POR PAOLA GIAVINA-BIANCHI retrato Lianne Milton
Helena, Helenão, Heleninha. Punk, mulher, bonita, cozinheira, curiosa, normal, não normal, gente fina, estudiosa, inquieta, intensa, divertida, questionadora, artista, apaixonada, apaixonante, talentosa, claro.
É assim. Quando a gente pensa em alguém, vem logo um emaranhado na cabeça. Estes são alguns sobre Helena. Conheci não faz tanto tempo assim. mas isso não importa. Helena é 100 anos em um dia. Intensa. Carro chef na cozinha do Maní, ao lado do marido, o catalão Daniel.
Desassossego. Esmero. Zelo. Raiz. Gosta de pesquisar os alimentos. Usar os esquecidos. Descobrir novos. Não se acomoda. Não tem preguiça. Paixão talvez seja a melhor palavra para descrever Helena, talvez um sinônimo de Helena. Gosta de gente. E de alimento. E de colocar a mão. De se lambuzar. De se sujar.
Não é vaidosa – não no sentido mais besta da vaidade. De aparecer, de comprar roupa nova, se maquiar, a vaidade do espelho. A vaidade de Helena é mais visceral. A mais complexa. A mais difícil. A mais nobre.
Helena é dessas pessoas de espírito livre. Veio parar em São Paulo meio por isso. Nascida no sul, tinha uma vida tranquila com a família, lá em Porto Alegre. Aos 18, a inquietude falou mais alto e ela se entendeu com a capital paulista, encorajada pela amiga Fernanda Lima. Neca Mena Barreto foi outra pessoa importante nessa empreitada inicial: não somente a contratou para ajudar em alguns eventos como indicou Helena a alguns restaurantes. Assim, foi conhecendo e tateando esse novo mercado. Conseguiu alguns estágios – transitou, por exemplo, no Roanne (do chef Emmanuel Bassoleil) e no Gero. Acabou chef do Na Mata Café – e assim, meio na intuição, deu início à carreira de cozinheira. Quando sentiu a coisa mais séria, achou que era hora de cair no mundo e estudar mais – primeira parada, a pequena Friuli, depois Milão. Ali, descobriu o lado braçal da gastronomia – de limpar peixe a lavar o chão.
Aquilo que poderia ser lúdico, poético, tornou-se maçante, chato. Partiu, então, para um tour gastronômico, no qual conheceu alguns lugares que chamaram a atenção e a devolveram à paixão pela cozinha – aquela feita com a alma, que expressa, que se comunica, que é arte. Aquela que é Helena. El Bullí, Ruscalleda e El Celler de Can Roca foram alguns desses lugares. Corta. Meses depois, Helena é a mais nova estagiária do Celler. Daniel é o chef. Corta. Paixão. Corta. Avassaladora. Corta. Helena e Daniel planejam a vida no Brasil. Corta.
Já era hora de umas tantas partes se juntarem. Daquelas coisas que parecem ser uma feliz coincidência, mas, na verdade, são uma necessidade de se tornar realidade. Inevitabilidade. Como se já existissem em algum outro lugar. Um grupo que tinha quase que a obrigação de se encontrar – para o bem deles, e do nosso também.
Um grupo de amigos. Talento pra todos os lados. Giovana Baggio, Fernanda Lima, Pedro Paulo Diniz, Helena e Daniel. Gente cuja ambição é fazer o trabalho benfeito, a vida feliz, gente que se preocupa com gente, que gosta de gente. Acredito que as pessoas parecidas se atraem mesmo. E meio assim se formou a turma do Maní. E ali Helena passa suas horas, seus anos, seus pensamentos. Ali ela passa seu talento. Entre a família.
Nessa família, a alma é os dois, ela e Daniel. Alma intensa. Então, intensos, ao quadrado. Os dois são um e são dois. Como casal, dois que formam um. Como cozinha, uma que forma duas – Helena comanda o almoço, Daniel o jantar. Uma dupla que se separa. Dois que viram um, mas esse um funciona melhor quando separado em dois. Helena, a intuição, Daniel, a técnica. Mas não tão óbvio assim como o provável opostos que se atraem. Ali todo mundo é meio punk, meio militar. Meio caos, meio perfeição. Mas tem também o lance de se completarem sim. Confuso? Sim. Linear? Não.
Isso tudo é Helena, um pouco de Helena, que são tantas, que é tanto.
Ainda neste ano, Helena, Daniel e a turma do Maní poderá ser vista, lida, degustada, no livro sobre o restaurante, a ser lançado pelo editora DBA. O texto é da Milly Lacombe (ai se o mundo fosse povoado por Millys e Helenas). O timing é perfeito: ela acaba de ganhar o The Veuve Clicquot World’s Best Female Chef Award 2014. Coisa fina, gente fina.
Como disse dia desses o Cadão (Volpato): “A cozinha é o novo rock’n’roll”. Pois essa Helena é um acorde, bem alto.