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“Segregação racial é muito real no Brasil”, diz Alexandra Loras, consulesa da França, em sua coluna de estreia

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Alexandra Loras é jornalista, consulesa da França em São Paulo e importante ativista do movimento negro. A partir de hoje, ela escreve sobre como vê o Brasil, nossos desafios e sua experiência por aqui. Confira abaixo sua primeira reflexão.

Gosto de perguntar às pessoas que acham que não existe racismo no Brasil quantos amigos negros elas têm. Será que 57% deles são negros, como a porcentagem da população brasileira?

O preconceito está presente em todo o mundo. Eu sofro de racismo como Taís Araújo, Maju e as milhares de meninas negras que são atacadas todos os dias por causa da cor da pele e de toda estigmatização que existe na mídia sobre o negro. Dói, mas eu tento sensibilizar as pessoas sobre o assunto nas minhas palestras e artigos, pois esse é um assunto que não pode ser ignorado. Destrói nossa autoestima, nossa alma.

O negro tem com ele mesmo o preconceito: 85% das crianças negras de menos de cinco anos escolhem a boneca branca como a linda e a boazinha, e a boneca negra como a feia e malvada. Isso resume tudo. Estamos em uma sociedade eurocêntrica, que contou só um lado da história, como se tudo de maravilhoso tivesse sido feito pelos brancos.

Tente imaginar um mundo ao reverso, em que tudo que foi feito pelos negros fosse considerado inteligente, lindo e incrível, que todas suas referências fossem com negros. Não seria cruel com os brancos que eles só soubessem que foram escravos? Não seria cruel a mulher branca só ser vista como faxineira?

A geladeira, a antena parabólica e o marca passo foram inventados por negros, por exemplo. André Rebouças e Theodoro Sampaio eram engenheiros negros brasileiros. Alexandre Dumas, o pai dos Três Mosqueteiros, era negro. Alexandre Pushkin, também afrodescendente, foi o maior romancista da literatura russa. Houve uma rainha da Inglaterra que foi negra, Charlotte de Mecklenburg, filha do rei do Portugal e de uma escrava. Ela se casou com Georges III, rei da Inglaterra, em 1761.

O negro consome mais de 49 bilhões de reais a cada ano no Brasil, então por que não incluí-lo em 57 % das campanhas de publicidade, se ele representa 57 % da população? Temos 2% de loiros adultos verdadeiros no mundo. Não parece que o loiro está mais presente nos comerciais publicitários que na realidade?

Será que continuamos a promover, de maneira inconsciente, a teoria do eugenismo usada pelos nazistas que, em nome da ciência, criaram o holocausto sob a premissa da superioridade ariana? O Brasil acolheu muitos alemães do nazismo depois da guerra, será que essas ideias sobrevivem aqui de maneira não tão velada?

Hilary Clinton quando veio ao País ficou chocada com a desigualdade racial e disse que esperava que o Brasil mudasse. Não temos que esquecer que escravidão foi legal, como holocausto e apartheid também foram legais. Hoje, o Brasil precisa se olhar no espelho e enxergar sua cara multirracial e multicultural e ter uma representatividade igualitária na mídia, nos livros didáticos, nos boards executivos… O brasileiro não tem problema em ter cotas para as mulheres, pessoas com deficiência e para os filhos de fazendeiros (lei Boi), mas cotas para negros são como uma dor visceral. É como o dono da casa grande que ainda se queixa do negro merecer as mesmas vantagens que o branco.

A segregação é muito real no Brasil, mas ninguém quer enfrentá-la. Não acredito que o negro brasileiro a ignore, mas creio que acha outra forma de se expressar, por meio de mensagem subliminar. O carnaval é um exemplo. Um evento cheio de talentos com uma dimensão que nenhum curador de arte contemporânea poderia decodificar. Eu enxergo essa luta pacifista nessa performance criativa que é a mais deslumbrante do mundo.

Aqui nesse espaço, discutiremos essas e outras questões importantes. Espero que me acompanhem!

Foto: Reprodução

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