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Nem toda nudez será castigada

Neste calorão, a atriz Zezé Motta defende o nu total… tire a roupa você também!

Por Zezé Motta

Fotos Antônio Guerreiro

Isso quem dizia era o Domingos de Oliveira: “Zezé, mesmo quando eu te vejo vestida, tenho a sensação de que você está nua”. O Nelson Motta, que é meu compadre – sou madrinha da filha dele com a Marília, a Nina Morena – diz que os diretores não pediam para eu tirar a roupa, eu é que já ia tirando. Batia a claquete, eu baixava a alça do sutiã!…

A verdade é que eu sempre tive uma relação tranquila com a nudez, apesar de ter estudado em colégio interno, em que o corpo era tabu. As visitas de homens eram muito controladas. Só podíamos receber pai, irmão, tio. E a gente tomava banho de camisola, mesmo sendo um grupo só de meninas.

A primeira coisa que fiz quando saí de lá foi tirar a roupa. Calma, eu explico. É que o apartamento em que meus pais foram morar, no Leblon, era no último andar, e, no verão, aquilo virava um forno. Eu ficava costurando com a minha mãe, só de calcinha. Aí, quando o meu irmão estava para chegar, ela mandava eu me vestir. Eu dizia: “Ué, basta ele me olhar com olhos de irmão!”. Nessa época, minha mãe era testemunha de Jeová. Portanto, você pode imaginar, sempre tive uma vida muito controlada. Essa sensualidade deve ter acontecido de maneira bem natural.

Natural mesmo. Me lembro do lançamento do meu primeiro LP… uma alça do meu vestido caiu e eu fiquei com um dos seios de fora. E eu incorporei o erro, como recomendam as escolas de arte dramática. Fiz de conta que era para cair mesmo… Na capa do Zezé Motta, o LP, tem umas folhas que a censura mandou colocar, em cima dos meus seios. Dentro, tem uma foto minha praticamente nua. Essa passou.

E aconteceu algo muito curioso sobre esse episódio. Uma vez, mais tarde, me pediram para eu escolher uma cantora para se apresentar comigo no Projeto Pixinguinha. Eu escolhi a Clementina de Jesus. Quando foram consultá-la sobre o convite, ela disse: “A Zezé Motta não é aquela que canta com os peitos de fora?”. E a nossa apresentação não aconteceu… A Clementina disse que se o falecido dela fosse vivo não iria deixá-la cantar comigo (risos). Eu acabei fazendo o show com o Johnny Alf.

Aí veio Xica da Silva, um divisor de águas na minha vida, porque eu não era conhecida e o filme me tornou popular não só no Brasil, mas no mundo. Quando eu passei no teste para o filme, saiu numa revista: “Quem passou no teste para fazer Xica da Silva é feia, porém exuberante”. E eu olhava para a foto de uma revista, chiquérrima, assinada pelo Antônio Guerreiro e me achava tão bonita… Por conta da coisa sensual, eu e Sônia Braga, que, naquele ano estourou com o filmeDona Flor e Seus Dois Maridos, viramos símbolos sexuais.

No início da minha carreira, o fato de eu ser um símbolo sexual me incomodava, realmente. Achavam que meu reconhecimento artístico não podia se dar por aí. Mas eu não investia nisso, era uma circunstância natural eu estar sempre nua no cinema.

Olhando para trás, reconheço meu corpo a serviço da arte. Tem alguma inocência, um despudor de época, um pouco distante da carne deste tempo, exposta de um modo um tanto banalizado. Uma outra nudez. E, se me permite o Nelson, nem toda nudez será castigada.

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