Foto: Nickolas Muray
Por Marcos Tenório
Nos últimos meses tudo mudou em nossas rotinas, desde as aulas, o trabalho e até a forma de comemorar aniversários. Precisamos parar um pouco para nos protegermos e isso, em alguns casos serviu de alimento para a criatividade de algumas pessoas que produziram, com ou sem a temática da quarentena, música, arte, audiovisual e fotografia.
A quarentena é um momento de introspecção e de se voltar para atividades que, muitas vezes, deixamos para depois, é um momento de dedicarmos mais tempo a nós mesmos e isso pode abrir as portas para a criatividade.
A gravidade foi descoberta por Isaac Newton em um momento de isolamento social causado pela grande praga no século XVII. Simone de Beauvoir escreveu a sua única peça “Les Bouches Inutiles” durante a ocupação da França pelos nazistas, enquanto Picasso mergulhou em um processo de criação artística bastante intenso.
Motivada pela sua dificuldade de mobilidade causada por doenças e um acidente, Frida Kahlo, em cima de uma cama, transformou-se em uma grande pintora reconhecida mundialmente por seus autorretratos autênticos e fortes.
Diferentemente desses grandes nomes do passado, hoje contamos com recursos tecnológicos que facilitam bastante a conexão entre pessoas e a possibilidade de criar projetos colaborativos intermediados pelos celulares, computadores e outros gadgets.
Adriana Calcanhotto – Foto: Leo Aversa
Um dos principais fenômenos desse período foi criado pelos cantores, todas as semanas, vimos surgir milhares de lives musicais que ofereciam um alento para nossos corações nos mais diferentes estilos musicais. Deste a tocante e solitária apresentação de Andrea Bocelli, em Milão, até os inúmeros (e recordistas de audiência) sertanejos que moveram o Brasil ou as batidas eletrônicas do DJ Alok.
Adriana Calcanhotto, sempre antenada e adepta de uma discrição e um minimalismo bem característicos, escreveu, produziu, gravou, filmou e lançou um álbum baseado em suas experiências da quarentena, durante a quarentena. Intitulado de “Só”, o álbum viaja por temáticas como solidão, limitação de movimentos, silêncio, tédio e até atividades para fazer em casa.
A artista brinca com ritmos impensáveis em sua discografia, como o funk “Bunda lê lê” em parceria com Dennis DJ, que traz por baixo de alguns trocadilhos e críticas ao nosso momento atual, sugestões de coisas bem interessantes para fazer na quarentena.
Na educação, professores têm se desdobrado para reinventar a sala de aula, desde o ensino fundamental até o ensino superior a criatividade tem feito parte do cotidiano das aulas remotas.
A reinvenção da dinâmica de sala de aula motivou a fotógrafa Marília Orange a propor, em sua disciplina de fotografia, retratar o cotidiano, muitas vezes tedioso da quarentena, pelo olhar dos seus alunos da graduação em publicidade e propaganda em uma universidade no Recife.
Ela conta que “com a chegada da pandemia da Covid-19 ao Brasil e o início das aulas remotas, busquei refletir sobre o meu papel como professora nessa situação. A disciplina entraria no momento de contato mais intenso com as câmeras fotográficas profissionais, como eu poderia substituir isso? Como poderia ajudar meus alunos para além do conteúdo? O que poderia fazer para buscar suportarmos juntos esse momento? Imediatamente me veio à mente o Diário da Quarentena. Os alunos, com seus telefones celulares, passariam a registrar suas rotinas a partir do conhecimento construído e compartilhado em sala de aula”.
O resultado, além do conhecimento em técnicas de fotografia, configurações de exposição e composição fotográfica, foi um registro de luzes ângulos, planos e enquadramentos diferentes dos usuais em uma recriação do espaço residencial e da vizinhança visível pela janela sob uma nova ótica poética e sensível do isolamento social. O projeto funcionou muito bem e Marília tem planos de se tornar um um fotolivro em breve.
Foto: Bruna Bezerro
Foto: Fernando Xavier
Foto: Maria Eduarda Lima
O Masp, dentre tantos outros museus e galerias de arte mundo afora, precisou se reinventar para chegar às casas das pessoas, já que suas portas estão fechadas temporariamente. Todas as terças o perfil do museu indica uma obra do seu acervo para que crianças e adultos as desenhem e imprimam suas próprias expressões em famosas pinturas como a “Composição (Figura Só)”, de Tarsila do Amaral, entre várias outras.
Foto: Divulgação/Masp
O resultado tem sido bastante interessante e participativo, quem se interessar, basta seguir o perfil do museu no Instagram @masp e aguardar, todas as terças, o novo desafio lançado e, quem sabe, ganhar um Vale Amigo para poder visitar o museu gratuitamente assim que possível. Além disso, há uma programação diária com conteúdos voltados para a arte e educação, vale a visita sempre!
Graças às possibilidade da comunicação, outros encontros vêm sendo possíveis como os programas de entrevistas como o “Conversa com Bial“, que recentemente estreou a nova temporada em comemoração aos 70 anos da TV brasileira e já recebeu nomes como Xuxa, William Bonner, Glória Maria, Anitta, entre outros grandes nomes que passaram pela história da televisão. É transmitido nas madrugadas de sábado na TV Globo e também disponível no serviço de streaming Globoplay.
Foto: Divulgação
No canal pago Multishow, Tatá Werneck convidou o seu marido, Rafael Vitti, para entrevistarem outros casais no Lady and Bofe, spin-off do seu já bem estabelecido e divertido “Lady Night”. Com seu humor rápido como uma bala, Tatá faz perguntas sobre convivência e até desentendimentos dos casais durante a quarentena. Os episódios são bem curtos e vão ao ar de segunda a quinta, às 21:45.
A quarentena tem sido bastante restritiva e pode ter tirado o direito de ir e vir de muita gente, mas garanto que a criatividade segue em plena atividade e, como sempre, buscando sempre meios de se expressar seja digital ou analogicamente.
Não sabemos ainda quanto tempo teremos que ficar em casa, mas sabemos que de tédio não sofreremos com tanta produção despontando por todos os lados.
Mas conta, que talentos você descobriu ou investiu mais tempo recentemente?
Marcos Tenório é Designer, Sócio da Kalulu Design&Comunicação, mestre em Design de Artefatos Digitais pela Universidade Federal de Pernambuco e Professor na UNIFG.
Há um ano eu escrevi a primeira coluna aqui no Site RG e, por motivos de: “preciso terminar meu mestrado”, pedi um tempo para me dedicar aos estudos. Mestrado finalizado, mundo de cabeça para baixo e cá estou aqui novamente pensando em assuntos que pareçam interessantes de serem discutidos com a verve do Design, Tecnologia e até Comportamento, às vezes.