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Caco Ciocler: Imperador

RG conversou com o ator, que estréia a peça “Imperador e Galileu”, de Ibsen

O ator Caco Ciocler estreia nesta sexta-feira (18.07), no Sesc Santana, em Sao Paulo, a peca “Imperador e Galileu”, texto de Henrik Ibsen que retrata os conflitos do imperador romano Juliano (seculo IV d.C), que se tornou uma figura polemica ao tentar destituir a igreja catolica como religiao oficial do imperio romano e resgatar os cultos pagaos.
 
O texto, escrito em 1873, e considerado pelo proprio Ibsen a sua maior obra. A peca, traduzida por Fernando Paz e adaptada por Sergio Ferrara, cobre um periodo de 12 anos, de 351 a 363 A.D., numa epoca de conflito entre o Cristianismo e o Helenismo. Segundo o diretor, “debatemos atraves desse texto a intolerancia religiosa, que, quando misturada com assuntos politicos, pode levar as nacoes a guerras interminaveis em nome de Deus”.


RG foi ter com Caco, o interprete de Juliano:


RG – Voce e ator por que?


Caco Ciocler – Porque a vida foi me conduzindo nessa direcao. E eu fui aceitando, com o maior prazer!


RG – O que ha de Juliano em Caco?


CC – Ha um jovem inquieto, que adorava estudar filosofia. Um jovem que adorava ficar recluso e que foi alcado a uma posicao importante e muito popular. Um jovem angustiado em tomar as decisoes corretas. Um jovem que alterna em seu intimo uma certeza de sua grandeza intercalada com uma desesperadora ausencia de auto-estima. Um jovem que se viu muito mais seduzivel pelo poder do que poderia sequer imaginar. Um jovem que se sentia preso dentro de si mesmo…enfim, um ser humano…tao parecido com nos todos.


RG – Te entristece enxergar no texto de Ibsen, um seculo depois, as mesmas angustiantes intolerancias que ele escreveu?


CC – Mais me assusta do que me entristece. E nao e um seculo. Sao vinte. O texto do Ibsen fala das intolerancias do seculo um. Acho que essa questao seja talvez a ultima fronteira que nos temos ainda que atravessar para o entendimento e o respeito entre os da raca humana. Ainda temos injusticas sociais, etnicas, geograficas mas nesses quesitos existe ao menos um consenso do que seja certo e do seja errado. Na religiao esse consenso e mais subjetivo e o que e certo ou errado fica meio nebuloso, relativo. Ainda mais com a fe como instrumento de manipulacao. E dessa manipulacao que o Ibsen fala e isso e muito velho mesmo, infelizmente. As vezes a gente fica meio receoso com as reacoes que as pessoas possam ter. Mas em momento nenhum o texto do Ibsen ofende a fe crista e sim a hipocrisia de alguns segmentos da igreja catolica que nao so nao aceitam e nao respeitam outras manifestacoes religiosas como nao sao capazes de viver de acordo com os preceitos que eles mesmos querem defender e ensinar.


RG – Como voce chegou a esse texto? Ja tinha feito um Ibsen? Foi um convite? O que te levou a aceitar?


CC – O Sergio Ferrara, diretor da peca, foi quem me mandou o texto. O imperador era fisicamente parecido comigo. Ele sempre usou uma barba e era inclusive ridicularizado por isso. Eu tenho essa coisa com a minha barba tambem…foi uma intuicao do Sergio me mostrar o texto. Fizemos uma leitura no auditorio da Folha de Sao Paulo e a reacao foi surpreendentemente gratificante. A gente descobriu um humor e um interesse muito peculiar no texto. Eu sai extasiado da leitura. Ja profundamente envolvido com a possibilidade da montagem. Quando o convite chegou eu ja tinha aceitado ha muito tempo. Estamos trabalhando ha tres meses sem nenhum patrocinio.


RG – Sua ideia de religiao e qual?


CC – Religiao e um conjunto de ritos que pretendem nos proporcionam uma ligacao e um exercicio de reencontro com nossa espiritualidade.


RG – O que voce espera desse espetaculo, sinceramente?


CC – Eu espero sinceramente que as pessoas saiam do teatro felizes por terem passado duas horas ouvindo um belo texto que as facam refletir sobre suas crencas, sobre suas vidas, sobre sua espiritualidade e sobre sua condicao humana. Espero que eu possa experimentar um prazer no meu oficio que a tempos nao experimento com a intensidade que eu gostaria e que me lembro ja ter experimentado. E, para ser sincero, espero tambem que as pessoas saiam do teatro dizendo: Nossa, como o Caco faz bem essa peca!


RG – Como voce lida com estreias? Tem algum costume para se manter concentrado nos dias que as antecedem?


CC – Lido com muito nervosismo. Principalmente numa peca como essa. A gente nao faz ideia de como o publico vai reagir. A gente nao sabe com certeza como e a peca. Entao fico ansioso. Nao tenho nenhum ritual, mas gosto de ficar em casa, sozinho, concentrado.


RG – O que te move? E pra onde voce esta indo?


CC – A gente tem essa coisa estranha pela frente que e a nossa existencia, ne?. Procuro lidar com ela da maneira menos angustiante possivel. Me ocupo com amores, prazeres, com o conhecimento, com desafios e com entendimentos. Para onde estou indo? Todos nos estamos indo em direcao a morte, nao e?  Entao e melhor nao pensar muito nisso…

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