Top

Os desafios pós-coronavírus de quem viaja o Brasil e o mundo para fotografar

Clique do fotógrafo no Centro de São Paulo, já na quarentena (Foto: Marcelo Oséas)

Por Marcelo Oséas*

Acordar como fotógrafo durante a crise do novo coronavírus se resume em enfrentar uma nova realidade. Viagens canceladas ou totalmente transformadas, aceleração da presença online, novos formatos de trabalho. Eu, particularmente, prefiro não olhar para trás, pois certamente aquele futuro que eu tinha em mente já não está próximo do mesmo que chegará.

SIGA O RG NO INSTAGRAM

A fórmula que encontro e recomendo é a do cuidado e da avaliação. Dentro da fotografia, por exemplo, aqueles que viajam pelo Brasil e o mundo para fotografar todo o cuidado é necessário, seja para se proteger, proteger a nossa comunidade e, principalmente, quem nós visitamos.

Falando em viagens, essa é a primeira grande mudança da vida de um fotógrafo. Durante muito tempo, especialmente enquanto não houver vacina, quem pretende viajar precisa tomar todas as precauções possíveis: isolamento social, planejamento, cuidado. Isso sem contar o tempo. Antes, viajar estava cada vez mais rápido, mais online, mais “smart”. Agora, o tempo de viajar é outro.

O momento da fotografia também está diferente. Eu acredito completamente que para se fazer um click é preciso estabelecer uma relação com quem estamos fotografando. Não importa o segmento. Dedicar um bom tempo para conhecer e entender quem (ou o quê) vamos fotografar é essencial para que uma imagem fique gravada em nossa memória. É claro que, especialmente no Brasil, encontramos formas mais variadas e cada vez mais criativas para nos conectarmos uns aos outros, mas o primeiro instinto é o medo.

Vivemos uma realidade em que o medo está constantemente presente e essa é mais uma barreira a ser quebrada na fotografia. Antes, grande parte do esforço para se conectar com quem retratamos era superar a barreira do desconhecimento. Agora, primeiro vencemos o medo (com cuidado, respeito e diálogo), em seguida voltamos à realidade. E às velhas barreiras que tornam a fotografia uma arte extremamente sedutora.

A frequência dos trabalhos e as equipes também estão cada vez menores. Os orçamentos, como o de todo mundo, foram bastante reduzidos e hoje precisamos continuar clicando, pois nosso mundo precisa sempre de imagens, mas de forma mais direta e enxuta. Muita gente da indústria fotográfica e do cinema, que auxilia para que as coisas aconteçam, está se reinventando a cada dia. Até mesmo nós, fotógrafos, encontramos nos cursos e conteúdo online, por exemplo, uma forma de continuar lecionando e compartilhando nossa visão e nossa arte pelo mundo.

Mas, nem tudo está perdido ou transformado. Mesmo com o medo, com as máscaras, barreiras sanitárias, orçamentos mais enxutos, o elemento principal continua a existir. Arrisco dizer que ele está mais forte do que nunca: a vontade de se conectar uns com os outros. Essa é a grande mágica da fotografia e agora, que vivemos semi ou totalmente isolados, poder retratar alguém se resume em um grande encontro humano. Não sei, mas parece que esse novo momento está nos ajudando a deixar de lado muitos filtros. Que bom!


*Fotógrafo autoral, Marcelo é paulistano. Estudou Ciências Econômicas na USP, onde atuou por nove anos em grandes empresas e no terceiro setor. Em 2012, migrou para a fotografia e não largou mais.

Seus registros captam expressões artísticas originárias da América Latina, como culturas ancestrais (indígena, caiçara e andina). Em seu campo de pesquisa estão os processos de assimilação da sociedade de consumo dos elementos culturais nativos, com sua consequente integração ou eliminação.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Site RG.

Mais de Cultura