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Entrevista: Alexandre Mury

Num bate papo sobre arte e projetos futuros, o artista plástico conversou com RG. Vem ler!

Por Rinaldo Zirrah
A obra de Alexandre Mury é sagaz. O deboche, “jeitinho brasileiro”, tudo parece se encontrar num resultado final de suas fotografias. O artista cria releituras de obras consagradas. Por vezes também tem uma verve livre, criação sua, inventando coisas, personagens.

O artista, que  já foi alvo de censura em pleno Facebook por conta de um de seus trabalhos, uma releitura de “Abaporu”, de Tarsila do Amaral,  faz parte do acervo da Coleção de Gilberto Chateaubriand. “A minha arte está na minha entrega de corpo e alma”. E a gente sabe. Percebe.

Confira aqui o papo com Alexandre Mury:

Rinaldo Zirrah: Em outras entrevistas você já comentou sobre sua autoeficiência na produção de sua obra. É o modelo, faz a maquiagem, bola o cenário, iluminação e mais o que der. Este tipo de atitude acaba deixando você mais limitado?

Alexandre Mury: Operar na construção de cada detalhe que compõe a obra é mais que dispensar a assistência artesanal, por mera vaidade. Isso, também faz parte do tema em torno do individualismo que é um dos meus maiores questionamentos. Me considero, sobretudo, um poeta, pois estou sempre buscando a beleza no discurso das imagens.

O meu prazer não se esgota no resultado do registro fotográfico. Meu interesse não é a auto suficiência, e sim o prazer em experimentar a arte. A minha poética está no “gesto”, não é só minha figura como modelo que faz parte da performance. A fotografia é o suporte para todas as minhas ações e interações com as muitas possibilidades de arte. A minha arte está na minha entrega de corpo e alma.

O limite é o meu prazer em realizar. O “Eu” é sempre algo inacabado e o “Outro” é sempre uma referência. Mas valorizo as minhas vivências, experiências, afetos e desafetos, o que faz do meu trabalho, às vezes, complexo e intimista. Eu realizo, antes de mais nada, para mim mesmo, a medida que vou reconhecendo os meus limites vou conhecendo as limitações impostas. Isso não quer dizer que me fechei ensimesmado, se é na reação do “Outro” que busco minha maior inspiração.

A gente sabe que os projetos não param. Mas, conte: alguma obra que você ame e que pensa em fazer, mas que no momento não rola?

Eu penso em realizar uma releitura da Monalisa. A pesquisa e a inspiração andam juntas mas são os afetos, emoções e viabilidade técnica que definem o momento certo. Este trabalho exigirá uma intervenção no meu corpo. E isto ainda não experimentei. Não é o caráter que pretendo seguir em trabalhos futuros. Mas estou me preparando, pois será uma interferência radical na minha aparência. Como é uma questão provisória, vou me permitir.

Você pretende mudar um pouco a forma do trabalho – produção – para tentar fazer mais “remakes” de grandes obras? Pensa em abrir novos horizontes, como criação de instalações ou outras formas de arte?

A minha história com a arte sempre esteve pautada na ideia de texto e contexto. Estou sempre revisando a noção dos objetos, símbolos e conceitos no tempo e no espaço. As coisas que eu criava e introduzia na fotografia foram se tornando cada vez mais complexas. A fotografia não exigiu que eu criasse coisas para ela. As coisas que eu criava que exigiram de mim o registro da fotografia. Devo continuar fotografando , e a realização de vídeos, no futuro, é inevitável. Mas vou começar a tirar as coisas de dentro da fotografia. O cenário é instalação, minha atuação é performance, meus objetos são esculturas… e eu desenho, pinto e bordo… só não me atrevo a dançar e cantar.

Se a gente parar pra pensar, seus trabalhos começaram a ter mais notoriedade no boom das mídias sociais. Aliás, o mundo virtual vem tomando cada vez mais espaço. Como você acha que isso pode interferir no seu trabalho? E o que você pensa que isso pode interagir mais no meio da arte e galerias?

Há cerca de uma década, tive a sorte de ser encontrado na internet por um marchand muito experiente, quando meu trabalho ainda não tinha a consistência e profundidade que tem hoje. O momento que me senti encorajado, aceitei o convite para submeter meu trabalho a avaliação. Eu estava sendo apresentado pelo Afonso Costa, um dos melhores marchands do Brasil, para os maiores colecionadores Brasileiros. Isto foi em 2010 quando entrei para a coleção Joaquim Paiva e para coleção Gilberto Chateaubriand, ano que participei da primeira coletiva no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. A partir daí comecei a comercializar meu trabalho de fotografia, e conhecendo outros importantes colecionadores que também adquiriram e continuaram adquirindo. Fui “legitimado” como artista e isso não veio da internet. Tornei-me “conhecido” na internet e não pode ser confundido com “reconhecimento” que estava acontecendo em outra esfera social. Eu acho importante para os jovens talentos o uso das redes sociais para divulgação de seus trabalhos. É uma oportunidade para curadores, marchands e críticos acompanharem a produção, evolução e consistência dos trabalhos.

A arte, independente de sua forma, é mais livre. Isso pesou na hora de deixar a carreira de publicitário de lado? Pensando na questão que, no meio corporativo, quem manda é o “cliente”, deixando sempre a criatividade mais limitada.

Como este conflito já era previsível, eu já investia no meu lado artístico muito antes da formação em publicidade. Nunca deixei de realizar minhas pretensões artísticas paralelamente à uma atividade que me sustentava. Eu acho possível separar as coisas e valorizo muito as duas áreas. Mas considero que antes de ser publicitário eu já era artista. O amadurecimento veio com as fotografias despretensiosas cheias de humor. Todo processo foi muito natural. Eu não deixei de ser publicitário e nunca desisti do sonho de ser artista, só estou me dedicando integralmente à minha arte.

Diversos artistas já fizerem seus autorretratos. Se Alexandre Mury fizer um, como ele será?
“Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante”, como diria o Raul.

E que Alexandre Mury continue essa “metamorfose ambulante”. A gente gosta, pede bis e continua se encantando com a coisa toda.

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