Estreou nessa segunda-feira (18.06) a nova minissérie da TV Globo. Gabriela, romance de Jorge Amado que ganhou adaptação, estrelando Juliana Paes no papel da garota brejeira que balançou o imaginário de uma nação. RG, que entrevistou a atriz antes, reproduz o bate papo com a moça de olhos profundos. Bem vinda.
Por Rosana Rodini
“Podemos buscar a Ju?”, pergunta o motorista. Ju, no caso, é Juliana Paes, uma das mais bem sucedidas e disputadas atrizes do seu tempo, mulher de traços brasileiríssimos que povoam o imaginário de toda a nação. É a filha pródiga de Rio Bonito, que cravou seu espaço no showbiz dos trópicos. E também a moça que transpira sexo, assim, sem esforço algum. Mas, para o chofer, ela é a Ju. E ai de quem tentasse provar o contrário. “Fui buscá-la no aeroporto há uns anos, uma confusão. Mas ela tira de letra, sabe? É muito simpática, uma querida”, segue, com seu relato do alto da intimidade que só o horário nobre faz por você. De fato, nossa personagem é boa praça. Anda sorrindo, mas não à toa: tem uma carreira sólida, coleciona protagonistas, é objeto de desejo de polpudas campanhas publicitárias, está casada, é feliz, descobriu parte do sentido da vida com o filho Pedro. Segue buscando respostas, ainda bem. Para coroar o momento, um papel desses, divisor de águas. Dará vida, no próximo junho, à moça dos rompantes libidinosos com que Jorge Amado sonhou nos anos 50. Vai interpretar a garota brejeira que deixa de quatro o turco Nacib e a Bahia toda. Reviver a adaptação televisiva que consagrou Sônia Braga em outros tempos. Para o motorista ela é a Ju. Prefiro chamá-la de Gabriela.
“Sei que será meu grande papel”, dispara. Estamos no quarto de um hotel de São Paulo. Saco da bolsa o DVD, e uma Sônia Braga de cabelos volumosos que levo para quebrar o gelo. Nem precisava. “Não acredito que você trouxe o filme. Foi tudo tão corrido, ainda não vi. Vou levar ele pra mim, tá?”, diz, para depois rir, olhando fundo no olho. O motorista estava certo: a “Ju” é uma simpatia. “Havia uma novela da Gloria Perez programada quando surgiu o convite. Fui parar no hospital. Tudo fundo emocional.” Com o aval da escritora, que liberou a atriz da trama, Juliana estava pronta. Ou quase. “Li nas manchetes dos jornais que eu era velha para o papel. Foi a primeira vez na minha vida que uma opinião da mídia me deixou em dúvida. Quando vi estava pensando: será que eu já passei da idade?”. Bobagem.
Juliana tem 32 anos e uns olhos puxados que tiram qualquer um do prumo. Ela fala com eles. “Amadureci, mas não passei do ponto”, reflete sobre a era balzaquiana. Crescimento emocional que credita menos aos 30 e poucos anos e mais à chegada do filho, um menino lindo de bochechas redondas e cachos no cabelo. “Foi como se uma ficha tivesse caído. Passei a entender melhor os relacionamentos. O sexo também mudou, para melhor. Aprendi, acima de tudo, a não superestimar o amor.” E olha que Juliana é mulher de amores. Fascinada pelo seu trabalho, tem devoção pela família, mantém em lugar privilegiado as amigas da adolescência em Niterói. E segue apaixonada pelo empresário esportivo Carlos Eduardo Baptista; juntos há 8 anos, casados há 3. “Não sei o que é namorar alguém famoso. Para mim é natural, portanto, que sejamos mais reclusos. Aprendemos juntos a lidar com o assédio das câmeras. Ele trabalha bem com isso, só não gosta de me ver beijando na boca.” “O marido não poderá assisti-la em seu próximo papel”, concluo, ao relembrar uma das cenas do filme da noite anterior, quando o turco pega a sua Gabriela na cama com outro. Pergunto se já traiu. A resposta é corajosa e imediata. “Já trai. Não digo isso cheia de orgulho, mas também não tenho vergonha. Traí porque estava infeliz, e aquilo foi uma válvula propulsora. Tenho a consciência tranquila, pois saí de todos os meus relacionamentos só depois de ter esgotado todas as possibilidades. Quando amo, luto até o fim.” No filme, o turco releva a traição. “Se eu perdoaria? Se já fui traída? Não sei. Mas sei que não acredito em resoluções definitivas, detesto verdades absolutas. Cada caso é um caso.” Literalmente.
A esta altura, Juliana pega o cardápio. Escolhe um risoto de aspargos antes de continuar a conversa. Seu filho tem um ano. E, neste tempo, ela se dedicou exclusivamente a ele. “Parei de amamentar há uma semana. E apenas porque ele não quis mais”, revela, quase triste. “Vou voltar para a academia só agora”, continua. Vamos lá: nem um ano longe dos treinos, nem um calórico risoto de aspargos, nem a maternidade… as medidas de Juliana parecem intactas. Segue linda, corpo incrível, pele idem. É o estereótipo da mulher brasileira. “Concordo com a parte do estereótipo, mas o bonita fica por sua conta. Também tenho meus momentos com o espelho. Era uma menina magricela. Ai fui ganhando contornos de mulher. O bumbum já veio comigo.” Fato é que Juliana é 100% natural, acredite. “Não sou contra plástica, sou a favor de pequenos ajustes. Mas o culto à beleza ultrapassa os limites do exagero.” Aí a gente lembra das formas de Juliana estampadas na capa de uma revista masculina em 2004, em uma das “Playboys” mais comentadas da história. “Foi válido. Queria comprar uma casa para os meus pais, que estavam passando por uma situação financeira complicada.” Comprou. Se faria de novo? “Faria um ensaio artístico, pra mim. Mas sem o fator dinheiro. Acho a nudez bonita, principalmente a feminina. Gosto de ver mulher pelada.” E gosta de barzinho com as amigas, tomar uma cerveja, bater papo tomando um vinho. Adora dançar, sentir a música. Ama ficar com a família, os almoços de domingo, aquela gritaria. “Deve ser fruto da minha mistura.” Atenção aos ingredientes: “sou descendente de índios, espanhóis, negros e portugueses.” Deu liga. A criação ajuda. Juliana é pé no chão, segura de si, se expressa com cautela. “Não suporto gente prolixa, gosto de me fazer entender.” É engraçada, engajada. Anda querendo fazer um pouco mais. Aproveitar o seu espaço na mídia em prol de certas causas. Recentemente participou de um vídeo com outros artistas do Projeto Gota D’Água, que convidava a sociedade ao debate sobre a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte. Aí veio o vídeo-resposta de estudantes, criticando o que eles chamaram de informação leviana. “Quis levantar uma questão, colocar as pessoas para pensar. Concordo com alguns aspectos do projeto. Discordo de outros. Talvez tenha sido um pouco de ingenuidade da nossa parte. Mas repercutiu, as pessoas foram pesquisar. A intenção foi certeira. Estou feliz.” De fato, o assunto rendeu. Virou chacota para alguns, despertou a defesa fervorosa de outros. E acabou na capa de uma prestigiada revista semanal. Agora, ela pensa em usar seu quality star a favor de outros temas. “A corrupção me enoja. Sempre ouvi que o melhor produto exportação do Brasil é seu povo. Me entristece perceber que a boa fé é justamente o calcanhar de Aquiles desta nação.”
No mais, vai fazendo as suas descobertas. “O nascimento do Pedro foi revelador. Quero ter mais filhos, mas não agora.” Sua religião? “Sou espírita, mas me sinto cada vez menos confortável com rótulos. Acredito mais na busca pela paz, no real motivo da passagem. Em fazer coisas mais relevantes da vida.” Profissionalmente, por exemplo, gostaria de estar envolvida em projetos em que a mensagem seja mais próxima aos seus ideais. Cita os filmes Melancolia e Árvore da Vida como exemplos. “Sinto falta de roteiros mais profundos, que abordem questões que vão além.” Juliana quer refletir mais, quer descobrir qual a sua missão. Entender de fato o que é viver, e morrer. “Tenho algumas respostas, mas muito mais perguntas. E tudo bem. Viver na reflexão já é uma vereda bem mais gostosa.”
Seguimos para o estúdio. No caminho ela fala de música, da timidez de quando um olhar a persegue na rua. Diz que está com saudades do filho. Fala do Rio de janeiro, a sua cidade. Pega o iPad e mostra uma foto. Depois um álbum inteiro. E seus olhos, de novo eles, ganham brilho extra. “Ontem o Pedro ficou com ciúmes de mim quando o pai veio me dar um beijo”, confessa, com um fundinho de orgulho da disputa entre seus homens. Começa a seção de fotos. No rádio, Beyoncé. Juliana dança. Está confortável com a sua imagem, cheia de si. Fez-se o clique. Temos a capa. Ela espia a foto. Aprova o resultado. Eis aqui a sua Gabriela.