Marcela Lordy – Foto: Gabriela Bernd
A pandemia foi um momento especialmente desafiador para o casal de artistas Flávia Couto e Pedro Guilherme. Ambos tiveram Covid-19, ele perdeu a mãe durante o período. “Se eles não criassem arte, iriam enlouquecer”, conta a diretora Marcela Lordy, convidada a dirigir o projeto “O Amor e a Peste”, um experimento cênico, espécie de mescla entre cinema e teatro, que chega às plataformas digitais (Apple/ITunes, Google Play/Youtube Filmes, Vivo Play e Claro TV +) nesta quinta-feira (06.07).
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O Amor e a Peste nasceu como um experimento cênico online gravado pelos próprios atores no apartamento em que moram, com ferramentas como celular e tablet. Marcela entrou na história para trazer uma visão de fora e adaptar o experimento para as plataformas em um processo colaborativo com o Laboratório Fronteiras Permeáveis, da diretora de arte Vera Hamburger.
. “Achei muito bonita essa paixão pelo fazer artístico, essa resistência”, explica.
Cena de “O Amor e a Peste” – Foto: Divulgação
A própria trama tem um paralelo com o que os artistas estavam vivendo na época. O roteiro foi inspirado na obra e vida da autora francesa Anaïs Nin e do poeta francês Antonin Artaud. “Eu me apaixonei pelo texto e pelo experimento justamente pelo paralelo que esse casal criou, que é a história de ser artista no Brasil em plena pandemia e resistir, em um momento de opressão que a gente se sentia emparedado. O Artaud e a Anaïs passaram pelo nazismo, a gripe influenza. Eles viviam esse momento difícil onde os artistas acabam aflorando a criação. E eu vi isso acontecer ali com a Flávia e o Pedro, foi a forma de sobreviver. Ser artista em si nesse país é uma questão, acho que ‘O Amor e a Peste’ traz uma reflexão sobre isso, sobre a importância de seguir fazendo e acreditar resistir e dar a volta por cima”, afirma Marcela.
O paralelo entre diferentes veículos de expressão – literatura, poesia, cinema, teatro – é recorrente no trabalho da diretora. Um exemplo disso é seu primeiro longa-metragem, “O Livro dos Prazeres”, uma adaptação da obra “Uma Aprendizagem ou Livro dos Prazeres”, de Clarice Lispector.
Atriz Simone Spoladore em “O Livro dos Prazeres – Foto: Divulgação
“Eu gosto dos projetos que me desafiam como linguagem. Gosto de coisas que instigam criativamente, coisas que são impossíveis. O ‘Livro dos Prazeres’, da Clarice Lispector, começa com uma vírgula e termina com dois pontos. É um fluxo de pensamento, todo mundo fala que é inadaptavel”, afirma. Ela não só desafiou as probabilidades como fez isso com maestria. O filme foi selecionado para a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em 2020, além de ter circulado em diversos festivais e ter sido premiado no BACIFI, Cinecitta IFF, Vitória e Vassouras.
É a partir da improbabilidade de se transformar uma obra de arte em outra que ferve a criatividade da diretora e nasce a genialidade de seu trabalho. Ela destaca, no entanto, que é preciso regulamentação para que mais artistas possam investir em criações autorais e dar vazão a seus potenciais criativos.
“É preciso regulamentar, já que os streamings não dão direitos patrimoniais aos produtores. Os pequenos e médios produtores não têm vez, acabam prestando serviço para estrangeiros, com várias pessoas opinando na obra. Acho importante ter espaço de criação autoral, participar como produtora.”