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“Nosso objetivo é fazer uma moda que respeite a diversidade”, diz Fióti sobre parceria da Lab com a C&A

A Lab Fantasma, marca dos irmãos Emicida e Fióti, já existe há 10 anos, mas entrou de fato no radar dos fashionistas há dois. O negócio, que começou com roupas de merchandising da carreira musical da dupla, fez barulho na sua estreia no SPFW, em 2014 e, desde então, se tornou pioneira no debate da inclusão e diversidade no meio da moda brasileira.

Agora, a marca dá um passo a mais, fechando uma parceria com a gigante do fast-fashion C&A. Em um evento badalado em São Paulo, em que 1.000 convites foram disponibilizados gratuitamente para fãs dos músicos, eles apresentaram em primeira mão as peças em um desfile que, obviamente, também contou com muita música.

Em um papo com o Site RG, Fióti contou o impacto dessa parceria na marca, como eles chegaram no mercado de moda e os planos para o futuro da Lab Fantasma e da dupla, que está sempre procurando uma forma de inovar. Confira!

O que significa para a Lab Fantasma criar uma parceria com uma marca de fast-fashion tão grande no Brasil?

Na verdade, desde a nossa estreia no SPFW, nosso objetivo já era fechar uma parceria com alguém que pudesse nos ajudar a não só dar visibilidade para as nossas causas e o nosso projeto, mas também conseguir fazer uma moda inclusiva, que respeite a diversidade. E conseguir baratear os meios de produção de uma maneira justa, para que a gente pudesse atender o público que nos segue desde o começo. Esses foram os principais pilares para fechar parceria com a C&A. Foram dois anos de pesquisa no mercado para chegar nisso.

E qual o maior propósito dessa coleção?

Aproveitamos esse momento para exaltar um pouco a nossa trajetória e a do jovem urbano contemporâneo nos últimos 10 anos de Lab. Mergulhamos na nossa história. De todas as coleções dos últimos dois anos, essa é a que você encontra várias referências às nossas músicas, fotos nossas. A gente quis aproveitar uma possibilidade de tornar a Lab mais popular e comunicar a nossa história através da roupa também.

Rolou uma preocupação para manter os preços acessíveis?

A gente não teve problema nenhum na questão do preço, graças a grande gama de lojas da C&A. No Lab, a gente vende muito pelo e-commerce e, então, várias vezes acabamos perdendo a oportunidade de venda, porque o frete sai mais caro do que a peça para uma pessoa que está no Norte ou no Nordeste. É uma coisa que a gente vem ponderando há muito tempo. Mas somos da música, o nosso objetivo não é entrar no varejo para ser uma concorrente. Por isso que fomos atrás dessa parceria. Com a cadeia de produção maior, garantimos preços ótimos.

Ficamos felizes com o resultado e foi uma experiência muito rica também. A C&A é uma companhia enorme, então tivemos receio de como seríamos recebidos, principalmente em termos de liberdade artística, conseguir comunicar não só nas roupas, como também na passarela. Mas tivemos 100% de autonomia, também com responsabilidade.

Como foi feito o casting para o desfile? Podemos esperar um show de diversidade como costuma ser?

Na passarela vamos encontrar pessoas comuns da vida, que não costumamos encontrar em desfiles de moda. A gente sempre faz tudo, não trabalhamos se for de outra forma. Infelizmente, as pessoas não têm a vivência do nosso universo.

Um dos objetivos de fazer o desfile no SPFW era mostrar que as coisas podiam ser de outro jeito, que existia mercado consumidor para aquilo, e que, na verdade, essas pessoas estavam sendo excluídas, como sempre foi. Para gente conseguir provar isso da forma que precisávamos, foi muito importante ter essa autonomia em todo processo.

Precisamos até trocar muitos membros da equipe, porque sempre rolavam piadas non gratas no backstage como modelos ou nossos amigos. Fomos trocando até chegar em uma equipe que respirasse os mesmos valores do que a gente.

Fiquei feliz que a C&A deu essa oportunidade e consegui trabalhar dessa maneira. Espero que eles também tenham aproveitado e saiam maiores desse processo, que essa coleção sirva para discutir internamente também, dentro da companhia.

O Emicida recentemente fez shows na Europa. Existe a ambição de levar a Lab para fora do país também?

Temos o interesse, mas é um outro business plan. Um passo de cada vez. O nosso objetivo maior nesses últimos dois anos de reposicionamento da marca, desde a guinada no SPFW, era chegar nesse momento aqui e agora. Ter uma companhia que ajudasse a gente ampliar essa história, de uma maneira 360º no Brasil inteiro. Daqui em diante, as oportunidades que vão aparecer serão muitas, porque realmente a coleção tá muito bonita, bacana, sincera e verdadeira.

Se eu tenho o desejo de levar lá pro NYFW? Claro! Mas fizemos coisas grande demais. Eu tenho 29 anos, sabe? Meu próximo objetivo é pisar um pouco no freio e viver um pouco melhor. Mas eu acho que a gente vai chegar lá.

E conta para gente, como vocês chegaram nesse meio da moda?

Foi o povo que colocou a gente na moda. A moda dentro do rap sempre foi uma forma de se expressar também. Quando começamos a fazer música, entendemos que era uma maneira de conseguir se comunicar com o nosso público também. Desde o começo, trabalhamos a questão do merchandising muito forte para o nosso fã, sempre prezando a qualidade. Os preços sempre foram um pouco mais altos do que o mercado de música cobrava por produtos do tipo, mas as pessoas foram vendo que era diferente, com um design legal. Não era só uma camiseta de banda com o nome e aquela cara meio tosca.

Foram comprando essa ideia e a coisa foi crescendo, ultrapassou a música. Lojistas começaram a pedir, queriam adquirir a peça porque artistas começaram a usar. Foi tomando uma proporção grande que em 2014 a gente sentiu a necessidade de inovar, aproveitar esse lugar que o público tinha nos colocado para fazer uma coisa legal dentro do streetwear. Porque esse mercado também está crescendo, a gente não é besta. Todos os desfiles que você vê tem referência street, até de grandes boutiques. Optamos por dar esse passo para que a gente mesmo pudesse contar a nossa história, sem ser engolido pelo mercado.

E o que te faz querer continuar na moda?

A transformação que a gente causa nas pessoas. Os comentários que escutamos de quem é impactado por isso. Desde formados em moda que nunca tiveram a oportunidade de ingressar no mercado de trabalho pelo seu perfil pessoal. Às vezes por onde mora, porque é gordo, é negro. Recebemos muito esse feedback.

O evento de hoje é importante nesse sentido, porque conseguimos englobar essas pessoas também. Muitos vão conseguir ver pela primeira vez um desfile. Todos que fizemos no SPFW era um turbilhão de gente pedindo, não conseguimos atender todo mundo.

Tanto que o objetivo desse desfile era fazer na rua. Não conseguimos dessa vez, mas vamos continuar avançando para chegar nesse objetivo. Cada vez mais tentar fazer uma moda mais inclusiva mesmo, para as pessoas participarem, se sentirem representadas e levarem isso de positivo para a vida delas.

Além de música e moda, vocês tem vontade de entrar em mais algum meio?

A gente vai fazer agora cinema. Estamos fazendo um longa que vai contar a nossa história de vida, desses 10 anos, com o Rodrigo Teixeira. Acho que essa a nossa maior incursão nos próximos dois anos. E expandir a parte de moda, com mais parcerias como essa.

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