Por André Aloi
Wagner Moura, aos 39 anos, interpreta o traficante Juan Pablo Escobar (1949 – 1993) na série “Narcos”, original da Netflix, que estreia nesta sexta-feira (28.08). Dirigida por Zé Padilha (“Tropa de Elite”, “Robocob” etc.), a produção conta a história do narcotráfico sob a perspectiva de Steve Murphy (Boyd Holbrook), um dos policiais da DEA, a agência antidrogas dos Estados Unidos, no fim da década de 80, início dos 90 – período que a droga se infiltrou nos EUA, vinda da Colombia num esquema organizado pelo traficante e seus asseclas.
RG conversou com Moura por telefone, que disse já ter tomado coragem de falar sobre o personagem, inclusive para os colombianos. “Acabei de falar com a rádio de Bogotá, em espanhol e tudo”, brincou. O receio tem a ver com o fato de um estrangeiro interpretar alguém tão popular e icônico para aquele país. “Como vem um brasileiro aqui (interpretar o Escobar)? Estou preparado para essas citações, mas não vi muito ainda. E também não leio p*rra nenhuma. Não vou saber é nunca”.
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Em todo personagem que faz, diz ele, sua obrigação é apresentar o indivíduo como pessoa, deixando de lado o juízo de valor. “É óbvio que ele era mau. Mas tem gente, até hoje, que acha que ele era bom. É uma questão de perspectiva. Quando fiz ‘Carandiru’, ficava pensando: ‘pô, os bandidos e tal’. Aí fui lá dentro e vi: ‘é um bocado de ser humano, que tem filho, família, tristeza, alegria. Osama Bin Laden, por exemplo: a família dele gostava dele. Você não pode entrar num personagem, pensando nisso”, dispara.
Ele compara o fato de ser escalado para viver Escobar com a vez que aceitou fazer um show com a Legião Urbana (em uma homenagem promovida pela MTV, em 2012). “É uma coisa que você não faz esperando que todo mundo vai gostar”. Ou também quando atuou no filme “Trash: a esperança vem do lixo”, uma produção americana que fala sobre a pobreza no Brasil, em que a crítica brasileira foi dura.
Antes mesmo de começarem as gravações, Moura foi morar em Medellín, na Colômbia, por conta própria. “Começamos a gravar em setembro (2014), e seguimos até abril deste ano. Cheguei lá em fevereiro. Precisava fazer isso porque não falava espanhol. Tive que me virar”, explica, comentando que se matriculou em um curso de espanhol, mas não contou a ninguém porque estava lá. “Começaram a me reconhecer, foram na internet e viram. Mas aí me ajudaram”.
Ao se preparar, além de engordar 10 kg, leu uma extensa bibliografia sobre a vida do traficante e visitou diferentes lugares em que viveu, inclusive o edifício Mônaco, onde a família dele morava e o Cartel de Cali jogou uma bomba. “Não é um lugar em que você pode entrar. É meio fantasma, horrível lá dentro. Mas, ao mesmo tempo, quando você está estudando sobre o Pablo, é incrível. O segurnaça que estava lá na frente, me olhou e disse: ‘eu não acredito que você tá aqui. Sou policial por causa de você’. Entrei lá e ele fez um tour contigo”, resume. Mas não contou para ele que faria o papel porque, à época, ainda não tinha coragem.
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Depois da estreia de “Narcos”, Wagner diz que gostaria de se dedicar a algum projeto que mesclasse atuação e dança no futuro. Quando não está em cena, se reúne com sua banda de 23 anos, chamada Sua Mãe. Ou dedica-se aos três filhos (Bem, de 9 anos, Salvador, de 5, e José, de 3), de seu casamento de quase 15 anos com a fotógrafa Sandra Delgado, os quais ele diz não ter acesso à sua obra porque ainda não entendem. Agora, está produzindo um filme que vai dirigir no ano que vem, sobre a vida de Carlos Marighella (1911 – 1969, político e guerrilheiro, um dos principais combatentes de ditadura militar, de 1964). Na TV, faria um projeto de Luis Fernando Carvalho, na Globo. Acabou não rolando.
Wagner vive a dicotomia de estrear um papel em um serviço de streaming online, mas ele mesmo não é tão conectado. “Nunca quis (fazer parte de uma rede social). Estou cada vez mais querendo desacelerar meu passo, andar devagar, conversar com as pessoas no mundo verdadeiro. Não sei como as pessoas acham tempo pra ter tanta mídia social. Além de ser opção, há uma dificuldade tecnológica. Quando entro na internet, vejo e-mails e notícias sobre o Vitória (time do coração)”.
Ele estaria numa onda até mesmo de largar o celular: “acho que vai ser difícil, até porque as pessoas não vão me achar. Vai ser um inferno. Mas meu desejo era esse. Se pudesse, largava”.
[ALERTA DE SPOILERS]
COMPARAÇÕES
O sonho de Escobar, como é contado na trama, era virar presidente. Mas não é esse caminho que o baiano quer seguir. “Gosto muito de política, mas se entrasse pra política partidária, meu casamento acabava. Eu prefiro o casamento. Eu acho que sou uma pessoa que se posiciona politicamente sempre que posso. É mais por aí”, comenta. Na eleição de 2014, ele apoiou a então candidata Marina Silva à presidência da República.
Logo na primeira cena do episódio de número 1 dessa temporada de estreia, Escobar demonstra ter uma memória invejável, relatando nomes e histórias. Mas não é bem assim que funciona a de Moura. Ele brinca: “minha memória antiga, de quando era criança, de infância, essas coisas, é muito boa. Me lembro de muita que aconteceu quanto era pequeno, mas a memória do que aconteceu ontem, é péssima”, finaliza.