Por Miriam Spritzer
No mais novo filme de Pedro Almodóvar, “Dor e Glória”, qualquer semelhança não é mera coincidência. O aclamado diretor leva ao público uma quase autobiografia sua, claro que seguindo o seu estilo fantasioso, exagerado, e com alguns toques de melodrama e comédia. O filme conta a história de um diretor de cinema, Salvador Mallo, interpretado por Antonio Banderas, que vive uma fase de depressão e limitação física, por conta de problemas de saúde decorrentes da meia idade.
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Ao se reencontrar com o ator principal de um de seus mais importantes filmes após 20 anos, Mallo se depara com as dores e glórias de sua carreira e sua vida pessoal. A vida de Mallo é mostrada ao público por meio de flashbacks desde sua infância ao lado da mãe, interpretada por Penélope Cruz, até suas reflexões sobre o presente, sobre sua vida em diálogos e seus textos de trabalho, fazendo um constante contraste entre o passado e o presente do personagem. Na mistura das histórias de Malo está muito sobre a vida do próprio Almodóvar.
Mas, claro, sua vida pessoal é apenas uma base para contar a história. Apesar das semelhanças, o diretor explica que sua vida é muito mais pudica e menos dramática. Afinal, Almodóvar não cansa de dizer que, para ele, o cinema é uma representação da vida, não quer dizem que seus filmes são reais ou naturais.
Na estreia de “Dor e Glória” durante o New York Film Festival, a nossa correspondente Miriam Spritzer entrevistou com exclusividade Almodóvar. Leia a seguir íntegra da entrevista concedida ao RG.
Este filme é um tanto autobiográfico. Qual foi o maior desafio para você em contar esta história?
Com este filme, quando descobri sobre o que era a história, que a minha presença nela era realmente muito importante. E que eu, como referência, como personagem, seria muito importante para o Antonio (Banderas), fiquei na dúvida em um primeiro momento. Porque eu não sabia se queria isso. Me perguntei: estou realmente disposto a me mostrar de um modo tão aberto e exposto? Eu que sou uma pessoa muito poderosa e de certa forma privada. E uma vez que venci essa primeira pergunta, não houve mais dificuldade para todo o resto.
Esta proximidade com o filme, com a história, influenciava o seu trabalho na direção?
Há um momento em que se estabelece uma distância com o filme. Chega um momento em que você está funcionando como um diretor dirigindo um ator que interpreta um papel qualquer que seja. Eu me esqueci durante as filmagens. Me esqueci completamente enquanto rodávamos que grande parte da minha vida estava exposta no filme.
Qual foi a maior surpresa com o resultado final do filme?
Bem, é sempre um milagre que um filme saia bom. É um mistério para mim porque alguns saem melhor que outros ou porque algumas histórias conectam melhor do que outras. Neste caso, já havia trabalhado com Antonio (Banderas) e Penélope (Cruz), mas há dois atores principais que eram totalmente novos para mim, Asier Etxeandia e Leonardo Sbaraglia. E isso sempre é um risco, um risco que você tem que correr. Mas você nunca sabe. Então a grande surpresa neste filme foi o modo como todos se conectaram imediatamente com a história, e os dois estão soberbos em seus papéis. Tive muita sorte com eles.
Depois de tantos filmes e anos de trabalho, o que ainda te motiva/inspira a fazer filmes?
A motivação sempre está na realidade, e a realidade é o que escuto, o que leio, o que assisto na televisão, o que acontece na minha própria vida, está em todos os lugares que vejo. Eu creio que o próximo filme será, tenho a impressão, que será baseado em vários contos curtos de uma autora americana, mas ainda não posso dizer seu nome. Estou trabalhando nisso. Te conto mais detalhes em uma próxima.