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Quando uma vida só não é suficiente

Por Marcos Tenório

Estamos experimentando uma revolução no nosso estilo de vida. Inteligência artificial que, além de tantas coisas, tem melhorado a qualidade da nossa alimentação e modificado a nossa vida ao ponto de pensarmos, mais uma vez na história, em viver para sempre.

Os alquimistas do passado que nos perdoem, mas a descoberta do segredo da eternidade parece ter ficado para a nossa geração. Já estamos sendo consideradas a população mais idosa que existiu. Inclusive o número de nascimentos em alguns países é bem menor do que alguns anos atrás.

Pode parecer ficção, mesmo que sempre seja retratada em séries como “Black Mirror” (que assustou muita gente desde a sua estreia), “Westworld” (com questões mais filosóficas sobre o nosso possível futuro com a inteligência artificial) e na mais atual “Years and Years” (que estreou no dia 28 de junho no canal pago HBO e retrata os possíveis acontecimentos que se sucedem de hoje até 2024 no mundo). Mas isso é bem possível e real.

Estamos mais ativos e isso pode ser um retrato do apoio das novas tecnologias que nos motivam a levantar e praticar atividades físicas. Para além dos aplicativos fitness que já falei aqui há algumas semanas, o movimento Biohacking tem como ideal a criação de super humanos a partir da modificação dos corpos (implante de chips embaixo da pele, utilização de suplementos e alimentos) ou utilização de tecnologias externas para melhorar o sono, a força, a visão etc.

Essas e outras ações são parte do transumanismo, que acredita que é possível e desejável alterar a condição humana por meio do uso de novas ou antigas tecnologias para criar uma linhagem de seres humanos superiores. E isso já está se tornando realidade.

Em “Years and Years”, já no primeiro episódio há um momento em que Bethany, a filha deprimida do casal Stephen e Celeste,  já se mostra adepta de modificações corporais para sentir-se melhor. Ela usa um holograma que substitui seu rosto e voz por emojis (ou animojis) na interação com os pais.

Em uma cena mais próxima do final do episódio, confessa aos pais que é Trans…humana e que gostaria que fosse feito o download de seu cérebro pois ela não se sentia parte do corpo que ocupava e gostaria de se transformar em código.

Essa discussão já pode ser vista em “Westworld”, em um episódio que mostrava a tentativa de fazer a mesma coisa em um dos robôs, com o cérebro de um dos sócios do parque temático, dessa vez sem sucesso e cheio de problemas na adaptação ao novo corpo.

O Biohacking, apesar de ter um nome bem atual, não é nada de novo. O ser humano sempre buscou formas de resolver as limitações do nosso corpo, assim como algumas deficiências utilizando melhorias internas ou externas. Desde os sete anos que eu uso óculos para correção de miopia e nem por isso houve uma discussão ética em torno desse tipo de modificação corporal.

Os transumanistas discutem como potencializar essas melhorias e criar uma nova espécie de humanos. Mais forte, mais saudável e com uma visão mais aguçada como, por exemplo, a aplicação de lentes e substâncias que tornam possível a visão de objetos menores a uma distância de 50 metros ou mais.

Nos primeiros minutos do primeiro episódio de “Years and Years”, um dos protagonistas pergunta a um bebê recém-nascido: Se o mundo está ruim agora, como ele será para você daqui a 30 anos? Ou 10 anos? ou 5 anos? Como será?

A resposta da série, pelo menos no primeiro episódio, não é nada animadora. Mas será mesmo que queremos viver mais em um mundo cheio de contrastes e problemas como os ambientais que aumentam a cada dia? Não seria a hora de parar para consertar o nosso planeta, antes de querermos ser eternos?

Marcos Tenório é Designer, Sócio da Kalulu Design&Comunicação, Mestrando em Design de Artefatos Digitais pela Universidade Federal de Pernambuco e professor de Materiais e Tendências em Design de Interiores na Uninassau.

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