes e séries, como “Juacas, Cadelas e Ratoeira”. Fez espetáculos de teatro e foi assistente de showrunner de Carina Schulze nas séries “Gaby Estrella” e “Juacas”. Foi colaboradora de roteiros em “Sem Volta” e roteirista da série “Seis na Ilha”. Karina é integrante do “Zorra”, na Globo, e foi integrante do “Porta dos Fundos” por quatro anos. Ela é formada em artes cênicas, fez diversos espetáculos de teatro e filmes como “Auto da Boa Mentira”, “Meu Tio Quase Perfeito” e “Boca de Ouro”. Recentemente as três estiveram em um espetáculo chamado “Bonde”. Lorena participou de séries e novelas na Globo, Netflix, Amazon, Comedy Central, Fox Premium e Universal Channel como “Pé Na Cova”, “Impuros e Homens?”. Formada na PUC-Rio, atuou em peças de teatros e filmes que lhe renderam prêmios, como “Boca de Ouro”. Atualmente faz mestrado na Escola de Artes Célia Helena.
Como têm passado a quarentena?
Não imaginávamos que duraria tanto tempo, cansativo né? Porém, somos gratas pelo imenso privilégio de poder ficar em casa nos cuidando. Aproveitamos para trabalhar em novos projetos para esse momento e também para o pós-pandemia. Vimos que, na quarentena, as pessoas precisavam se distrair e resolvemos criar conteúdo para ajudar a passar o tempo de forma mais leve. Logo, veio o convite da Isabel de Luca, do Hysteria etc., para fazermos o “Zodíaca de Bolso: Signos na Quarentena”. Com a ajuda da astróloga Isabella Heine, criamos cerca de 60 situações pensando como cada signo estava se adaptando à quarentena, de forma engraçada, e até um pouco absurda. Além da Cia de 4, o elenco foi composto pelas atrizes Natália Balbino, Sol Miranda e Priscila Maria. O retorno foi muito legal, as pessoas comentaram muito se identificando (com as situações mais doidas), marcando conhecides etc.
Porém, não dá pra se distrair tanto assim porque o que tá acontecendo no País – na esfera política, social, cultural etc. – é BIZARRO, ABSURDO e chama a atenção. Algumas notícias não se sabe se ri, ou se chora. Então lançamos o “Jornal das 4”, trazendo uma análise bem humorada e ácida, típica da Cia de 4, ao reportar as principais notícias! Cada uma tem seu papel fundamental ao informar: as âncoras seriíssimas, Karina e Andrezza; a correspondente internacional que muda de país em 2 segundos, Lorena; e a garota do tempo perdido, Anita. Pode confiar no “J4”, o único Jornal Idôneo desse País!